18/05/2024 - Edição 540

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Argentinos vão às ruas no primeiro desafio ao governo de Javier Milei

Depois de desvalorização do peso e do aumento dos preços de alimentos, presidente argentino lança pacote que desregulamentação sistema de saúde, alugueis e relações trabalhistas

Publicado em 21/12/2023 11:14 - ICL Notícias, DW – Edição Semana On

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Em várias áreas da Argentina foram registrados panelaços na noite de quarta-feira (20), como reação ao megadecreto anunciado pelo presidente Javier Milei, com 300 medidas que facilitam privatização, cortam direitos e reduzem o controle do Estado sobre a economia. Em alguns pontos de Buenos Aires, grupos não se limitaram a bater panelas em suas casas e foram protestar nas ruas.

Ao apresentar o chamado Decreto de Necessidade de Urgência Milei citou a revogação de pelo menos 30 leis. O pronunciamento foi gravado em vídeo na Sala Branca da Casa Rosada, ondeo presidente estava acompanhado por seus ministros.

Entre outras medidas, ele anunciou a revogação da Lei do Aluguel, que teria como objetivo “simplificar” o mercado imobiliário – nessa “simplificação”, a partir de agora os aluguéis poderão ser cobrados em dólar. Além disso, extinguiu leis que regulamentavam o abastecimento de produtos alimentícios e limitavam preços de produtos no comércio.

A isenção do Imposto de Renda caiu de 15 salários-míninos (no Brasil seria R$ 19,8 mil) para 5,8 salários-míninos.

O texto inclui também mudanças nas regras para mineradoras, planos de saúde, farmacêuticas, vinícolas, agências de turismo e até clubes de futebol. Uma das principais modificações será no setor aduaneiro: “Está proibido proibir exportações na Argentina”, disse Milei.

Vários políticos reagiram negativamente ao megadecreto, que será apresentado ao Congresso para avaliação. Um deles foi o governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, que fez dura crítica em postagem na rede X:

“Ontem, os governadores das 23 províncias foram convocados pelo Presidente, que durante 45 minutos repetiu o mesmo discurso que fez quando tomou posse, de costas para o Congresso. Depois, pediu-nos apoio para um pacote de leis que ele não especificou, embora nós o tenhamos solicitado. Hoje, por trás da divisão de poderes, ele anuncia um decreto que sem necessidade nem urgência busca revogar um conjunto de leis de toda espécie. Assim, propõe-se privatizar tudo, desregulamentar tudo, destruir os direitos dos trabalhadores, destruir setores inteiros de produção, sortear os clubes de futebol e os bens dos argentinos. Tudo isso, sem passar pelo Congresso, que poderia se reunir e discutir. Ele falhou em dizer ‘democracia: saia!’”, escreveu Kicillof.

A seguir, os 30 pontos citados pelo presidente argentino:

1 – Revogação da Lei de Aluguel “para que o mercado imobiliário volte a funcionar sem problemas e alugar não seja uma odisseia”
2 – Revogação da Lei de Abastecimento “para que o Estado nunca mais atente contra o direito de propriedade dos indivíduos”
3 – Revogação da Lei das Gôndolas “para que o Estado pare de se intrometer nas decisões dos comerciantes argentinos”
4 – Revogação da Lei do Compre Nacional “que beneficia apenas determinados atores do poder” (concede prioridade aos fornecedores nacionais em compras públicas)
5 – Revogação do Observatório de Preços do Ministério da Economia “para evitar a perseguição às empresas”
6 – Revogação da Lei de Promoção Industrial
7 – Revogação da Lei de Promoção Comercial
8 – Revogação da regulamentação que impede a privatização das empresas públicas
9 – Revogação do regime de sociedades do Estado
10 – Transformação de todas as empresas estatais em sociedades anônimas para posterior privatização
11 – Modernização do regime trabalhista “para facilitar o processo de geração de emprego genuíno”
12 – Reforma do Código Aduaneiro “para facilitar o comércio internacional”
13 – Revogação da Lei de Terras “para promover investimentos”
14 – Modificação da Lei de Controle de Incêndios
15 – Revogação das obrigações que os engenhos açucareiros têm em relação à produção de açúcar
16 – Liberação do regime jurídico aplicável ao setor vitivinícola
17 – Revogação do sistema nacional de comércio mineiro e do Banco de Informação Mineira
18 – Autorização para a cessão total ou parcial das ações da Aerolíneas Argentinas
19 Implementação da política de céus abertos (sobre o trânsito aéreo internacional)
20  – Modificação do Código Civil e Comercial “para reforçar o princípio da liberdade contratual entre as partes”
21 – Modificação do Código Civil e Comercial para garantir que as obrigações contraídas em moeda estrangeira devam ser pagas na moeda acordada
22 – Modificação do quadro regulatório de medicina pré-paga e planos de saúde
23 – Eliminação das restrições de preços para a indústria pré-paga
24 – Inclusão das empresas de medicina pré-paga no regime de planos de saúde
25 – Estabelecimento da prescrição eletrônica “para agilizar o serviço e minimizar custos”
26 – Modificações no regime de empresas farmacêuticas “para promover a competição e reduzir custos”
27 – Modificação da Lei de Sociedades para permitir que os clubes de futebol se tornem sociedades anônimas, se assim o desejarem
28 – Desregulação dos serviços de internet via satélite
29 – Desregulação do setor de turismo, eliminando o monopólio das agências de viagens
30 – Incorporação de ferramentas digitais para procedimentos nos registros automotores

Argentinos fazem primeiro protesto contra Javier Milei

Organizações de esquerda e sindicalistas realizaram ontem (20) o primeiro protesto na Argentina contra o novo presidente do país.

Visando desmobilizar as manifestações, o governo emitiu um decreto para tentar impedir que os ativistas obstruam as ruas, ameaçando também cortar benefícios sociais daqueles que fizerem piquetes nas vias.

Poucos dias após assumir, o novo governo anunciou um pacote de drásticas medidas econômicas para enfrentar a grave crise da Argentina, que enfrenta uma inflação crescente e aumento pobreza.

Entre as determinações, está a desvalorização de 50% do peso argentino, cortes no subsídios à energia e aos transportes e o encerramento de alguns ministérios do governo.

As medidas irritaram alguns grupos sociais e trabalhistas. O governo alertou que reprimiria quaisquer protestos que bloqueiem as ruas.

Prisão em flagrante para piqueteiros

A ministra da segurança de Milei, Patricia Bullrich, apresentou um novo “protocolo” para manter a ordem pública que permite às forças federais prender em flagrante quem estiver bloqueando ruas e autoriza que a polícia identifique – através de vídeo ou meios digitais – pessoas protestando e obstruindo vias públicas, podendo cobrá-los pelos custos da mobilização das forças de segurança.

O novo protocolo visa prevenir bloqueios, especialmente em Buenos Aires, onde protestos regulares muitas vezes interditam as ruas durante horas, o que é comumente conhecido como “piquetes”.

Alguns grupos dizem que o protocolo vai longe demais e criminaliza o direito de protestar.

Apelo à ONU

Na terça-feira (19), grupos trabalhistas, sociais e de direitos humanos argentinos assinaram uma petição solicitando às Nações Unidas e à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos para interceder contra o novo protocolo de segurança.

Na petição, eles dizem que ele é “incompatível com os direitos à liberdade reunião e associação, liberdade de expressão e protesto social” reconhecidos na Constituição do país.

O governo da Argentina foi mais longe esta semana e na segunda-feira anunciou que as pessoas que bloqueiam as ruas poderiam ser removidas de listas de benefícios de assistência pública, se estiverem em alguma delas.

​”Aos beneficiários de planos sociais: saibam que ninguém pode forçá-los a ir a uma marcha sob ameaça de tirar seu plano”, disse Sandra Pettovello, chefe do recém-criado Ministério do Capital Humano, que combina o que eram os ministérios do Trabalho, da Educação e do Desenvolvimento Social. “Protestar é um direito, mas também é o direito das pessoas circularem livremente através do território argentino para ir ao seu local de trabalho”, ressaltou.

Na Argentina, algumas pessoas recebem ajuda social diretamente do governo, mas outros obtêm auxílio através de organizações sociais com conexão direta para escritórios federais. A administração de Milei diz que muitos desses grupos usam isso como forma de forçar as pessoas a irem a protestos.

Polo Obrero, que representa os desempregados, é um dos grupos sociais que convocam os protestos na quarta-feira. Seu líder, Eduardo Belliboni, disse que o governo de Milei está planejando ir “contra o direito de protestar”.

Aniversário de massacre em protesto

Pessoas foram chamadas para protestar em Buenos Aires, marchando desde o Congresso até a histórica Plaza de Mayo. A marcha coincidirá com o 22° aniversário de um protesto contra a gestão governamental de uma crise econômica que deixou dezenas de mortos e levou à renúncia do então presidente Fernando de la Rúa

Uma pesquisa recente do Observatório de Psicologia Social Aplicada indicou que 65% dos entrevistados concordam com a proibição dos bloqueios.

Milei, uma economista de 53 anos que ganhou fama na televisão com tiradas carregadas de palavrões contra o que ele chama de “casta política”, tornou-se presidente com o apoio dos argentinos desiludidos com a crise econômica.

A Argentina tem uma taxa de inflação anual de 161%, e quatro em cada 10 pessoas estão na pobreza. O país sul-americano também tem uma dívida de 45 bilhões de dólares com o Fundo Monetário Internacional (FMI).


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