04/05/2024 - Edição 540

Mundo

Portugueses dão meia volta volver e marcham para a direita, como o resto da Europa

Aos 50 anos, os cravos terão de ser regados em Portugal

Publicado em 11/03/2024 12:59 - Ricardo Noblat (Metrópoles), Jamil Chade (UOL) – Edição Semana On

Divulgação Getty Images

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

Foi uma disputa taco a taco, deputado a deputado, e até se falou de empate técnico, mas ao final da noite, contados os votos, o resultado deu a vitória à Aliança Democrática (AD), coligação de partidos de centro-direita, que elegeu 79 deputados e teve 28,66% dos votos. O Partido Socialista, de centro-esquerda, ficou com 77 deputados e 28,70% dos votos.

Mas a vitória da AD foi logo reconhecida pelo líder do PS, Pedro Nuno Santos, que afirmou que não votará moções de rejeição ao programa de governo da AD. Recusou que Portugal fique à espera dos votos dos migrantes para ter a certeza de quem ganhou. Esses votos só serão apurados no próximo dia 20, e servirão para eleger quatro deputados.

Caiu o número de votos do chamado centro. A AD e o PS não atingiram juntos a casa dos 60%. Mas há dois anos, eles elegeram mais de 85% dos deputados. Cabe agora ao presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, convidar Luís Montenegro, líder da AD, a formar o futuro governo. Por enquanto, não se sabe que outros partidos o apoiarão.

O grande vencedor da noite foi o Chega, de extrema-direita, comandado por um radialista. Há dois anos, atraiu 7,5% dos votos e elegeu 12 deputados. Agora, 18,06% dos votos e 48 deputados. Um resultado que lhe dá a condição de partido decisivo para o funcionamento da Assembleia da República. O Chega quer governar com a AD, que jura rejeitá-lo.

A AD poderá governar com o partido Iniciativa Liberal, que elegeu oito deputados e continua como quarta força. Outra das novidades das eleições: há hoje em Portugal uma maioria clara de direita com mais de metade dos votos e a redução dos votos à esquerda. O PS ficou muito menor e os demais partidos de esquerda também, à exceção do Livre.

Há 50 anos, a serem completados em 25 de abril próximo, passava da meia noite quando a canção Grândola, Vila Morena foi transmitida pela Rádio Renascença. Estranho! Era uma canção proibida pela ditadura que governava o país há 48 anos porque fazia alusão ao comunismo. Foi o sinal para desatar a rebelião militar que derrubaria a ditadura.

Começava a Revolução dos Cravos, assim chamada porque a população distribuía cravos vermelhos a vários soldados, que os enfiaram nos canos de suas armas. Chico Buarque celebrou a revolução com a música “Tanto mar”.

Aos 50 anos, os cravos terão de ser regados em Portugal

O resultado eleitoral em Portugal confirmou o avanço da extrema direita, justamente num momento em que, ironicamente, o país e o mundo se preparam para comemorar os 50 anos da Revolução dos Cravos.

Uma revolução que colocou fim às décadas de ditadura de Salazar e abriu o caminho para que Portugal fosse reincorporado à família das democracias.

O grupo do partido Chega se esforça para se desvencilhar do passado. Mas os gestos, lemas e mesmo postagens revelam que a simpatia por Salazar existe.

Em 2019, por exemplo, um dos líderes do partido, Pedro Pessanha, celebrou o 25 de Abril colocando no perfil de suas redes sociais a foto de António de Oliveira Salazar. Em 2012, ele concluiu uma crítica ao então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho com um solene: “Viva Salazar! Viva Portugal!”.

André Ventura, hoje líder do partido, foi em busca do lema do Estado Novo – “Deus, Pátria e Família” – para marcar suas campanhas nos últimos três anos. Incorporou apenas a palavra “”Trabalho”.

A eleição deste fim de semana revela que a democracia precisa funcionar na vida cotidiana das pessoas, diariamente. Ela precisa significar a possibilidade de que um sonho tenha um destino. Caso contrário, como já vimos em vários cantos, a extrema-direita encontrará um espaço para agir e ganhar adeptos com falsas promessas. E sabemos, nós no Brasil, que essas promessas matam.

Não há “piloto automático” no processo democrático de um país. Os cravos precisam ser regados. Todos os dias.

Em Portugal e no Brasil.

 


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *