18/05/2024 - Edição 540

Especial

Um governo corrupto

Bolsonaro minou combate à corrupção e abriu os cofres a aliados

Publicado em 14/10/2022 1:16 - Jamil Chade e Josias de Souza (UOL), Tiago Pereira (RBA), Julinho Bittencourt (Fórum) – Edição Semana On

Divulgação Victor Barone - Midjourney

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Sob a gestão de Jair Bolsonaro, que prometeu acabar com a corrupção, o Brasil foi rebaixado na avaliação que monitora como governos estão implementando um dos principais tratados internacionais de combate à corrupção criado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Entre os inúmeros retrocessos, o exame cita a interferência política nos órgãos de combate à corrupção no país por parte do Executivo, a perda de independência da Procuradoria-Geral da República e da Polícia Federal, o fim das Forças Tarefas e a falta de transparência. O Brasil foi um dos nove casos de países que viram as piores quedas em suas avaliações nos últimos anos.

A adesão à OCDE é um dos principais focos da política externa do bolsonarismo. Mas, para ser aceito, o país terá de dar provas de que está adotando medidas para cumprir a Convenção contra o Suborno de Agentes Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE. Trata-se de um dos instrumentos mais importantes da legislação internacional contra a corrupção.

Mas uma avaliação independente feita pela Transparência Internacional e publicada nesta terça-feira revela uma deterioração na implementação do acordo por parte do Brasil, que assinou o tratado ainda em 2002.

“As principais fraquezas são a inadequação dos mecanismos de reclamação e proteção de denunciantes, especialmente no setor privado; a definição inadequada de suborno estrangeiro, que não responde pela corrupção privada; e a interferência política no trabalho das agências de aplicação da lei, que continua sendo uma marca registrada do governo do presidente Jair Bolsonaro, com sérias conseqeências para os esforços anticorrupção”, declarou o informe.

A interferência de Bolsonaro, de fato, chama a atenção internacional. “Bolsonaro mudou o comando da Polícia Federal quatro vezes desde assumindo o poder, alegadamente com o objetivo de exercer mais controle sobre a agência de aplicação da lei. Em todos, pelo menos 18 funcionários em funções-chave na Pol?cia Federal têm sido o alvo do governo entre 2019 e 202”, destaca.

Por isso, de acordo com o relatório global de avaliação, o Brasil passou de uma implementação “moderada”, na avaliação divulgada em 2020, para uma implementação “limitada” de mecanismos contra o suborno transnacional.

O relatório abarca o período de 2018 a 2021 e avaliou os 43 países signatários da Convenção, além de China, Índia, Hong Kong e Singapura, que não fazem parte do tratado, mas são responsáveis por parcela significativa do comércio internacional.

A meta do tratado é a de combate um tipo específico de corrupção, altamente lesivo ao comércio internacional e ao desenvolvimento econômico: o pagamento de propinas, por parte de empresas multinacionais ou exportadoras, a funcionários públicos estrangeiros para favorecer seus negócios no mercado global.

Bolsonaro desfez avanços

De acordo com a avaliação, a situação atual mostra um reviravolta no combate à corrupção no país. “O Brasil vinha em uma trajetória de melhoria significativa na classificação do relatório de 2018 (saltando duas categorias, de “nenhuma aplicação” para “aplicação moderada”), estabilização no de 2020 (se manteve como “moderado”) e agora um retrocesso no relatório de 2022 (aplicação limitada)”, afirma a avaliação, publicada em Berlim.

“A queda na classificação no relatório atual se deve à redução no número de investigações abertas, de processos iniciados e de condenações em casos de suborno transnacional. No período analisado, o Brasil iniciou apenas 5 investigações, começou um processo, e concluiu apenas dois casos com aplicação de sanções relacionados ao suborno transnacional”, alertou.

Entre os fatores principais que levaram ao rebaixamento do Brasil estão:

(1) perda de independência de instituições que atuam no controle da corrupção internacional, em especial a Procuradoria-Geral da República, a Polícia Federal e o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI, vinculado ao Ministério da Justiça);

(2) descontinuação do modelo das Forças Tarefas (essencial para investigações de casos complexos de corrupção internacional), sem sua substituição por estruturas adequadas de trabalho em equipe e cooperação interinstitucional;

(3) transferência da competência de investigação de casos de corrupção e lavagem de dinheiro quando associados a crimes eleitorais (como caixa dois) para a Justiça Eleitoral, com menos estrutura e especialização para processar crimes complexos;

(4) insegurança jurídica e deficiências legais sobre instrumentos vitais para o enfrentamento à corrupção transnacional, como os acordos de leniência, a recuperação de ativos e compensação de vítimas e a proteção aos denunciantes de boa fé (whistleblowers);

(5) Pouca transparência de dados sobre investigações contra o suborno transnacional e sobre as sanções aplicadas pela Controladoria-Geral da União (CGU), especialmente no caso de acordos de leniência.

“Os inúmeros retrocessos para o combate à corrupção nos últimos cinco anos resultaram em uma piora na capacidade das instituições brasileiras de punir casos de suborno transnacional, o que, sem dúvida, impactará negativamente o processo de adesão do país à OCDE”, disse Guilherme France, consultor da Transparência Internacional Brasil.

“Esperamos que o Grupo de Trabalho Antissuborno da OCDE estabeleça, entre as condições indispensáveis para esta adesão, a recuperação da autonomia das instituições de controle do Brasil, incluindo a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, e o fortalecimento dos mecanismos de investigação e persecução criminal de casos complexos de corrupção que ultrapassam fronteiras”, afirma

Aras levou a um “forte declínio de investigações de corrupção”

O informe deixa claro a frustração em relação ao procurador-geral, Augusto Aras. Segundo a entidade, seu mandato “foi manchado por omissões contrárias às alegações de corrupção dentro do governo do Presidente Jair Bolsonaro” e pela “falta de vontade de investigar funcionários de alto nível do governo federal”.

As acusações ainda apontam que Aras “desmontou o modelo da força tarefa no Ministério Público Federal (MPF), o que levou a um forte declínio nas investigações de corrupção em todo o país”. Se as forças tarefas foram desfeitas, a entidade destaca que estruturas de substituição planejadas não foram adequadamente implantados em muitos estados.

“Também são motivo de grande preocupação os numerosos e processos judiciais abertos tanto pelo Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Federal Tribunal de Contas contra os promotores do MPF que eram membros do grupo de trabalho Lava Jato e agora enfrentar penalidades sem precedentes e desproporcionais”, disse. “Isto tem tido um efeito arrepiante sobre os ação de acusação”, alerta.

OCDE vê com preocupação situação brasileira

O relatório está sendo lançado no momento em que o Grupo de Trabalho Antissuborno (WGB) da OCDE se reúne, em Paris. “Caberá a esse comitê, entre outros grupos temáticos da organização, emitir pareceres para chancelar ou colocar ressalvas à adesão do Brasil à entidade”, explicou a Transparência.

“Em 2019, preocupado com os retrocessos do Brasil no cumprimento da Convenção, o WGB enviou uma missão e special de alto nível ao país para verificar in loco a situação. O cenário continuou se deteriorando e, no final de 2020, o organismo criou, pela primeira vez em sua história, um subgrupo para monitorar especificamente a situação do Brasil, que continua sendo acompanhado como um caso crítico”, destaca.

Na última quinta-feira, 6, o governo Bolsonaro promoveu uma coletiva de imprensa para anunciar o envio, à OCDE, do memorando inicial para a adesão ao bloco, uma autoavaliação sobre quais dos requisitos estabelecidos pela entidade o Brasil já cumpre e quais ainda não cumpre.

Segundo o governo, o Brasil aderiu a 108 e dos 230 principais instrumentos normativos da instituição e já solicitou adesão a outros 45 instrumentos.

Mas a Transparência Internacional lamenta que o documento de autoavaliação esteja sendo mantido sob sigilo, “o que significa que a sociedade brasileira não pode verificar qual é o retrato de país que seu governo está apresentando à OCDE”.

“É importante ressaltar, no entanto, que a avaliação da OCDE levará em conta não apenas a existência de normas alinhadas à organização, mas também sua efetividade. O que mostra o relatório é que, em relação ao suborno transnacional, o Brasil tem falhado justamente em garantir a correta implementação dessas medias”, completa.

“As principais fraquezas são a inadequação dos mecanismos de reclamação e proteção de denunciantes, especialmente no setor privado; a definição inadequada de suborno estrangeiro, que não responde pela corrupção privada; e a interferência política no trabalho das agências de aplicação da lei, que continua sendo uma marca registrada do governo do Presidente Jair Bolsonaro, com sérias conseqüências para os esforços anticorrupção.

O Brasil foi um dos nove países a piorar de classificação nesta edição do relatório, junto com Reino Unido, Israel (ambos da categoria “ativo” para “moderado”), Itália, Espanha, Suécia, Portugal (de “moderado” para “limitado”), Dinamarca e Lituânia (de “limitado” para “pouco ou não cumprimento”).

Entenda por que o orçamento secreto flerta com ilegalidades e com a corrupção

O orçamento Secreto está produzindo um rastro de destruição em áreas sensíveis do Estado brasileiro, como saúde e educação, já combalidas com a perda paulatina de recursos, em função do teto de gastos. Recursos que iriam para políticas públicas, por exemplo, foram desviados para atender ao apetite por emendas da base aliada do presidente Jair Bolsonaro no Congresso Nacional. No episódio mais recente, o governo Bolsonaro bloqueou mais R$ 2,4 bilhões de recursos que seriam destinados ao Ministério da Educação (MEC) deste ano. A verba vai para parlamentares aliados aplicarem como bem entenderem, em mais uma manobra do chamado orçamento secreto.

A manobra é resultado de um governo fraco, que precisou do Congresso para não investigar seus crimes de responsabilidade que poderiam levar a um impeachment. Desse modo, o Executivo passou a subordinar grande parte do Orçamento da União passou ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Lira coordena o esquema e sentou em cima de mais de 140 processos de impeachment contra o atual presidente. Por meio dessa barganha que fere os princípios republicanos, Lira recebeu somente neste ano R$ 492 milhões em emendas para aplicar nos seus redutos eleitorais. Como resultado, ele viu sua votação crescer mais de 50% nas últimas eleições, na comparação com pleitos anteriores.

Ignorando critérios técnicos, esses recursos são aplicados ao sabor dos interesses dos parlamentares agraciados com as chamadas “emendas de relator”. É possível saber quanto cada parlamentar recebeu. No entanto, não há transparência, e não se pode saber ao certo onde foi aplicado o dinheiro.

“Maior esquema de corrupção do planeta”

De acordo com a senadora Simone Tebet (MDB-MT), “podemos estar diante do maior esquema de corrupção do planeta Terra”. Em entrevista recente ao podcast Flow, a então candidata à presidência – que agora declarou apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno – explicou o funcionamento do esquema.

Ela citou o caso, revelado pela revista piauí, do município de Pedreira (MA). Com 39 mil habitantes, para justificar as emendas recebidas via Orçamento Secreto, a prefeitura informou que realizou mais de 540 mil extrações dentárias.

“Significa ter tirado 14 dentes de cada cidadão da cidade, inclusive do bebê recém-nascido, que não tem dente.”

A mesma reportagem mostra outro município do interior do Maranhão que realizou mais testes de HIV/aids do que toda a cidade de São Paulo, que tem mais de 12 milhões de habitantes.

“Então posso estar falando de uma nota fria onde digo ‘fiz tal coisa, me paguem’. Não estou falando daquela coisa de levar 10%, não (superfaturamento). Estou falando de uma nota inteira. O dinheiro pode ter saído de Brasília, chegado lá e ter ido para o bolso de alguém. Não tem sentido as menores cidadezinhas do Maranhão receberem os maiores recursos desse orçamento”, criticou Simone.

Para se ter ideia da influência das emendas do orçamento, o Maranhão deu 69% dos votos a Lula, elegeu o ex-governador Flávio Dino (PSB) com 62%, e também o candidato apoiado por ele, Carlos Brandão (PSB), com 51%. Por outro lado, dos 18 deputados federais eleitos pelo estado, 12 são de partidos apoiadores de Bolsonaro no segundo turno. Inclusive os quatro mais votados, dois do PL e dois do União Brasil.

Os “vencedores”

O Orçamento Secreto explica, em parte, porque o Brasil votou em Lula, mas deu ao PL de Bolsonaro a maior bancada de deputados federais.

Além das suspeitas de corrupção e dos desvios de finalidade, o Orçamento Secreto é um dos fatores que contribuiu para o crescimento das bancadas dos partidos do chamado Centrão – como o PL, PP, e Republicanos. O PL, por exemplo, conquistou 33 cadeiras nas eleições de 2018. Com a janela partidária, o partido de Bolsonaro subiu para 76, antes da eleição. Ma no último domingo (2), o partido elegeu 99 deputados para a próxima legislatura.

A votação de Bolsonaro, que teve cerca de 51 milhões de votos no primeiro turno, por si só, não explica o crescimento da bancada do seu partido. Fosse assim, o PT, que elegeu 68 deputados, deveria ter ficado com mais de 100 cadeiras na Câmara. Isso porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) obteve mais de 57 milhões de votos, 6 milhões a mais que Bolsonaro. Assim, uma das causas da diferença do tamanho das bancadas entre os dois partidos é o Orçamento Secreto, que serviu para irrigar candidaturas de aliados do presidente, e não da oposição.

Levantamento do jornal O Globo mostra que dos 13 que receberam mais de R$ 100 milhões do orçamento secreto neste ano, apenas um não se reelegeu. Outros dez tiveram votações mais expressivas agora do que nas últimas eleições. Arthur Lira, por exemplo, que recebeu R$ 492 milhões em emendas, viu sua votação saltar de 143.858, em 2018, para quase 220 mil votos nessas eleições, crescimento de 52,55% no total de sufrágios.

“Como você se sente ao ver que o Arthur Lira embolsou sozinho MEIO BILHÃO DE REAIS em emendas do orçamento secreto?”, questionou o cientista social Leonardo Rossato. “Não tem discussão de ideias que consiga concorrer com isso”, frisou o especialista. Assim, o orçamento secreto destrói com qualquer princípio de equidade entre os atores que disputam as eleições.

Batalha

A discussão em torno da revogação ou manutenção do Orçamento Secreto deve ser uma das principais batalhas no Congresso no ano que vem. Em caso de vitória de Bolsonaro, pouca coisa deve mudar, com os parlamentares avançando sobre fatias cada vez maiores das verbas da União. O ex-presidente Lula, por outro lado, promete acabar com o esquema, retomando para o governo federal a prerrogativa de decidir sobre a alocação dos recursos federais. O ex-presidente aposta no diálogo com os líderes do Congresso para pôr fim às emendas de relator.

Outro caminho é sepultar o orçamento secreto através do Supremo Tribunal Federal (STF). A ministra Rosa Weber, que assumiu a presidência da Corte no mês passado, é a relatora de um processo que questiona a legalidade das emendas de relator. O tema entraria em votação após o segundo turno das eleições.

No entanto, caciques do Centrão, como o próprio Arthur Lira, dizem que caso o STF ou o próximo presidente da República decida acabar com o Orçamento Secreto, os parlamentares do Centrão e aliados fariam passar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), oficializando o esquema. Lira ameaça inclusive se antecipar ao próprio STF, colocando a PEC em votação também logo após o segundo turno.

Falta papel higiênico em escola, mas sobram casos de corrupção na Educação

Novo capítulo da política de terra arrasada do governo Bolsonaro na área de Educação, o bloqueio de R$ 2,4 bilhões para o ensino superior levará a cortes na água, luz, comida para estudantes e até na manutenção de banheiros, segundo reitores. Ao final de quatro anos de gestão, o pessoal não vai encontrar papel higiênico na escola, mas denúncia de corrupção é o que não vai faltar.

Como esquecer o icônico áudio do então ministro da Educação Milton “Tiro Acidental” Ribeiro afirmando que “foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim” a demanda por acolher as necessidades do pastor Gilmar Santos e de seus “amigos” prefeitos, interessados em recursos públicos.

Santos e o pastor Arilton Moura integravam o “gabinete paralelo” montado no MEC, segundo revelou o jornal O Estado de S.Paulo. Para tanto, cobravam propina em dinheiro, bíblias e até barras de ouro. Ironicamente, parte do autointitulado povo de Deus continua recolhendo ouro para seus bezerros e falsos ídolos (Êxodo, capítulo 32), milhares de anos depois do episódio no monte Sinai.

Descoberto o esquema, o ministro caiu. Mas gravações de conversas telefônicas apontam que ele continuou sendo ajudado pelo presidente, que o avisou de que a Polícia Federal estava em sua cola, atrapalhando uma investigação. O presidente não combateu a corrupção, mas o combate à corrupção, como alertou o próprio ex-juiz Sergio Moro, antes de fazer as pazes com o antigo chefe para se eleger senador.

Não só Jair, mas a chapa inteira do PL tem suas digitais nesse escândalo. A Casa Civil da Presidência da República, então comandada pelo general Braga Netto, hoje candidato a vice de Bolsonaro, pediu para que o Ministério da Educação atendesse o pastor Arilton Moura, em janeiro de 2021, conforme e-mail revelado pela Folha de S.Paulo.

A relação do pastor com a família Bolsonaro, vale lembrar, é anterior à chegada de Milton Ribeiro ao ministério, em julho de 2020, como pode se constatar por declarações de gratidão do próprio senador Flávio Bolsonaro.

E os dois religiosos visitaram dezenas de vezes o Palácio do Planalto desde que Jair assumiu o cargo, como ficamos sabendo pelo pedido do jornal O Globo, via Lei de Acesso à Informação. Eram figurinhas fáceis na Vice-Presidência, na Secretaria de Governo, no Gabinete de Segurança Institucional, na Casa Civil. Uma festa da fruta.

Se você é professor, funcionário ou estudante e quer conseguir a atenção do Ministério da Educação para uma demanda justa (mais professores, reformas nas escolas, currículo decente, merenda, água, luz, papel higiênico), precisa juntar-se a outros milhares e irem protestar na rua sob o risco de levar borrachada da polícia, respirar gás lacrimogênio ou ser chamado de “massa de manobra” e de “vagabundo” pelo governo.

De kits de robótica a ônibus, a corrupção dos aliados de Bolsonaro na Educação

Há elementos mais do que suficientes para sustentar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para entender por que o MEC foi sequestrado por pastores evangélicos que cobravam propina e que eram próximos ao presidente da República. Mas também por que o então ministro-chefe da Casa Civil, Braga Netto, cobrou que o MEC atendesse os religiosos. E, claro, qual a razão de uma investigação assustar tanto Jair que, ao que tudo indica, baixou a mão peluda sobre a PF.

A CPI do MEC foi aberta, mas – por conta de acertos políticos – sua instalação deve acontecer apenas após as eleições. Não só porque uma parte do Congresso está defendendo Jair, mas porque está protegendo a si mesma. Sim, não só pastores se locupletaram usando o Ministério da Educação.

Por exemplo, municípios alagoanos com escolas precárias receberam R$ 26 milhões em emendas parlamentares para comprar kits de robótica de uma empresa de aliados de Arthur Lira, presidente da Câmara e fiador de Bolsonaro. A empresa lucrou 420% com cada unidade, adquirindo-a por R$ 2,7 mil e vendendo por R$ 14 mil. A investigação da Folha de S.Paulo aponta indícios de direcionamento na licitação, dificultando a entrada de concorrentes que poderiam cobrar mais barato.

Através do milagre da transmutação, licitações com sobrepreço historicamente se transformam em lucro fácil para empresários amigos da corte, mas também em cascalho para o bolso dos políticos que tornaram isso possível – que podem usá-lo em coquetéis de camarão ou em financiamento eleitoral.

A profusão de denúncias de desvios envolvendo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), dirigido por um ex-assessor do ministro-chefe da Casa Civil e líder do centrão, Ciro Nogueira (PP-PI), indica que teve muito parlamentar com grana não declarada para gastar nesta eleição.

Como esquecer a multimilionária licitação de quatro mil ônibus escolares que, se não fosse por denúncia do jornal O Estado de S.Paulo, teriam feito a alegria de muita gente.

Não sou eu quem diz isso, mas o procurador Lucas Rocha Furtado, que atua junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), que alertou que casos como o dos ônibus com sobrepreço podem se converter em um “prejuízo à democracia, a depender da destinação que esses recursos venham a ter, como, por exemplo, a composição do chamado ‘caixa 2 de campanha”.

Privilegiar bases de políticos por critérios eleitorais, ignorando decisões técnicas, atrasa a vida de quem realmente precisa de recursos para a educação. Isso seria um problema se o governo, que controla a bufunfa, se importasse.

Eleitorado radical de Bolsonaro vê universidades como ‘cracolândias comunistas’

A pior sacanagem é que toda essa promiscuidade ocorre após uma pandemia que afastou, por quase dois anos estudantes das salas de aula gerando uma defasagem em escolas públicas que já seria difícil de ser corrigida sob um governo e um Congresso funcionais que destinassem o dinheiro da educação para a educação. Imagine então com os que a gente tem.

Os recursos públicos poderiam ir para recuperar o tempo perdido. Poderiam. Mas isso qualquer gestor honesto faria. O que vemos hoje pelas mãos der pastores e parlamentares é ver a grana que seria usada para garantir carteiras, água encanada, energia elétrica, internet e banheiros nas escolas se transmutar em emendas ou em caixa 2.

Enquanto isso, parte do eleitorado radical de Bolsonaro bate palmas para o bloqueio de verbas para universidades, que eles veem como “cracolândias comunistas” e não como locais que desenvolvem vacinas e respiradores a baixo custo que salvaram vidas da covid-19.

No dia 23 de junho, Bolsonaro sancionou o projeto de lei que limita o ICMS sobre combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte. Mas vetou a compensação que o Congresso Nacional tinha aprovado para que estados e municípios pudessem manter os mesmos valores que desembolsavam em educação e saúde públicas antes da nova lei. Ou seja, tirou da educação para botar no tanque de combustível para delírio da “carrocracia” brasileira, onde veículos têm mais direitos que gente.

Ao negar a recomposição de recursos, o presidente tenta mostrar resultados econômicos no curto prazo para as eleições rifando a qualidade de vida futura da população que não pode pagar uma escola particular. Tirar orçamento da educação fará com que a qualidade desses serviços caia. Alguma escola continuará sem água encanada e luz elétrica, outras não terão internet e ainda há aquelas que permanecerão sem laboratórios.

A questão é de timing. Não tem importância tungar o povão, desde que ele só perceba isso quando for tarde demais, ou seja, depois de 30 de outubro.

Cartel do asfalto fraudou mais de um bilhão em licitações, diz TCU

O TCU (Tribunal de Contas da União) revelou através de auditoria indícios da ação de um cartel de empresas de pavimentação em fraudes a licitações da estatal Codevasf que somam mais de R$ 1 bilhão no governo do candidato à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL).

O ministro do TCU relator do caso, Jorge Oliveira, que foi indicado por Bolsonaro, de quem é amigo, contrariou o parecer da área técnica do tribunal e não suspendeu o início de novas obras ligadas às licitações sob suspeita.

A construtora Engefort foi apontada pelo levantamento como a principal beneficiada do suposto esquema, vencendo editais com indícios de fraude que somam R$ 892,8 milhões.

Guia de combate a cartéis

O TCU adotou como base na investigação um guia de combate a cartéis usado pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Foram encontradas pelo órgão evidências que envolveram propostas de fachada e combinação de rodízio entre as empresas.

Além do aumento expressivo de lotes licitados, ocorreu ao mesmo tempo redução da concorrência e diminuição abrupta no desconto médio nas licitações entre 2019 e 2021.

No ano passado foram encontrados os casos mais graves. A Engefort deu em média apenas 1% de desconto nas 50 licitações que venceu, o que foge do padrão de mercados.

Leia reportagem completa na Folha


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