18/05/2024 - Edição 540

Especial

TIC, TAC…

Se hacker provar o que disse, Bolsonaro vai em cana e leva generais junto

Publicado em 18/08/2023 10:33 - Leonardo Sakamoto e Josias de Souza (UOL), André Richter (Abr), Yurick Luz (DCM), Vinícius Segalla (Intercept_Brasil) – Edição Semana On

Divulgação Victor Barone - Midjourney

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Se o depoimento do hacker Walter Delgatti Neto à CPMI dos Atos Golpistas for embasado com provas e documentos e não ficar só no gogó, não apenas Jair Bolsonaro deve passar um longo período no xilindró por conspirar contra a democracia, como levará consigo alguns que passaram pela cúpula das Forças Armadas.

Delgatti afirmou que visitou o Ministério da Defesa em cinco ocasiões após ouvir em reunião de uma hora e meia com o então presidente da República um pedido para ele encontrar uma forma de atacar as urnas e tirar a credibilidade do sistema eletrônico de votação.

Segundo o hacker, ele chegou a se reunir com general Paulo Sérgio Nogueira, então ministro da pasta. Reconheceu que não era possível invadir o sistema de totalização ou mudar o código-fonte da urna de forma remota. Daí, como prêmio de consolação ao bolsonarismo, invadiu o sistema do Conselho Nacional de Justiça e colocou uma ordem de prisão falsa contra Alexandre de Moraes. Mas, antes, teria alimentado as Forças Armadas.

Em depoimento à Polícia Federal após ser preso em 2 de agosto, Delgatti já havia dito que orientou o relatório das Forças Armadas sobre o processo eleitoral de 2022. “Tudo o que foi colocado no Relatório das Forças Armadas foi com base em explicações do declarante”, aponta um trecho. Agora, reforçou isso na CPMI.

A declaração é gravíssima, pois o trabalho da tal comissão técnica do Ministério da Defesa que estava “fiscalizando” as eleições foi usada por Jair contra o próprio sistema eleitoral. E o tal relatório estimulou o movimento golpista que desaguou no 8 de janeiro.

Divulgado no dia 9 de novembro do ano passado, o documento não apontou a ocorrência de fraudes nas eleições. “Conclui-se que a verificação da correção da contabilização dos votos, por meio da comparação dos Boletins de Urna (BU) impressos com os dados disponibilizados pelo TSE, ocorreu sem apresentar inconformidade”, afirmou o relatório em sua página 24, pouco antes de listar um resumo das “oportunidades de melhoria”.

Ou seja, nada foi encontrado. Mas o então ministro Paulo Sergio de Oliveira encaminhou junto uma nota em tom especulativo para atender às necessidades do bolsonarismo. Citou “possível risco” à segurança na geração dos programas das urnas eletrônicas e afirma que os testes de funcionalidade das urnas não foram suficientes para afastar a “possibilidade” da influência de um eventual código malicioso.

Na sequência, o Ministério da Defesa divulgou uma nota baseada em uma falácia descrita no mais básico manual de lógica. De acordo com o texto, o trabalho da equipe de técnicos militares “embora não tenha apontado, também não excluiu a possibilidade da existência de fraude ou inconsistência nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral de 2022”.

Não é porque as Forças Armadas não conseguiram provar que fraudes são impossíveis que elas ocorreram de fato. Algo que alguém não provou ser falso não é necessariamente verdadeiro, da mesma forma algo que pode, em tese, acontecer não aconteceu de fato necessariamente. Uma criança entende isso, mas os bolsonaristas-raiz engoliram.

O relatório e a nota foram bombados pelas redes bolsonaristas, ajudando os golpistas a permanecerem mobilizados em frente às portas dos quartéis e em estradas. Entre os depoimentos de golpistas presos após o 8 de janeiro, há aqueles que dizem que foram a Brasília para tentar ver o “código-fonte”.

Na época, a situação foi imediatamente percebida pelo presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, que emitiu nota recebendo com “satisfação” o relatório que “não apontou a existência de nenhuma fraude ou inconsistência nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral de 2022”. Completou, afirmando que as sugestões serão analisadas depois.

A fiscalização das urnas eletrônica e do sistema de votação não é atribuição das Forças Armadas (que deveriam cuidar das nossas fronteiras, mais porosas que esponja), mesmo assim foi isso o que elas fizeram a pedido de Bolsonaro.

Confirmado que Walter Delgatti Neto foi fundamental para o relatório em questão, e lembrando que ele foi incumbido pelo então presidente de atacar as urnas eletrônicas, temos mais uma confirmação de que membros da cúpula militar atuaram ao lado de Jair contra a democracia. E precisam ser punidos de acordo com a lei.

Não podem alegar que estavam seguindo ordens porque a Constituição não lhes permite que um hacker com más intenções dite uma declaração em papel timbrado das Forças Armadas para ser usado como aríete contra a República.

Diante do medo de ser preso, o hacker afirmou que Bolsonaro lhe garantiu indulto. “Eu poderia cometer um ilícito que seria perdoado”, afirmou à CPMI. Equiparou à promessa ao caso do então deputado Daniel Silveira, indultado por Jair após ter sido condenado pelo STF.

Incensado no ano passado como lutador da liberdade, hoje Silveira está esquecido, amargando uma cela em Bangu.

Briga de gambás

Os aliados de Bolsonaro na CPI do Golpe, entre eles os filhos Flávio e Eduardo, se esmeraram em desqualificar Walter Delgatti. Sergio Moro, cuja reputação como juiz foi moída pelo conteúdo da Vaza Jato— chamou o depoente de “estelionatário”. E foi chamado por ele de “criminoso contumaz”. Os bolsonaristas não notaram. Mas, ao realçar o prontuário malcheiroso de Delgatti, potencializaram a fedentina que exala dos diálogos que Bolsonaro travou com ele.

A Polícia Federal, que interrogara Delgatti na véspera, intimou-o para novo depoimento nesta sexta-feira. Ele omitiu da PF muito do que contou à CPI. Bolsonaro também será intimado oportunamente. Embora acuse Delgatti de calúnia, o capitão admite que dividiu a mesa do Alvorada com ele. Reconhece também que ordenou aos militares da pasta da Defesa que dessem ouvidos à desqualificação. Os investigadores da PF enxergam a guerra de versões como uma briga de gambás. Avaliam que todos sairão do inquérito cheirando mal.

Após contribuir para a ressurreição política de Lula, o estelionatário e hacker da Vaza Jato gravou a marca do golpe nas bochechas de Bolsonaro. No depoimento à CPI, o personagem disse ter tomado café da manhã com Bolsonaro em 10 de agosto do ano passado. Relatou que o capitão lhe encomendou um lote de tarefas criminosas. O principal problema não é a presença de marginais no Alvorada. O maior incômodo é que o enredo de Delgatti sobre a encomenda de delitos soou crível, pois ornou com o comportamento público de Bolsonaro.

De acordo com Delgatti, Bolsonaro lhe pediu para violar urnas eletrônicas, propôs num telefonema que assumisse a autoria de um grampo contra Alexandre de Moraes em troca de indulto e o encaminhou ao Ministério da Defesa. Enxergou nele criminalidade suficiente para que instruísse os militares escalados pelas Forças Armadas para contestar a segurança do sistema eleitoral. Delgatti esteve na Defesa cinco vezes. Reuniu-se até com o general Paulo Sérgio Nogueira, que comandava o ministério.

Na versão de Delgatti, Bolsonaro também avalizou pedido feito a ele na véspera —9 de agosto— pelo marqueteiro da campanha à reeleição, Duda Lima. Consistia em inserir um “código malicioso” numa urna eletrônica que seria exibida no 7 de Setembro de 2022 numa encenação destinada a trombetear a falsa impressão de que seria possível adulterar o voto. O encontro teve testemunhas. Entre elas Valdemar Costa Neto, o dono do PL, e a deputada Carla Zambelli, que intermediou os contatos de Delgatti com Bolsonaro e a cúpula da campanha.

Sob Bolsonaro, as coisas não são certas ou erradas. São absorvidas ou pegam mal. As conversas com Delgatti pegaram mal. Muito mal. Bolsonaro e seus asseclas qualificaram a desqualificação porque tramavam usar a mão de obra do interlocutor para cometer crimes. Tudo o que conseguiram foi invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça para inserir nele um pedido jocoso de prisão contra Alexandre de Moraes.

Construiu-se um enredo amalucado. Nele, aliados lunáticos achavam que seria possível erguer um castelo no ar. O mito psicótico imaginou que permaneceria eternamente nele. A Polícia Federal exerce agora o papel de psiquiatra, cobrando o aluguel.

Movimentação dos suspeitos derrete escudo de Bolsonaro

Digamos que até a semana passada Bolsonaro tivesse o general Lourena Cid para segurar a língua do filho Mauro Cid, a cumplicidade muda de Frederick Wassef, as orações de Michelle e a solidariedade dos seus milicianos políticos. Hoje, Bolsonaro precisa se certificar, urgentemente, da fidelidade de Valdemar Costa Neto. O ex-presidiário do mensalão pode ser a última coisa que lhe resta. Nos últimos dias, apenas Valdemar se animou a postar um vídeo solidarizando-se com o mito.

Tratado pela Polícia Federal como membro da “organização criminosa” das joias, o general Lourena Cid parece mais preocupado com sua autodefesa do que com a autocombustão do filho. Com a língua mais disponível, o coronel Mauro Cid, abandonado pelo penúltimo defensor, contratou um novo advogado que realça uma obviedade: a quadrilha não é acéfala. Cidinho, militar disciplinado, apenas interpretou ao pé da letra o nome do seu cargo. Nessa versão, quem deve pagar pelos crimes é o chefe, não o ajudante cumpridor de ordens.

Frederick Wassef, apelidado de “Wacéfalo” por ter transformado a operação de recompra de um Rolex numa lambança com aparência de confissão, adicionou um drama novo à rotina do defensor de Bolsonaro. Cada vez que o perdigueiro jurídico da família da rachadinha rosna, o advogado do capitão precisa explicar por que seu cliente é amigo dele. Wasseff perdeu as prerrogativas de associado da OAB. Autoconvertido de advogado em delinquente, ele sofre batida policial em público. Teve o celular apreendido pela Polícia Federal numa churrascaria.

Michelle Bolsonaro agora tem menos tempo livre para as preces. Com as contas pessoais em desalinho, está prestes a ser intimada pela Polícia Federal a prestar depoimento. Sentiu a necessidade de contratar, também ela, um bom advogado. Precisa construir uma defesa. Madame ainda acredita que Deus existe. Mas começa a suspeitar que Ele não é full-time. Bolsonaro talvez passe a examinar periodicamente a rigidez do dedo indicador de sua mulher. Delações domésticas não são incomuns na política brasileira.

Em privado, até Valdemar já antevê a prisão de Bolsonaro. Convém não discutir com um especialista.

Moraes autoriza quebra de sigilo bancário de Bolsonaro e Michelle

O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou na quinta-feira (17) a quebra do sigilo bancário e fiscal do ex-presidente Jair Bolsonaro e da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

A medida foi solicitada na semana passada pela Polícia Federal (PF) no âmbito da investigação da Operação Lucas 12:2, que apura o suposto funcionamento de uma organização criminosa para desviar e vender presentes recebidos pelo ex-presidente de autoridades estrangeiras.

Segundo as investigações, os desvios começaram em meados de 2022 e terminaram no início deste ano. Entre os envolvidos estão o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e o pai dele, o general de Exército, Mauro Lourena Cid. O militar trabalhava no escritório da Apex, em Miami.

Conforme regras do Tribunal de Contas da União (TCU), os presentes de governos estrangeiros deviam ser incorporados ao Gabinete Adjunto de Documentação Histórica (GADH), setor da Presidência da República responsável pela guarda dos presentes, e que não poderiam ficar no acervo pessoal de Bolsonaro, nem deixar de ser catalogados.

Confissão de Mauro Cid vai exigir da PF confisco do passaporte de Bolsonaro

Caso Mauro Cid – caixa eletrônico de primeira-dama, hacker de cartões de vacina, serviço de atendimento a oficiais golpistas e assessor para ataques à urna eletrônica – confirme que entregou a Jair Bolsonaro o dinheiro oriundo da venda de um Rolex doado ao Brasil a mando do próprio, a Polícia Federal vai precisar pedir urgentemente ao Supremo Tribunal Federal a apreensão do passaporte do ex-presidente. Só por garantia, para evitar uma fuga.

O novo advogado do tenente-coronel, Cezar Bitencourt, afirmou à revista Veja que ele vai confessar que vendeu patrimônio público cumprindo ordens de Jair. E, de lambuja, dirá que adulterou os cartões de vacinação. Imagine o que pode revelar sobre o seu serviço de saque e depósito de grana para Michelle se estiver com vontade de falar.

Como está preso desde o dia 3 de maio, mantendo-se quieto diante da Polícia Federal e da CPMI dos Atos Golpistas, Cid pode estar engasgado com o sentimento de abandono por parte do ex-patrão. A gota d’água para abandonar a lealdade cega a Jair pode ter sido a operação de busca e apreensão contra seu pai, o general Mauro Lourena Cid, apontado como parte do esquema de lavagem de joias, o que manchou sua reputação.

Com a confissão, que vai colocar Bolsonaro como chefe de uma quadrilha de militares que contrabandearam, desviaram e venderam joias doadas ao Brasil por governos árabes, corre o risco de o ex-presidente se escafeder do país. Porque, afinal das contas, cresce a chance de um xinlindró.

Vale lembrar que Jair tem experiência em fugas. No dia 30 de dezembro, pegou um avião e abandonou o cargo dois dias antes do fim do mandato, menos por não querer entregar a faixa a Lula e mais pelo medo de ser responsabilizado pelos atos golpistas planejados para o 8 de janeiro.

Eu já indaguei aqui se ele enfrentaria a cana como fez o petista ou buscaria asilo político em algum país com governo de extrema direita e sem acordo de extradição com o Brasil vendendo a narrativa de estar sendo “perseguido”?

A Polícia Federal não pode pagar para ver a resposta. É compreensível se não quiser pedir uma prisão cautelar neste momento da investigação, preferindo reunir mais provas inquestionáveis, mas é necessário confiscar o passaporte de Bolsonaro e da diretora do PL Mulher e ex-primeira-dama, além de solicitar medidas para proibir que ele saia do país através de aeroportos e postos de fronteira.

Na esteira do escândalo das joias, os deputados federais Jandira Feghalli (PC do B-RJ) e Rogério Correia (PT-MG) já pediram às autoridades e à CPMI dos Atos Golpistas que apreendam os documentos de viagem dos dois.

Durante operação de busca e apreensão na casa do ex-presidente por conta de outro escândalo, o de hackeamento dos registros de vacina contra a covid-19, o ministro Alexandre de Moraes já havia autorizado a apreensão do passaporte. A PF, no entanto, considerou que não seria preciso naquele momento.

Pois agora é.

Flávio Dino diz que prisão de Bolsonaro só “depende da disposição do STF”

O ministro da Justiça, Flávio Dino, já debate a possibilidade de prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro por fraude, apropriação e desvio de bens públicos, no caso das joias sauditas recebidas de presente pelo seu governo. A informação é do colunista José Casado, da Revista Veja.

“É evidente que essa responsabilidade se acha relacionada com o próprio ex-­presidente. Não é crível que haja esse comércio inusitado de bens, com circulação de valores, e não houvesse algum tipo de ciência (dele). Eu diria que indícios múltiplos, consistentes, conduzem neste momento a um delineamento progressivo de uma responsabilidade que vai além dos assessores, por motivos lógicos”, disse Dino.

O ministro também vê o ex-mandatário “enlaçado” nos “indícios de autoria” e na “materialidade de um crime”, como já reportou a Polícia Federal (PF) ao Supremo Tribunal Federal (STF). Ele, até o momento, considera prisão apenas uma hipótese. “A prisão já é debatida, mas vai depender da disposição do STF”, disparou Dino.

Vale destacar que aliados do governo Lula veem uma oportunidade para indiciar o ex-presidente por quatro possíveis crimes após as acusações levantadas por Walter Delgatti Netto, o hacker da Vaza Jato, em depoimento à CPI do 8 de janeiro.

O ex-capitão pode ser enquadrado nos crimes de golpe de Estado, escuta telefônica ilegal, participação no crime de autoacusação falsa e a participação, por indução, no delito de “incitação ao crime”.  As penas, somadas, podem chegar a 18 anos de prisão.

A nova condenação de Jair Bolsonaro na justiça

Jair Bolsonaro está cada vez mais encalacrado por causa da investigação da Polícia Federal sobre o esquema das joias sauditas, mas a nova dor de cabeça com a justiça veio pela sua boca suja e seus maus modos contra jornalistas.

O ex-presidente  foi condenado pela 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo por 175 agressões contra a imprensa. A ação civil pública foi movida pelo Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo. A pena é a multa de R$ 50 mil. Ele ainda poderá recorrer a instâncias superiores.

A condenação saiu na última segunda-feira, 14. Os ataques aconteceram no ano de 2020 e juntam 26 ocorrências de agressões diretas a jornalistas; 149 tentativas de descredibilização da imprensa e duas ocorrências direcionadas à Federação Nacional dos Jornalistas, a Fenaj.

A fonte dos dados apresentada no processo pelo sindicato é o relatório de 2020 “Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil”, compilado pela Fenaj.

Jair Bolsonaro atacou jornalistas

Dentre os 175 episódios ofensivos citados no processo, o Sindicato dos Jornalistas destacou alguns que ganharam enorme repercussão à época. Um dos principais aconteceu no dia 4 de março de 2020, quando Bolsonaro levou o humorista Marvio Lúcio, do programa Pânico, a uma entrevista coletiva concedida em frente ao Palácio da Alvorada – durante sua gestão, esse espaço ficou conhecido como “puxadinho” e era onde acontecia a maioria dos ataques. No dia, o humorista levou um cacho de bananas e tentou distribuir aos jornalistas.

Sobre esse episódio, o advogado do sindicato dos jornalistas escreveu que “era de se esperar que o presidente tivesse um comportamento compatível com o cargo de dignitário máximo da nação e não como o de um animador de um programa popular de auditório que manipula sua ‘plateia’ como se fosse uma ‘claque’ para vaiar, ofender e rir dos profissionais que estão ali trabalhando”

Durante sua passagem pela Presidência da República, Jair Bolsonaro se notabilizou pela recorrente grosseria no trato com jornalistas que lhe faziam perguntas incômodas. Ele proferiu comentários homofóbicos, xingamentos, disse para mulheres repórteres se calarem durante entrevistas, e chegou a dizer a um repórter de O Globo que gostaria de socá-lo na boca. O profissional havia lhe perguntado por que o policial militar Fabrício Queiroz, investigado por envolvimento no esquema de rachadinhas, tinha depositado cheques na conta de Michele Bolsonaro, esposa do ex-presidente.

A Organização Internacional Repórteres Sem Fronteiras, em seu balanço anual de violações e ataques à liberdade de imprensa, monitorou 580 ataques a jornalistas e veículos em 2020 no Brasil, sendo 103 apenas do então presidente Jair Bolsonaro.

A ONG afirmou ainda que o mandato de Jair Bolsonaro foi um período de “forte hostilidade contra jornalistas” e que o ex-presidente “atacou sistematicamente jornalistas e veículos de imprensa” no Brasil. No ano de 2021, ele foi incluído na lista “predadores da imprensa”, criada pela organização.

Sindicato dos jornalistas processou Bolsonaro

Esta foi a terceira derrota de Bolsonaro no mesmo processo. No dia 7 de junho do ano passado, a juíza de primeira instância Tamara Hochgreb Matos condenou o ex-presidente impondo uma multa de R$ 100 mil.

O ex-presidente recorreu da decisão. Em maio, a 4ª Câmara do TJ-SP manteve a condenação, mas reduziu o valor da multa à metade.

Inconformado, Bolsonaro ingressou com novo recurso – o chamado embargo de declaração – e chegou a alegar que suas “críticas” não se dirigiam à imprensa como um todo, e sim apenas a uma parte dela, que ele chamou de “imprensa de esquerda”.

Na última segunda-feira, a página 1.788 do Diário da Justiça de SP trouxe a decisão em segunda instância, rejeitando o embargo declaratório e pondo fim ao processo no âmbito da Justiça de São Paulo.

Caso ainda queira recorrer dessa decisão, Bolsonaro terá que recorrer para as cortes superiores do país – o Superior Tribunal de Justiça, o STJ, ou o Supremo Tribunal Federal, o STF.

Jornalistas resistiram aos ataques de Bolsonaro

O presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, Thiago Tanji, disse que a decisão em segunda instância é mais uma vitória dos jornalistas, que resistiram aos ataques cometidos pelo ex-presidente e seus seguidores.

“As decisões judiciais, em primeira e em segunda instância, resgatam com detalhes as inúmeras agressões contra jornalistas, que foram fartamente documentadas.”

Tanji também afirmou que, ao recorrer da decisão, a própria defesa de Bolsonaro praticamente assinou uma confissão de culpa, ao dizer que tinha ofendido somente uma parcela da imprensa ligada à esquerda.

“Além de ser um absurdo, já que ele tenta responsabilizar as vítimas pelos ataques, também é uma mentira: profissionais das grandes empresas de comunicação também foram alvo de hostilidades e desrespeitos. Diante de tudo isso, podemos dizer que o ex-presidente é judicialmente um assediador de uma categoria profissional e um condenado”, disse.

O Intercept procurou o advogado e assessor de imprensa de Jair Bolsonaro, Fabio Wajngarten, para que o ex-presidente pudesse falar sobre a condenação, mas ele não respondeu nossos questionamentos. Também perguntamos se o ex-presidente pretende entrar com um recurso junto às cortes superiores, mas até a publicação desta reportagem, não houve resposta.


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