18/05/2024 - Edição 540

Poder

Em desespero, Bolsonaro e aliados vendem reunião golpista como bobagem

Para não passar por conspirador, Heleno se fez de ‘bobo’ na CPI

Publicado em 27/09/2023 10:08 - Leonardo Sakamoto e Josias de Souza (UOL) – Edição Semana On

Divulgação Presidência da República

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O general Augusto Heleno é o mais novo integrante da força-tarefa bolsonarista formada para desqualificar a acusação de que Jair convidou os ex-comandantes das Forças Armadas a embarcarem em seu golpe de Estado em reuniões no Palácio do Alvorada. Na delação do tenente-coronel Mauro Cid, o almirante Garnier teria colocado suas tropas à disposição, conforme apontou reportagem de Aguirre Talento, no UOL.

Em seu depoimento, na terça (26), à CPMI dos Atos Golpistas, Heleno, que foi ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional durante a gestão passada, afirmou que “não existe um ajudante de ordens sentar numa reunião com comandantes das Forças, isso é fantasia”.

Foi defrontado com uma foto de 2019 em que Cid aparecia em uma reunião com o chefe e os comandantes militares.

Como é muito difícil negar as reuniões em si, o esforço dos envolvidos tem sido no sentido de reduzir a importância delas ou colocar em dúvida o que Cid acha que viu e ouviu.

O general e senador Hamilton Mourão, no intuito de proteger a imagem das Forças Armadas, afirmou que o encontro foi “um mero blá-blá-blá”. Ele havia sido questionado pelo jornal O Globo se não mereceria punição alguém que tratou de um plano para tomar o poder.

O próprio Jair Bolsonaro deu a letra de como seria feita a sua defesa ao ser perguntado se temia o que Cid contaria em sua delação premiada em relação às reuniões ocorridas em novembro e dezembro no Alvorada. “Eu posso discutir qualquer coisa, posso pensar qualquer coisa, mas se não botar em prática não tem problema”, afirmou a Lauro Jardim, de O Globo.

E o que foi discutido?

O ex-comandante do Exército, general Freire Gomes, relatou que Bolsonaro, militares de seu entorno e da reserva fizeram apelos às Forças Armadas em nome de um golpe, segundo aponta reportagem de Cézar Feitosa, na Folha de S.Paulo.

Ele, o almirante Garnier e o brigadeiro Baptista Júnior teriam sido chamados dez vezes ao Palácio do Alvorada entre novembro e dezembro após a derrota de Bolsonaro para Lula. Todas as reuniões foram convocadas por Mauro Cid — aquele que não sabe de nada, segundo Heleno — ou pelo próprio ex-presidente.

As Forças Armadas não embarcaram institucionalmente na aventura golpista, mas podem confirmar como um ex-presidente e um grupo de militares pilantras tentaram quebrar a democracia por ação ou omissão.

Se há gente que topa ir para o cadafalso com Jair, vai ficando claro que, por outro lado, também há os que não aceitam pular no fogo em nome de um político cujo lema é “cada um por si e eu acima de todos”.

Pelas informações que vêm da caserna, parece que não é só Mauro Cid que decidiu que não irá para a cadeia para proteger a liberdade de Bolsonaro.

Para não passar por conspirador, Heleno se camuflou de abilolado

Augusto Heleno evitou comparecer fardado à CPI do Golpe. Pressentindo que a conjuntura o arrastara para um ambiente hostil, recorreu a uma velha tática do combate na selva. Acabou exagerando na camuflagem. Para esconder a conspiração à flor da pele, exibiu-se aos parlamentares como um abilolado sem visão. Ao final da inquirição ficou entendido o seguinte: em terra de cego, general que tem um olho não diz a ninguém que os golpistas ficaram nus.

Para Heleno, o acampamento que pedia golpe na frente do QG de Brasília era uma “manifestação pacífica” e Bolsonaro não saiu do quadrado constitucional. Na percepção do general, a delação do tenente-coronel Mauro Cid é “uma fantasia”, pois ajudante de ordens que senta numa reunião do presidente com comandantes das Forças Armadas é coisa que “não existe”.

Sobre o quebra-quebra de 8 de janeiro, Heleno disse que não teria como dar explicações, porque deixou a chefia do Gabinete de Segurança Institucional no dia 31 de dezembro. Na verdade, o general tornara-se ex-ministro da pasta que deveria cuidar do serviço de inteligência ainda no exercício do cargo.

Heleno não viu os terroristas que saíram da porta do quartel para queimar ônibus e carros e tentar explodir um caminhão de combustível. Não viu as tratativas golpistas de Bolsonaro com o hacker de Araraquara na cozinha do Alvorada. Heleno nã viu nem mesmo o Mauro Cid que se escondia atrás dele na foto de uma reunião do chefe com os comandantes das Forças, no Planalto.

O general chamou de “bobagem” e “besteira” a acusação de tentativa de golpe. A alturas tantas, disse: “Não ia dar certo nunca.” Foi seu comentário mais certeiro. Já não se fazem golpistas como antigamente. Augusto Heleno, um ex-valentão, não vê, não sabe e não participa de nada. Só mente um pouco. O cinismo é o máximo de sofisticação filosófica do general. É o que mais se aproxima da verdade.


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