18/05/2024 - Edição 540

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Parlamento Europeu pede cessar-fogo em Gaza: Chile e México acionam Haia para investigar crimes contra palestinos

Com 1 chuveiro para 2 mil pessoas em Gaza, OMS vê 'explosão de doenças'

Publicado em 19/01/2024 11:34 - DW, Jamil Chade (UOL) – Edição Semana On

Divulgação Ashraf Amra – Anadolu Agency

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Pela primeira vez em mais de cem dias da guerra Israel-Hamas, o Parlamento Europeu aprovou uma resolução na quinta-feira (18/01) pedindo um “cessar-fogo permanente” e a retomada de “esforços em direção a uma solução política” do conflito israelo-palestino – desde que atendidas duas condições: a “soltura imediata e incondicional” de todos os 136 reféns mantidos em cativeiro na Faixa de Gaza e o desmantelamento do Hamas, considerado uma organização terrorista pela União Europeia (UE) e outros países do Ocidente.

A medida, que tem caráter simbólico e não tem força de lei, foi aprovada por 312 eurodeputados, com 131 votos contrários e 72 abstenções, em um momento onde o saldo de mortos no lado palestino do conflito ultrapassa os 24 mil, segundo autoridades em Gaza ligadas ao Hamas.

No texto, os eurodeputados condenam “os abomináveis ataques terroristas cometidos pelo Hamas” contra Israel e apoiam o direito do país à autodefesa em conformidade com o direito internacional, mas ressalvam que isso quer dizer que “todas as partes de um conflito precisam distinguir entre combatentes e civis o tempo inteiro”, e que “civis e infraestrutura civil não devem ser alvos”.

Israel, por sua vez, tem argumentado que age de acordo com o direito internacional, e acusa o Hamas de fazer civis de escudo humano e usar instalações civis para propósitos militares, fazendo delas, portanto, alvos legítimos no conflito.

Para os eurodeputados, as forças israelenses têm agido com “desproporcionalidade” e o saldo de civis mortos é algo “sem precedentes”.

A aprovação da resolução, inicialmente capitaneada por socialistas, centristas e verdes no Parlamento Europeu, foi fruto de um acordo com o centro-direitista Partido Popular Europeu (EPP).

Até então, o Parlamento Europeu defendia “pausas humanitárias” que permitissem o envio de alimentos, água e medicamentos a civis em Gaza – medida esta aprovada por uma ampla maioria de 500 votos.

“Não pode haver uma paz sustentável enquanto o Hamas e outros grupos terroristas sabotarem a causa palestina e ameaçarem a existência de Israel, a única democracia na região”, afirmou Antonio López-Istúriz, do EPP.

Chile e México acionam Haia para investigar crimes contra palestinos

Os governos do México e o Chile encaminharam ao procurador do Tribunal Penal Internacional (TPI) um pedido formal para que a corte, com sede em Haia, realize uma investigação sobre o provável cometimento de crimes dentro de sua jurisdição contra os palestinos.

Não se trata da mesma corte acionada pela África do Sul que, também em Haia, recorreu à Corte Internacional de Justiça (CIJ), denunciando o estado de Israel por genocídio. No caso sul-africano, o Brasil demonstrou apoio político. Mas não agiu nem para submeter suas alegações e nem fazer uma defesa jurídica do caso.

Se na CIJ a denúncia é contra o estado de Israel, no TPI, agora, trata-se de um processo contra os autores e mandantes dos eventuais crimes. Ou seja, contra o primeiro-ministro, seu gabinete e os chefes das forças armadas.

O procurador, de fato, já vem investigando os atos tanto do Hamas como do governo de Israel. Mas a demora em apresentar uma denúncia se contrasta com a velocidade pelo qual o mesmo procurador agiu contra a Rússia, na invasão da Ucrânia.

Num comunicado emitido nesta quinta-feira, os governos do Chile e México explicam que o encaminhamento se baseia nos artigos 13(a) e 14 do Estatuto do TPI, que permite que um Estado Parte encaminhe ao promotor uma situação em que um ou mais crimes sob a jurisdição do Tribunal pareçam ter sido cometidos. Bolívia, Bangladesh e a própria África do Sul já tinham acionado o mesmo procurador, em novembro, denunciando os atos de Israel.

Mesmo que os crimes não estejam sendo cometidos contra chilenos ou mexicanos e nem que os crimes estejam sendo supostamente registrados em outros territórios, as regras permitem que as ações possam existir.

“A ação do México e do Chile segue a crescente preocupação com a mais recente escalada de violência, em particular contra alvos civis, e o suposto cometimento contínuo de crimes sob a jurisdição do Tribunal, especificamente desde o ataque de 7 de outubro de 2023 por militantes do Hamas e as subsequentes hostilidades em Gaza”, disse o comunicado dos dois governos latino-americanos.

“Com esta ação, o México reitera seu apoio ao TPI como o fórum apropriado para o estabelecimento da responsabilidade criminal internacional individual nos casos mais graves e de maior relevância para a comunidade internacional, ao mesmo tempo em que enfatiza a importância de garantir a independência do promotor do TPI para investigar os crimes cometidos no contexto do conflito em Gaza, sejam eles cometidos por agentes da potência ocupante ou da potência ocupada”, diz.

Segundo os dois governos, uma intervenção do TPI assume “uma relevância especial à luz dos inúmeros relatórios da ONU que apontam para um grande número de incidentes que podem constituir crimes dentro da jurisdição do TPI de acordo com o Estatuto de Roma”.

“Isso é agravado pelo colapso quase total da infraestrutura da justiça nacional palestina, que não seria capaz de investigar ou processar possíveis crimes cometidos em seu território ou por seus cidadãos”, alertam.

O Estado da Palestina é parte do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional desde 1º de abril de 2015, o que significa que o Tribunal tem jurisdição para investigar crimes dentro de sua jurisdição que tenham ocorrido no território do Estado Palestino ou por seus cidadãos.

“O México reitera seu compromisso com a justiça internacional, a prevenção do genocídio e de outros crimes de guerra e crimes contra a humanidade”, afirma a nota.

“Também confia que essas ações, baseadas na solução pacífica de controvérsias, podem abrir espaços para um cessar-fogo imediato e contribuir para pavimentar o caminho para uma paz duradoura na região, baseada na solução de dois Estados vivendo lado a lado dentro de fronteiras seguras e internacionalmente reconhecidas”, completou.

Ocupação israelense na Cisjordânia

A Faixa de Gaza tem sido bombardeada quase ininterruptamente pelas forças israelenses desde que radicais palestinos, sob a liderança do Hamas, invadiram Israel em 7 de outubro e assassinaram ao menos 1.139 pessoas, além de sequestrar outras cerca de 250 – destas, estima-se que 136 continuem na Faixa da Gaza; não se sabe ao certo quantas delas estão vivas.

Nesta quinta, os eurodeputados também voltaram a pedir o fim da ocupação israelense de territórios palestinos, reiteraram que os assentamentos israelenses na Cisjordânia são “ilegais perante o direito internacional”, condenaram a escalada de violência perpetrada por colonos israelenses naquela região e urgiram a União Europeia a lançar uma iniciativa em prol da solução de dois Estados para a paz entre palestinos e israelenses – algo a que o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, tem sinalizado se opor.

Falando a jornalistas nesta quinta, Netanyahu afirmou que qualquer solução futura para a paz na região precisa incluir o controle militar de Israel sobre “todo o território a oeste do Rio Jordão”.

A resolução aprovada pelo Parlamento Europeu condena ainda a expansão do conflito no Oriente Médio, citando ataques do libanês Hisbolá a Israel e dos iemenitas da milícia Houthi no Mar Vermelho.

Falta de consenso na UE

O Conselho Europeu, que representa os 27 países-membros da União Europeia, ainda não se pronunciou sobre um cessar-fogo e tem, até agora, apoiado “pausas e corredores humanitários”.

Consensos sobre a guerra Israel-Hamas têm sido difíceis no bloco, com alguns países se pronunciando mais a favor de Israel e outros mais a favor dos palestinos.

Netanyahu já afirmou diversas vezes no passado que a guerra não terminaria até que o Hamas fosse desmantelado e os reféns, trazidos de volta.

No início de dezembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) aprovou, por ampla maioria, uma resolução não vinculativa que exigia um cessar-fogo humanitário imediato na Faixa de Gaza. O texto, porém, não condenava especificamente o Hamas.

O Conselho de Segurança da ONU, órgão que poderia aprovar uma resolução vinculativa do ponto de vista do direito internacional impondo um cessar-fogo, não o fez até agora por falta de consenso entre seus membros permanentes.

Com 1 chuveiro para 2 mil pessoas em Gaza, OMS vê ‘explosão de doenças’

Num alerta emitido nesta sexta-feira (19), a OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta para a “explosão” de doenças entre a população da Faixa de Gaza. Segundo a agência, a destruição de infraestrutura básica, o deslocamento de 1,7 milhão de pessoas, a falta de hospitais e de saneamento são as principais explicações.

A região vive uma ofensiva israelense desde o começo de outubro, como resposta aos ataques feitos pelo Hamas e que deixaram mais de 1,2 mil mortos entre os israelenses. Muitos eram civis e o ato foi condenado pela ONU e dezenas de governos pelo mundo. Usando dados do Ministério da Saúde em Gaza, a ONU destacou que o conflito se aproxima dos 25 mil mortos, 61 mil feridos e milhares ainda sob os escombros dos prédios destruídos.

Mas a reação das autoridades de Israel vem gerando indignação entre as agências internacionais, principalmente diante do impacto na sociedade civil.

Essas são as principais conclusões da OMS, mais de 100 dias depois do início do conflito:

– 223.600 casos de infecções respiratórias em abrigos de pessoas deslocadas

– 158.300 casos de diarreia, incluindo 84.000 entre crianças com menos de cinco anos de idade

– 68.700 casos de piolhos e sarna

– 6.600 casos de varicela

– 44.550 casos de erupções cutâneas

Casos de hepatite E sendo identificados, com 7.529 casos presumidos (com sintomas da Síndrome da Icterícia Aguda (AJS),

Lugar mais perigoso do mundo para ser uma criança

O número de casos de diarreia entre crianças com menos de cinco anos de idade registrados durante os últimos três meses de 2023 é 26 vezes maior do que os relatórios do mesmo período em 2022. Segundo a Unicef, o aumento foi de 40% apenas no último mês.

“Se essa situação continuar, vamos ver mais mortes por conta de fome e doenças, que por bombas”, alertou Ted Chaiban, vice-diretor-executivo da Unicef. “Gaza é o lugar mais perigoso do mundo para ser uma criança”, afirmou. Segundo ele, dos quase 25 mil mortos, 70% são mulheres e crianças.

“A morte de crianças precisa parar imediatamente”, disse.

Enquanto isso, a ONU denunciou nesta sexta-feira atos de tortura cometidos por forças de Israel contra prisioneiros palestinos. “Os horrores não podem ser normalizados”, disse Ravina Shamdasani, porta-voz da ONU para Direitos Humanos.

Num raio-x da situação, a OMS ainda avalia que o cenário é agravado pelos seguintes fatores:

Mais de 1,7 milhão de pessoas foram desalojadas de suas casas e estão vivendo em abrigos superlotados.

Em média, 500 pessoas compartilham um banheiro e mais de 2.000 compartilham um chuveiro, sendo que, às vezes, não há banheiros disponíveis nos abrigos.

A falta de banheiros e serviços de saneamento forçou as pessoas a defecar ao ar livre, aumentando a preocupação com a disseminação de doenças.

As atividades de vacinação de rotina interrompidas, bem como a falta de medicamentos para o tratamento de doenças transmissíveis, aumentam ainda mais o risco de disseminação acelerada de doenças. Isso é agravado pela cobertura incompleta do sistema de vigilância de doenças, incluindo a detecção precoce de doenças e as capacidades de resposta.

Os sistemas de vigilância de rotina não estão funcionando atualmente, dificultando a detecção, a análise e a resposta eficazes às ameaças à saúde pública.

Inúmeros indivíduos sem acesso a instalações de saúde podem não estar sendo diagnosticados, o que indica que a situação pode ser mais grave do que parece.

Atualmente, a OMS está avaliando as opções de transporte de amostras para o Egito, reforçando as capacidades de vigilância e detecção e a implantação de laboratórios móveis.


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