18/05/2024 - Edição 540

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Ministro israelense sugere bombardeio nuclear contra palestinos

Cresce a suspeita de que o 'fator revide' retém brasileiros em Gaza

Publicado em 06/11/2023 2:36 - DW, Ricardo Noblat (Metrópoles), Josias de Souza (UOL) – Edição Semana On

Divulgação Reprodução

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Um membro do gabinete do governo israelense foi suspenso das reuniões do governo após ventilar a possibilidade de um bombardeio nuclear à Faixa de Gaza.

Ministro do Patrimônio Judaico e membro de um partido de ultradireita que integra a coalizão governista, Amichai Eliyahu fez o comentário durante uma entrevista a uma rádio israelense. Depois, alegou que “qualquer pessoa razoável entenderia que o comentário era metafórico”. “Mas definitivamente precisamos responder de forma poderosa e desproporcional ao terrorismo”, afirmou.

O partido dele, Otzma Yehudit, não integra nem tem influência sobre o gabinete de segurança que coordena as ações militares contra o grupo radical islâmico Hamas  em resposta aos atos terroristas de 7 de outubro.

Na mesma entrevista, Eliyahu também se opôs ao envio de ajuda humanitária à região, argumentando que “nós não entregaríamos ajuda humanitária aos nazistas”. Ele, que apoia a tomada de Gaza e a restauração de assentamentos israelenses no território, afirmou ainda ao ser questionado sobre o destino dos palestinos que “eles podem ir para a Irlanda ou para os desertos; os monstros em Gaza devem encontrar uma solução por si mesmos.”

Governo se distancia de declarações, e oposição pede demissão do ministro

No domingo (5), o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, reagiu às declarações tachando-as de “divorciadas da realidade” e anunciando a suspensão do ministro. À rádio oficial das Forças de Defesa de Israel (IDF), Netanyahu declarouque o país segue “os mais altos padrões do direito internacional” para evitar ferir civis.

Também o ministro da Defesa Yoav Gallant se distanciou de Eliyahu, afirmando ser “bom que pessoas assim não estejam no comando da segurança de Israel”.

Líder da oposição, Yair Lapid referiu-se às declarações como “horror e loucura” de um “ministro irresponsável” e exigiu sua demissão. “A presença de extremistas no governo é um perigo para todos nós e para o sucesso dos objetivos de guerra: derrotar o Hamas e trazer os reféns de volta.”

Carnificina avança com o cerco de Israel à cidade de Gaza

Com seus bulevares, praças e casas de padrão bem superior ao quadro geral de pobreza de Gaza, Rimal, o local mais sofisticado e considerado um dos mais seguros da cidade de Gaza, foi reduzido a pó sob o peso de intenso bombardeio israelense.

Vingança devido à invasão de Israel pelo grupo radical Hamas no último 7 de outubro? As Forças de Defesa de Israel dizem que não, que Rimal apenas pagou o preço de abrigar dirigentes do Hamas. E eles estavam lá quando as bombas caíram? Ninguém sabe.

Os militares dizem que muitos estavam, mas não é possível verificar. Dizem também que havia dirigentes do Hamas no comboio de ambulâncias que levariam feridos para o Egito. Por isso, algumas delas foram bombardeadas.

A alegação dos militares procede? Ninguém sabe, nem eles mesmos. Sabe-se que o bombardeio matou e feriu dezenas de civis, como ocorreu com ataques a hospitais, escolas, a universidade de Gaza, e campos de refugiados em áreas urbanas. Guerra que segue.

Ou melhor: mortes que seguem. Amanhã completará um mês dos ataques terroristas do Hamas contra Israel. A carnificina não tem data para acabar. Dentro de 48 horas, a cidade de Gaza estará completamente cercada pelo exército de Israel.

Pela terceira vez, a internet e as linhas telefônicas foram cortadas na Faixa Gaza. É o aviso de que as portas do inferno se abrirão de novo. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu voltou a rejeitar os apelos para um cessar-fogo sem que os reféns sejam libertados.

O Hamas já ofereceu a libertação dos reféns, mais de 240, em troca da suspensão dos bombardeios. Netanyahu finge que não escutou. No fim de semana, a intensificação do conflito refletiu-se ainda na fronteira Norte de Israel com o Líbano.

Ali, três crianças com idades entre os oito e os 14 anos, e a sua avó, foram mortas quando um ataque israelense atingiu o carro que as transportava. O ministro dos Negócios Estrangeiros libanês anunciou que irá queixar-se à ONU. Adiantará alguma coisa?

Em Gaza, Israel bombardeou outro campo de refugiados, o de Maghazi, no centro do território. Pelo menos 47 pessoas foram mortas, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza. Já morreram 9.770 palestinianos, dos quais 4.800 crianças.

Saeed al-Nejma, de 53 anos, que dormia com sua família em Maghazi quando as bombas caíram, disse à agência inglesa de notícias Reuters

“De noite, eu e outros homens tentamos recolher os mortos entre os destroços. Apanhamos crianças, pessoas desmembradas, pedaços de corpos”.

Os movimentos de protesto contra a guerra em Gaza em muitos países tiveram uma evolução preocupante na Turquia no dia em que era esperada a chegada ao país do secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken.

Manifestantes pró-Palestina tentaram invadir a base militar dos Estados Unidos de Incirlik. Foram dispersados pela polícia com canhões de água e bombas de gás lacrimogêneo. A saída de cidadãos feridos em Gaza para o Egito continuou suspensa.

O domingo ficou marcado por mais dois episódios. O ministro do Património de Israel, Amichay Eliyahu, disse que lançar uma bomba atômica em Gaza era “uma opção”. Netanyahu desautorizou-o dizendo que ele estava “desligado da realidade”.

O Comando Central dos Estados Unidos comunicou que um submarino nuclear foi enviado ao Oriente Médio. Ele irá juntar-se a dois porta-aviões, o USS Gerald Ford e o USS Dwight D. Eisenhower, que já estão na região desde o início da guerra.

Após privilegiar os aliados, Israel culpa Hamas por reter brasileiros

A pretexto de explicar a retenção dos brasileiros no epicentro da guerra Israel – Hamas, a embaixada israelense em Brasília divulgou uma nota no sábado. O texto é curto. Tem apenas quatro parágrafos. Atribui aos terroristas do Hamas a culpa pela demora na liberação do grupo do Brasil. Mas não explica o privilégio concedido a países aliados, cujos cidadãos foram incluídos nas quatro primeiras listas de estrangeiros autorizados a deixar a Faixa de Gaza.

No primeiro parágrafo, a protelação que inquieta o Itamaraty e o Planalto é tratada como mera alegação. Nesse pedaço do texto, a embaixada explica que decidiu emitir a nota para expor seus “posicionamentos sobre os alegados atrasos na liberação de cidadãos brasileiros na Faixa de Gaza a partir dos ataques desumanos ocorridos a partir do dia 7 de outubro”.

No segundo parágrafo, a representação diplomática israelense reitera as atrocidades do ataque que sofreu em seu território no início do mês passado. Algo que o próprio governo brasileiro já reconheceu: “O Hamas é uma organização terrorista que sequestra, massacra, estupra e tortura centenas de pessoas de muitas nacionalidades…”

No terceiro parágrafo, o mais relevante, a embaixada de Israel atribui ao inimigo a tranca que impede a saída do grupo que o Brasil deseja repatriar —34 pessoas, entre brasileiros natos, parentes e palestinos com residência no Brasil. “O Hamas está atrasando a saída de estrangeiros da Faixa de Gaza e os utiliza de maneira desumana para se apresentarem como vítimas”, diz a nota.

No quarto e último parágrafo, a embaixada dedica-se ao autoelogio: “O Estado de Israel está fazendo absolutamente tudo que pode e que está ao seu alcance para que todos os estrangeiros deixem a Faixa de Gaza o mais rapidamente possível.”

A manifestação veio à luz nas pegadas da divulgação da quarta lista de estrangeiros que deixaram Gaza no sábado através da passagem de Rafah, na fronteira com o Egito. Foram 599 pessoas. Nenhum brasileiro. Pelo terceiro dia consecutivo, a maioria foi de americanos (386). Na sequência, vieram cidadãos de outros países aliados de Israel: britânicos (112), franceses (51) e alemães (50).

Na lista da véspera, o privilégio concedido a aliados de Israel era igualmente nítido. Numa relação de 571 estrangeiros liberados para deixar a Faixa de Gaza, 367 eram americanos e 127 britânicos. Cresceu em Brasília a suspeita que atribui a reiterada exclusão de brasileiros a uma possível retaliação de Israel em função das posições do Brasil no Conselho de Segurança da ONU.

Na sexta-feira, o chanceler brasileiro Mauro Vieira havia tocado o telefone para o ministro das Relações Exteriores de Israel, Eli Cohen. Vieira disse ter recebido do colega a garantia de que o grupo do Brasil será autorizado a deixar a Faixa de Gaza apenas na próxima quarta-feira, uma semana depois do início do conta-gotas. Não houve menções a entraves impostos pelo Hamas.

No sábado, alheio à nota da embaixada israelense, o assessor internacional de Lula, Celso Amorim, telefonou para o conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Jake Sullivan. Reafirmou as preocupações do governo brasileiro, no pressuposto de que a inquietação será transmitida a Tel Aviv.

As articulações para a retirada de civis estrangeiros de Gaza envolvem quatro países: Israel, Egito, Catar e Estados Unidos. Os critérios que norteiam a elaboração das listas são desconhecidos. Mas ninguém ignora que Israel dá as cartas em articulação com seus principais aliados. Nesse contexto, regras escritas seriam menos perigosas do que a criatividade das justificativas.

Cresce a suspeita de que o ‘fator revide’ retém brasileiros em Gaza

O Brasil foi ignorado nas quatro primeiras listas de estrangeiros autorizados a deixar a Faixa de Gaza. A ausência dos Estados Unidos na primeira relação estimulou a crença na isenção. A segunda lista, feita majoritariamente de americanos, acendeu uma vela para a suspeita de favorecimento. Na terceira, a nova profusão de americanos e a inclusão de cidadãos britânicos fizeram surgir em Brasília um sentimento novo.

Embora nenhuma autoridade admita publicamente, a frustração do governo brasileiro começa a ser substituída pela decepção provocada pela hipótese de que a demora pode ser motivada por uma retaliação de Israel. Nessa versão, a protelação seria um troco de Israel às posições exibidas pelo Brasil na vitrine do Conselho de Segurança da ONU.

Diz-se que o grupo do Brasil pode estar na lista deste sábado. Ou na de domingo. Quer dizer: intencional ou não, o suplício imposto aos brasileiros já se tornou agonizante. Quem espera na derradeira fila da repatriação precisa manter sempre ao alcance da mão, como um comprimido de Isordil, uma dose de ceticismo. Em Gaza, ninguém está livre do infarto, das bombas ou de sofrer as dores da decepção com a ausência de uma menção na lista.

A fé remove montanhas. Mas o chanceler brasileiro Mauro Vieira não hesita em continuar empurrando, enquanto os 34 nomes que o Itamaraty enviou às autoridades de Israel e do Egito rezam para que mísseis não lhes caiam sobre a cabeça. Na quinta-feira, em conversa telefônica com o chanceler egípcio Sameh Shoukry, Vieira rogou novamente pela liberação do grupo do Brasil.

No meio da semana, a representação diplomática de Brasília no Cairo havia recebido a sinalização de que a lista desta sexta-feira traria boas-novas. Era lorota. A despeito do esforço da diplomacia e do fervor dos que anseiam pela fuga, as montanhas permaneceram inamovíveis nas últimas 72 horas. Israel dá as cartas. O Egito apenas manuseia a chave do portal de Rafah, que faz fronteira com os bombardeios.

Já não há força no universo capaz de deter no primeiro escalão do governo Lula a maledicência segundo a qual o “fator revide” retarda a repatriação. A comprovação da suspeita tornou-se irrelevante. A essa altura, a rotina dos brasileiros retidos em Gaza virou uma calamidade em prestações.

Cada minuto a mais na zona de guerra é uma eternidade a menos na taxa de sanidade mental dos que esperam. Diz-se nos bastidores que o pavio de Lula ficou mais curto. Nada melhor do que a impotência para esticar o pavio. Resta a quem não dispõe da força lembrar que a diplomacia traz a maciez injetada no nome.


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