02/05/2024 - Edição 540

Judiciário

Entenda o duro golpe que o Senado deu no STF com aprovação de PEC

Matéria vai agora à Câmara e reduzirá poder de integrantes de tribunais superiores e até de juízes em primeira instância

Publicado em 23/11/2023 9:36 - Henrique Rodrigues (Fórum), Fernando Miller (DCM) – Edição Semana On

Divulgação Marcos Oliveira/Agência Senado

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O Senado aprovou na noite de quarta-feira (22), por 52 votos a 18, uma PEC que é um duro golpe nos poderes do Supremo Tribunal Federal, em outras cortes superiores do país e até mesmo em tribunais de primeira instância. A matéria vai agora para votação na Câmara dos Deputados.

Se aprovada, a PEC 8/2021 tem por finalidade limitar decisões monocráticas (tomadas individualmente), assim como os pedidos de vista no STF e outros tribunais. De autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), e que tem como relator senador Esperidião Amin (PP-SC), a mudança vem sendo amplamente vista como uma retaliação do Congresso diante do protagonismo que o Supremo conquistou nos últimos tempos, sobretudo quando serviu como freio aos arroubos autoritários do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

E se for aprovada na Câmara?

Sempre que o presidente da República, da Câmara ou do Senado tomarem uma decisão, como promulgação de leis ou validação de atos, um único ministro, desembargador ou até mesmo juiz de primeira instância ficará impedido de suspender tal iniciativa por meio de uma medida cautelar (decisão liminar), suspendendo o efeito da lei ou do ato até que seu mérito seja analisado por um colegiado.

Na prática, quando um ministro do STF, por exemplo, suspende uma decisão tomada pelo presidente da Câmara, ou pelo chefe do Executivo Federal, essa medida não entra em vigor e permanece assim até a votação final do pleno do Supremo. Se entrar em prática, a PEC prevê que só decisões de todos os integrantes da Corte é que terão validade.

Quanto aos pedidos de vista, normalmente usados para paralisar um julgamento ou mesmo para largá-lo em alguma gaveta e legá-lo ao esquecimento, eles também terão novas regras. Se for aprovada na Câmara e passar a valer, a PEC autorizará apenas pedidos de vista coletivos e por um prazo máximo de seis meses, ao qual poderá ser acrescido mais um período de apenas três meses, o que faz com que um pedido de vista dure no máximo, na pior das hipóteses, três meses. Atualmente, cada um dos 11 ministros do STF pode pedir vistas e não há prazo para que o processo seja devolvido, muitas vezes implicando numa sequência quase que infinita de pedidos que podem fazer com que o objeto analisado fique para sempre paralisado no tribunal.

“Ministros do STF classificam como ‘traição rasteira’ o voto do líder do governo no Senado”, diz jornalista

A aprovação da PEC contou com o voto do líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA). Mesmo com a liberação da bancada pelo governo, Fabiano Contarato (PT-ES) orientou voto contrário. O senador capixaba fez uma referência à ação de Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia.

“Imaginem que nós temos uma pandemia, que todos os órgãos de controle sanitário determinem lockdown, e temos um presidente – hipoteticamente — que seja negacionista e baixe um ato determinando a abertura do comércio. Com essa PEC, não é mais possível um ministro decidir e determinar que aquele ato do presidente da República é inconstitucional para preservar o principal bem jurídico que é a vida humana”, disse Contarato.

Em entrevista à GloboNews, o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, minimizou o voto do colega do PT da Bahia, dizendo que seria uma ação “pessoal”.  “Ele deu um voto pessoal, assim como os outros senadores deram seus votos pessoais”, afirmou.

Costa disse que não houve orientação do governo Lula para a PEC que, segundo ele, “não foi pauta em nenhum momento de reunião ministerial e nem de reunião com o presidente da República”.

“Eu confesso que só soube bem depois, porque estava entrando em reunião, saindo de reunião. Eu não acompanhei o momento da votação e só soube depois da votação encerrada. Então, eu não posso dizer que foi surpresa porque nós não tínhamos discutido quem votaria a favor e quem votaria contra”, disse o ministro.

Os ministros do STF expressaram indignação em relação ao voto de Jaques Wagner. Segundo a colunista do Estadão, Eliane Cantanhêde, ministros, em condição de anonimato, consideraram a posição de Wagner como uma “traição rasteira” após a resistência do STF ao que foi descrito como um “golpe bolsonarista”.

Diante da postura do senador, o STF emitiu um ultimato: “ou Jaques Wagner se retira ou não haverá mais diálogo entre o STF, o Planalto e o governo”. Wagner foi o único senador do PT a se opor à orientação de seu próprio partido, que recomendou o voto “não”.

Na terça-feira, 22, Wagner permitiu que a bancada do PT votasse conforme sua escolha, adiando a votação para quarta-feira. Se a PEC fosse votada na terça, a oposição teria enfrentado dificuldades para garantir sua aprovação.

Antes da votação, o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, afirmou que o assunto “não é de competência do governo”.

Ele explicou que o líder do governo em questões desse tipo geralmente libera a bancada, já que o governo não pode expressar uma opinião sobre um tema não discutido por ele.

A aprovação da PEC, que restringe os poderes do STF, ocorreu após uma alteração de última hora feita pelo relator Esperidião Amin (PP-SC), resultado de um acordo que envolveu conversas com ministros do STF e parlamentares da base do governo.

A mudança permitiu que os ministros ainda possam derrubar atos normativos do governo federal por meio de decisões individuais. A proposta original previa que tais medidas só poderiam ser anuladas pela maioria do STF.

Além disso, Amin acatou a proposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de consultar as Casas Legislativas de origem das medidas questionadas no STF antes de os ministros decidirem suspendê-las ou não.

Ele também retirou do relatório o prazo de 180 dias para os pedidos de vista, em uma medida que busca melhorar a relação entre os poderes, conforme discutido entre Pacheco e o ministro Alexandre de Moraes do STF.


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