09/05/2024 - Edição 540

Ágora Digital

A palavra é prata, mas o silêncio, ouro

O jornalista Victor Barone resume a semana política

Publicado em 24/03/2023 11:51 - Victor Barone

Divulgação Victor Barone - Midjourney

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Meu sogro costumava dizer uma frase lapidar: “Ganho em calar-me”.

Alguém deveria apresentar o adágio ao presidente Lula.

A palavra é prata, mas o silêncio, ouro.

Lula escaparia sem maiores lesões à tentativa dos seus adversários de juntarem o que ele disse que pensara em fazer com Sérgio Moro à época em que ficou 580 dias preso em Curitiba, com a descoberta feita agora pela Polícia Federal de que o crime organizado planejava matar o ex-juiz e outras autoridades políticas. Mas poderia aproveitar o episódio para refletir sobre as vantagens e desvantagens de governar em modo palanque. Mais recato e cuidado com as palavras não faz mal a ninguém.

Por Ricardo Noblat

Sergio Moro desperta em Lula os instintos mais primitivos. Quando se refere ao inimigo, o presidente troca o cérebro pelo fígado. Fala dez vezes antes de pensar. Ao tratar como farsa o plano do PCC para sequestrar e eliminar Moro e outras autoridades, Lula conseguiu uma proeza indigesta: fez da limonada um limão. Deixou zonzos o governo e seus aliados. Tirou o bolsonarismo das cordas. E prolongou os holofotes de Moro.

Ao jogar a tese do complô no ventilador, Lula carbonizou o esforço do ministro da Justiça Flávio Dino para converter a eficiência da Polícia Federal num ativo político.

Por Josias de Souza

A tentação de culpar Lula pelo crescimento do crime organizado no país é grande e em breve atrairá vozes estridentes. Algumas delas já reclamam da incapacidade do governo de devolver a paz ao conflagrado estado do Rio Grande do Norte. Mas como não foi Lula que governou o país nos últimos 4 anos, nem nos últimos 8, nem nos últimos 12, talvez soe precipitado crucificá-lo. Também não foi ele que estimulou a população a se armar sabendo que parte das armas cairia nas mãos de criminosos. Bem, mas Lula, que agora chora por tudo, cometeu a incontinência verbal de revelar o que respondia, quando preso, a quem lhe perguntava como estava passando. Invariavelmente, ele dizia: “Só vai ficar bem quando eu foder com o Moro”.

Por Ricardo Noblat

MORO SENDO MORO

Na investigação que desmontou o plano do PCC para executar autoridades como o promotor paulista Lincoln Gakiya e o senador Sergio Moro, o Ministério Público de São Paulo e a Polícia Federal iluminaram o caminho. Nesse episódio, o Estado prevaleceu sobre o crime usando duas armas letais: inteligência e parceria. Salvo pelo setor de inteligência, Moro escalou a tribuna do Senado para defender o uso da força. Foi a primeira oportunidade de Moro para exibir alguma serventia como parlamentar. Revelou-se inútil. Não notou que a força se torna impotente quando falta método e jeito no combate ao crime organizado.

Como ministro da Justiça de Bolsonaro, um presidente com vínculos milicianos, Moro endossou a política armamentista e o vale-tudo policial do chefe. Cumprindo ordem judicial, abriu as portas de presídios federais para Marcola e outros criminosos. Deixou o governo acusando o chefe de interferência na Polícia Federal. No Senado, a sede de holofotes levou Moro a exagerar no autoelogio. Na hora dos agradecimentos, excluiu da lista o governo federal e o ministro Flávio Dino, da Justiça. Moro não perde a oportunidade de perder oportunidades.

Por Josias de Souza

Moro não terá vida fácil no Senado Federal. O ex-juiz todo-poderoso da Lava Jato, que pensou que sua estadia no parlamento seria um passeio no parque, já começou a encarar a realidade e, na quarta-feira (15), precisou segurar o choro, nitidamente nervoso, após ouvir um “caminhão” de acusações do senador Rogério Carvalho (PT-SE). Com a habitual lenga-lenga genérica do “combate à corrupção”, Moro foi interrompido enquanto falava na tribuna e precisou escutar o contraponto do petista, que “lembrou” o paranaense de seus processos viciados, das anulações feitas por tribunais superiores e também de sua ida para o governo de Jair Bolsonaro (PL) após ajudá-lo a se eleger tirando Lula (PT) da eleição de 2018.

THORCÍSIO

O bolsonarismo é, de fato, um fenômeno não totalmente compreendido. Só que às vezes, diante de algumas situações tão absurdas, fica difícil acreditar que há sanidade entre os radicais que seguem e veneram o ex-presidente de extrema direita. Parece ter sido o caso do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, na tarde de terça-feira (14). Durante o leilão do trecho norte do Rodoanel Mário Covas, na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, Tarcísio, tomado por um acesso de virilidade e fúria tão inexplicável quanto patético, tentou destruir a bancada do local onde era realizada a negociação.

BANANINHA

O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) voltou a entrar em embate com Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que durante sessão no plenário na quarta-feira (15) tentou associar o ministro da Justiça, Flávio Dino, ao tráfico de drogas, e voltou a criminalizar comunidades do Rio de Janeiro.

Bananinha também foi hostilizado na quinta-feira (16) em vídeo gravado pelo YouTuber Leonel de Esquerda, durante voo. Chamado de “Flávio Rachadinha”, o parlamentar foi questionado sobre as joias no valor de R$ 16,5 milhões, presente do governo da Arábia Saudita para o ex-presidente Jair Bolsonaro, seu pai.

FASCISTAS EM AÇÃO

O policial civil e deputado estadual pelo PT-RS, Leonel Radde, usou o Twitter para denunciar uma grave ameaça contra a integridade física e a vida da sua filha. Em mensagem enviada pelo WhatsApp, criminosos a ameaçaram de morte e de estupro, caso Radde não parasse de ‘atacá-los’.

MAIS FASCISTAS

A deputada federal bolsonarista Júlia Zanatta (PL-SC), alvo de ações no Supremo Tribunal Federal (STF) após fazer postagem em que incentiva a violência contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, participou de um debate ao vivo com o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) nesta segunda-feira (20) e tentou justificar sua atitude. Na última sexta-feira (17), a parlamentar publicou uma foto em que aparece segurando uma metralhadora e vestindo uma camiseta com a imagem de uma mão com quatro dedos, em referência a Lula, perfurada por três tiros.

FAZ ARMINHA QUE PASSA

A voz do cantor Zezé Di Camargo falhou em um agudo da música “Não diga a Deus”, um dos seus maiores sucessos, durante show no último final de semana. Atônito, o cantor de 60 anos disparou para a plateia: “Nunca vivi isso na minha vida.”

FANTASMAS VERMELHOS

Convertido em cachorro morto há mais de três décadas, o comunismo ainda é visto como leão feroz por quase metade dos brasileiros. Pesquisa Ipec revela que 44% dos patrícios convivem com o receio da implantação de um regime comunista no Brasil. Se essa informação serve para alguma coisa é para demonstrar que todos os que se preocupam com o futuro político de Bolsonaro estão assombrados com o fantasma errado. O problema já não é Bolsonaro, mas a infecção ideológica que o bolsonarismo importou para o Brasil.

MAIS FASCISTAS, AINDA…

O deputado federal bolsonarista Bibo Nunes (PL) gravou um vídeo em outubro do ano passado afirmando que os estudantes da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), cidade onde ocorreu o incêndio da boate Kiss, com mais de 100 vítimas fatais, deveriam ser “queimados vivos”. A razão da revolta do deputado foi a realização por parte dos estudantes de um protesto contra os cortes de verbas nas universidades e a favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Não bastasse isto, o inacreditável deputado atacou novamente. Ele foi ao Plenário da Câmara afirmar que homens denunciados por violência doméstica são “injustiçados”.

TROCO DADO

Um jovem postou em suas redes sociais um vídeo em que interrompe uma pregação evangélica ao cantor uma música sobre Exu em um trem da SuperVia no Rio de Janeiro. Cultos religiosos são proibidos nos vagões da empresa.

VERGONHA ALHEIA

O advogado e ex-vereador de Coxim (MS) Johnny Guerra Gai resolveu explicar “as desvantagens do feminismo”. Vergonha alheia pouca é bobagem…

FRASES DA SEMANA

“É muito radicalismo, né? Você tinha, há pouco tempo, juros de 2%; agora, 13,75%. (…) A demanda está enfraquecida. É preciso estimular a atividade econômica”. (Geraldo Alckmin, vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços)

“Estão dizendo que a operação tem a ver com a política. É o contrário. Mostramos qual a orientação do presidente Lula e dos ministérios. Fazer o bem sem olhar a quem.” (Flávio Dino, ministro da Justiça, sobre a operação da Polícia Federal que salvou a vida do senador Sérgio Moro)

“A mulher nasceu com uma peça a mais. Os homens são mais fracos porque têm essa peça a menos e nunca vão ter, nem com cirurgia nem querendo nem com ideologia. A mulher tem útero. [Homens] nunca terão”. (Magno Malta, senador do PL-ES, em discurso transfóbico)

“A taxa de juros do Brasil é chocante. Uma taxa de 13,7%, ou 8% real (quando descontada a inflação esperada) mata qualquer economia. É impressionante que o Brasil tenha sobrevivido a isso.” (Joseph Stiglitz, Prêmio Nobel de Economia e professor da Universidade de Columbia-EUA)

“Estou particularmente preocupado que esses modelos de inteligência artificial possam ser usados para desinformação em larga escala. Agora que estão melhorando na escrita de códigos de computador, eles podem ser usados  para ataques cibernéticos.” (Sam Altman, CEO da OpenAI)

“Se é verdade que a economia crescerá menos este ano segundo indicadores do governo, precisamos então aumentar os investimentos públicos e não represar nenhuma aplicação no social. Em momentos assim, a política fiscal tem de ser expansionista”. (Gleisi Hoffmann, presidente do PT)

“A Constituição assegura o exercício do direito de reunião e de manifestação, desde que de forma pacífica, não tendo essa regra sido observada por aqueles que realizaram as invasões e depredações do patrimônio público em 8/1/2023”. (Nunes Marques, ministro bolsonarista do STF)

“Pergunta o que ele me deu, o que deu à igreja, à Record. Deu nada. Ele me deve. Não a mim, mas a Deus. Deus nos usou quando ele (Lula) estava com câncer de garganta. Eu orei por ele e ele ficou curado. O Bolsonaro é a mesma coisa”. (Edir Macedo, dono da Igreja Universal)

“Eu quero saber o que ela é. Eu sei que é uma mulher. Eu não sei se pode ser chamada de mulher ou não”. (Marco Feliciano, PL-SP, deputado federal bolsonarista, sobre a cantora Margareth Menezes, nova ministra da Cultura)

“Uma vez nós tivemos um presidente que dizia: ‘Ah, eu não gosto de ser presidente, eu não deveria estar aqui’. Quero dizer para vocês: eu gosto de ser presidente e gosto de estar lá para provar que é possível a gente fazer as coisas que tem que fazer”. (Lula)

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Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


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