17/05/2024 - Edição 540

Brasil

Reforma Trabalhista e Bolsonaro reduzem sindicalizados ao menor patamar da história

Brasil registra mais de 244 mil empregos formais em março e desemprego cai para 7,9%, menor índice para o trimestre desde 2014

Publicado em 02/05/2024 9:58 - ICL Notícias, Leonardo Sakamoto (UOL), Sabrina Craide, Andreia Verdélio e Bruno de Freitas Moura (Agência Brasil) – Edição Semana On

Divulgação

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A Reforma Trabalhista de 2017 combinada com os quatro anos de governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) reduziram a quantidade de trabalhadores do país filiados a sindicatos ao menor número da história.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao final de 2022, pela primeira vez, o Brasil fechou o ano com menos de 10 milhões de sindicalizados — 9,1 milhões, exatamente — e também com menos de 10% de empregados associados a uma entidade de classe — 9,2%.

Em 2021, o número era de 10,6 milhões de filiados, o que correspondia a 11,2% da população ocupada. Já em 2012 — ou seja, dez anos antes —, o Brasil tinha 14,4 milhões de trabalhadores sindicalizados, os quais representavam 16,1% dos ocupados.

Esses dados foram levantados pelo IBGE durante a realização da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua. Foram divulgados em setembro do ano passado e, até o momento, são o retrato mais atual de um movimento que vem sendo monitorado há anos por lideranças sindicais e pesquisadores, mas que se intensificou devido a mudanças na legislação trabalhista e à crise econômica enfrentada na gestão bolsonarista.

“Chegamos ao fundo do poço”, admitiu Ricardo Patah, presidente da central União Geral dos Trabalhadores (UGT) e também do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, um dos maiores do país, em entrevista ao Brasil de Fato. “Enfrentamos uma convulsão da estrutura sindical, e o trabalhador acabou não vendo mais sentido a sua filiação.”

Reforma Trabalhista

Segundo Patah, a reforma trabalhista mexeu de forma brusca com a arrecadação dos sindicatos. Isso porque a nova legislação mudou a forma de cobrança do chamado imposto sindical, passando a exigir que somente trabalhadores que tivessem expressado formalmente o interesse em contribuir com as entidades tivessem o valor equivalente a um dia de trabalho por ano descontado de seus pagamentos — antes, o desconto era feito de todos que não se opusessem.

Desde então, entidades que representam trabalhadores perderam quase 99% do que recebiam referente à contribuição. Segundo o Ministério do Trabalho, em 2017, R$ 2,233 bilhões haviam sido repassados a entidades laborais, incluindo federações, confederações e centrais. Em 2021, os repasses baixaram para R$ 21,4 milhões.

“Ficamos sem recursos para prestar os serviços. A consulta médica, o dentista, o lazer”, lembrou Patah, justificando queda de filiados.

Bolsonaro

Aliada a essa crise, veio a crise econômica. Nos quatro de Bolsonaro, a economia brasileira cresceu 1,5% ao ano em média. Em 2020, ano da pandemia, o Produto Interno Bruto (PIB) chegou a encolher 3,3%, com consequente aumento do desemprego.

Nesse cenário, lembrou Patah, os sindicatos pouco podiam fazer para pressionar empresas por aumentos reais de salários dos trabalhadores. Perderam, inclusive, parte de sua base já que muitos empregados formais foram demitidos. Acabaram encolhendo.

“No Brasil, o sindicato só representa o trabalhador formal. A informalidade e a rotatividade são problemas para os sindicatos, e isso acelerou”, acrescentou Fausto Augusto Junior, diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).

Mais problemas

Segundo Augusto Junior, os sindicatos também sofrem hoje com a perda de identificação do trabalhador com sua categoria. “Há 30 anos, o metalúrgico perdia um trabalho da Ford, buscava outro trabalho como metalúrgico na Volks e, em último caso, tentava se recolocar numa autopeças.

Hoje, ele sai de uma montadora e tenta emprego na construção civil, arruma um trabalho no comércio. Não está mais ligado a uma profissão”, explicou.

Patah, da UGT, afirmou que a tecnologia também acabou gerando trabalho para muitos empregados formais que foram desligados ano após ano de suas empregadoras.

Citou, por exemplo, o caso dos aplicativos para motoristas e entregadores, para os quais 1,5 milhão de pessoas prestavam serviços ao final de 2022. Lembrou que eles não são sindicalizados, já que aos olhos da lei são trabalhadores informais.

Augusto Junior ressaltou ainda que, para os formais, atualmente, não há diferença prática para quem é ou não sindicalizado — o que não incentiva a filiação. Também por lei, ele diz que acordos sobre reajustes e outras melhorias fechados por sindicatos devem valer para toda categoria representada.

Assim, mesmo não estando filiado ou contribuindo com a entidade sindical, um trabalhador acaba sendo beneficiado pela sua representação.

“Hoje, ser sindicalizado é uma decisão política”, complementou o economista. “O sindicato garante o direito de todos, mas hoje não consegue uma contribuição de todos.”

Reforma sindical

Augusto Junior defende uma reforma sindical que garanta o direito dos sindicatos de garantir sua sustentabilidade. Por meio dessa reforma, as entidades poderiam prever nos acordos coletivos que todos os trabalhadores beneficiados em negociações contribuíssem com parte de ganhos para manutenção de sua representação.

Propostas como essa, aliás, foram debatidas num grupo de trabalho criado pelo governo no ano passado para debater formas de fortalecer a negociação coletiva entre patrões e empregados.

A expectativa era que desses debates saísse um projeto de lei que seria enviado ao Congresso Nacional, numa mini “contrarreforma trabalhista”. Esse projeto, porém, nunca foi formalmente apresentado ao público nem a parlamentares.

Patah disse que ainda espera do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ex-líder sindical, uma atitude em prol do fortalecimento dos sindicatos. Ressaltou que, independentemente dela, o “pior já passou” para as entidades sindicais. Elas, aos poucos, estão encontrando formas para se manter e continuar zelando pelos trabalhadores.

Patah lembrou que, também por conta da situação econômica, 77% dos acordos salariais fechados no ano passado obtiveram aumentos acima da inflação para os trabalhadores. Isso, disse ele, voltou a despertar confiança dos empregados em suas entidades sindicais. A procura por filiação mudou por conta disso. “Acho que, em dois anos, conseguiremos estar num patamar igual ao de antes da Reforma Trabalhista”, disse.

Procurado pelo Brasil de Fato para comentar a situação dos sindicatos no país, o Ministério do Trabalho não se pronunciou.

Brasil registra mais de 244 mil empregos formais em março

O Brasil fechou o mês de março com saldo positivo de 244.315 empregos com carteira assinada. No acumulado do ano (janeiro/2024 a março/2024), o saldo foi positivo em 719.033 empregos, o que representa um aumento de 34% em relação aos três primeiros meses do ano passado.

O balanço é do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) divulgado na terça-feira (30) pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Segundo o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, este foi o melhor resultado do Caged para o mês de março desde 2020. “Ou seja, é um momento importante, então eu creio que neste Primeiro de Maio nós temos motivos para fixar a luta da classe trabalhadora por melhores condições”, disse Marinho.

Números

O estoque de empregos formais no país, que é a quantidade total de vínculos celetistas ativos, chegou a 46.236.308 em março deste ano, o que representa alta de 0,53% em relação ao mês anterior.

O maior crescimento do emprego formal no mês passado ocorreu no setor de serviços, com a criação de 148.722 postos. No comércio, foram criados 37.493 postos; na indústria, 35.886, concentrados na indústria da transformação; e na construção 28.666. O único grande grupamento com saldo negativo foi a agropecuária, com 6.457 postos a menos, em razão das sazonalidades do setor.

O salário médio de admissão foi R$ 2.081,50. Comparado ao mês anterior, houve decréscimo real de R$ 5,25, uma variação negativa de 0,25%.

A maioria das vagas criadas no mês de março foram preenchidas por mulheres (124.483). Homens ocuparam 119.832 novos postos. A faixa etária com maior saldo foi a de 18 a 24 anos, com 138.901 postos.

Regiões

Todas as regiões do país tiveram saldo positivo na geração de emprego no mês passado, sendo que houve aumento de trabalho formal em 25 das 27 unidades da federação. Alagoas e Sergipe registraram mais desligamentos que admissões, com saldo negativo de 9.589 postos (-2,2%) e 1.875 postos (-0,6%), respectivamente.

Em termos relativos, os estados com maior variação na criação de empregos em relação ao estoque do mês anterior são Acre, com a abertura de 1.183 postos, aumento de 1,13%; Goiás, que criou 15.742 vagas (1,02%); e Piauí, com saldo positivo de 3.015 postos (0,86%).

Em termos absolutos, as unidades da federação com maior saldo no mês passado foram São Paulo, com 76.941 postos (0,6%); Minas Gerais, com 40.796 vagas criadas (0,9%); e Rio de Janeiro, com a geração de 22.466 postos (0,7%).

As estatísticas completas do Novo Caged estão disponíveis na página do Ministério do Trabalho e Emprego.

Desemprego cai para 7,9%, menor índice para o trimestre desde 2014

A taxa de desocupação no primeiro trimestre de 2024 ficou em 7,9%. O índice é o menor para o período desde 2014, quando alcançou 7,2%. Em relação ao trimestre encerrado em dezembro de 2023, o resultado representa uma elevação de 0,5 ponto percentual (7,4%).

Os dados fazem parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada nesta terça-feira (30), no Rio de Janeiro, pelo IBGE. A taxa média de desemprego em janeiro, fevereiro e março ficou abaixo dos 8,8% do primeiro trimestre de 2023.

Segundo o IBGE, o país tinha 8,6 milhões de pessoas desocupadas no primeiro trimestre, 542 mil a mais (+6,7%) que no fim do ano passado. Já em relação ao mesmo período de 2023, o saldo é de 808 mil pessoas a menos (-8,6%). O IBGE classifica como desocupadas as pessoas que estão procurando trabalho.

Já o número de ocupados no primeiro trimestre de 2024 ficou em 100,2 milhões de pessoas, uma queda de 782 mil (-0,8%) em relação ao último trimestre de 2023 e um acréscimo de 2,4 milhões (+2,4%) em relação aos três primeiros meses de 2023.

O levantamento do IBGE apura todas as formas de ocupação, seja emprego com ou sem carteira assinada, temporário e por conta própria, por exemplo.

Sazonalidade

Para a coordenadora da Pesquisa, Adriana Beringuy, o aumento da taxa de desocupação é um comportamento típico de início de ano.

“O primeiro trimestre de cada ano é caracterizado por perdas na ocupação. Parte vem de dispensa de trabalhadores temporários”, opina.

Entre os postos temporários, ela inclui trabalhadores do setor público. “Parte importante veio da administração pública, especificamente no segmento da educação. Na virada do ano esses trabalhadores são dispensados. À medida que se retorna o ano letivo, há tendência de retorno desse contingente”, observa.

A pesquisadora avalia que está mantida uma tendência de redução no desemprego no país. “O movimento sazonal desse trimestre não anula a tendência de redução da taxa de desocupação observada nos últimos dois anos”, acrescenta Adriana.

Carteira assinada

A pesquisa aponta que, mesmo com redução na ocupação no primeiro trimestre ante o fim de 2023, não houve mudança significativa no nível de emprego com carteira assinada, cerca de 38 milhões de pessoas. Esse quantitativo representa alta de 3,5% em relação ao mesmo período do ano passado.

Adriana detalha que, das 782 mil pessoas que ficaram desocupadas, a maior parte – mais de 500 mil – foi de trabalhadores informais. “A gente teve uma perda de ocupação como um todo, mas a população com carteira ficou constante”, resume.

A taxa de informalidade nos primeiros três meses de 2024 ficou em 38,9% da população ocupada (38,9 milhões de trabalhadores informais) contra 39,1 % no trimestre anterior.

Rendimento

Na média de janeiro, fevereiro e março deste ano, o rendimento médio do trabalhador alcançou R$ 3.123. O valor representa alta de 1,5% entre trimestres seguidos e 4% ante o primeiro trimestre de 2023.

Já a massa de rendimentos atingiu R$ 308,3 bilhões, um recorde na série histórica iniciada em 2012. Esse é o valor que os trabalhadores ocupados recebem para movimentar a economia. Apesar de recorde, o montante apresenta uma estabilidade em relação ao trimestre final de 2023.

“Embora tenha havido crescimento do rendimento do trabalhador, o contingente de ocupados caiu, é como se um efeito tivesse anulado o outro”, finaliza Adriana Beringuy.

IBGE despreza boa notícia do governo Lula ao comparar banana com laranja

Ao afirmar que o desemprego “subiu”, quando ele caiu comparado com trimestres semelhantes nos últimos dez anos, o IBGE perdeu uma chance de dar uma boa notícia ao governo Lula.

O primeiro trimestre sempre tem uma alta na desocupação em comparação ao último do ano, mais aquecido por causa das contratações temporárias do Natal e Ano-Novo. Ou seja, a comparação entre trimestres tem que ser feita com parcimônia.

O desemprego no trimestre encerrado em março deste ano foi de 7,9% segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) Contínua. A taxa é mais baixa que os 8,8% do mesmo período de 2023 e beeeeem mais baixa que os 11,1% daquele em 2022.

A taxa de desocupacão do trimestre é, aliás, a menor para esse período do ano desde 2014, ou seja, nos últimos dez anos, quando ela marcou 7,2%.

Entre outubro e dezembro de 2023, contudo, ela foi de 7,4%. E o próprio instituto afirma que “o movimento sazonal desse trimestre não anula a tendência de redução da taxa de desocupação observada nos últimos dois anos”.

Mas o próprio IBGE ignorou isso ao usar como título de seu release à imprensa “Taxa de desocupação sobe para 7,9% e população ocupada tem redução de 0,8%“. O “sobe” acabou sendo largamente adotado por textos que tratam do tema. Em outro texto, o instituto colocou apenas “PNAD Contínua: taxa de desocupação é de 7,9% e taxa de subutilização é de 17,9% no trimestre encerrado em março”, mas não causou a repercussão do primeiro entre os veículos de comunicação.

Olhando para os dados crus e ignorando a sazonalidade, o título não está incorreto. Mas é comparar laranja com banana. O que não condiz com um instituto de excelência como o IBGE.


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