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Publicado em 08/02/2019 12:00 -
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O Grupo de Contato Internacional (GCI) para a Venezuela, que se reuniu na última quinta-feira (7) em Montevidéu, decidiu enviar uma missão técnica ao país para dialogar com ambas as partes.
O grupo deixou claro que o fim da crise deve ser uma "solução venezuelana", em linha com a posição inicial da chefe da diplomacia europeia, a italiana Federica Mogherini, que defendeu evitar uma intervenção no país.
O chanceler do Uruguai, Rodolfo Nin Novoa, disse que "a solução tem que ser venezuelana, porque a outra alternativa é o caos, é a confrontação e com toda certeza pode ser o conflito armado".
O grupo também apelou à realização de eleições presidenciais livres, segundo a declaração divulgada no final do encontro, assinada por todos os países participantes, com exceção da Bolívia e do México, que não faz parte do grupo de contato, mas participou da reunião.
"O grupo apela à criação de uma abordagem internacional comum para apoiar uma resolução pacífica, política, democrática e integralmente venezuelana da crise, excluindo o uso da força, através de eleições presidenciais livres, transparentes e credíveis, de acordo com o Constituição venezuelana", lê-se na declaração final.
Mogherini também destacou que a União Europeia (UE) já mobilizou ajuda para a Venezuela no valor de 60 milhões de euros, aos quais se somarão outros 5 milhões. Ela disse que a ajuda humanitária à Venezuela deve ser canalizada de forma imparcial e não deve ser politizada e que a UE está disposta a abrir em Caracas um escritório para gerenciar a assistência humanitária.
Participaram desta primeira reunião do GCI a UE, que esteve representada por Mogherini e por oito Estados-membros: Portugal, Espanha, Itália, França, Alemanha, Reino Unido, Holanda e Suécia. Do lado da América Latina, estiveram presentes a Bolívia, Costa Rica, Equador, México e Uruguai.
Novoa disse que a participação no grupo está aberta a outros países e destacou a "confluência" com o chamado Mecanismo de Montevidéu, uma iniciativa proposta por México e Uruguai e que consta de quatro etapas, centradas no diálogo imediato, na negociação, compromissos e implementação.
Sobre o Mecanismo de Montevidéu, Mogherini afirmou que, apesar de não ser incompatível, tem objetivos diferentes aos do Grupo Internacional de Contato.
Dos membros do grupo, três (Bolívia, Itália e Uruguai) não reconheceram o presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, como presidente encarregado da Venezuela.
O Brasil, que não participa do Grupo Internacional de Contato sobre a Venezuela, afirmou que a iniciativa "não é útil" e só servirá para prolongar por mais tempo no poder o presidente Nicolás Maduro.
Em Washington, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou que esse grupo parte de uma premissa equivocada por considerar que Maduro tem a mesma legitimidade que Guaidó, que se autoproclamou presidente em exercício da Venezuela em 23 de janeiro. Desde então, a tensão aumentou no país.
"Se parte da premissa de igualdade entre o governo legítimo de Guaidó e a ditadura de Maduro. Como mostrou o passado, essa iniciativa não prosperará, só prolongará a ditadura de Maduro e criará dúvidas sobre a transição", declarou Araújo. "Servirá para atrasar o processo e, por isso, não acreditamos que seja uma ajuda válida", acrescentou.
O Brasil é um dos países que integra o Grupo de Lima, composto por uma dúzia de países do continente americano que considera rompida a ordem constitucional na Venezuela. O Grupo de Lima se reuniu na segunda-feira em Ottawa (Canadá) e decidiu não considerar a opção militar para forçar a saída de Maduro.
Araújo, de visita esta semana em Washington, conversou sobre a Venezuela com membros do governo dos EUA, que não descarta a opção militar para o país sul-americano. Perguntado se abordou com as autoridades americanas a possibilidade da entrada de soldados na Venezuela, Araújo respondeu: "Não tivemos nenhuma conversa sobre nenhum tipo de opção militar, acreditamos que a democracia pode progredir e seguir adiante".
Países europeus reconhecem Guaidó
Reino Unido, França, Alemanha, Espanha, Holanda, Portugal, Suécia, Áustria, Dinamarca, Letônia, Lituânia, Finlândia e República Tcheca reconheceram Guaidó, no último dia 4, como presidente interino da Venezuela.
Maduro respondeu à decisão dizendo que seu governo vai revisar as relações bilaterais com os países membros da União Europeia que reconheceram Guaidó.
No último dia 31 o Parlamento Europeu se juntou aos que referendam a condição de líder de Guaidó e urgiu a União Europeia a fazer o mesmo, mas há divisões claras no bloco.
Hungria e Grécia, por exemplo, não querem desautorizar o ditador, e a coalizão governista da Itália não consegue chegar a uma posição comum diante de seus desmandos –a ala mais direitista tem ojeriza pelo socialista, a mais "antissistema" pede paciência com ele.
Maduro foi reeleito em maio de 2018 para um novo mandato de seis anos, em um pleito quase que totalmente boicotado pela oposição e considerado fraudulento por observadores internacionais.
Por isso, a Assembleia Nacional não reconheceu o novo mandato de Maduro e considerou que à Presidência estava vaga. Assim, indicou Guaidó para ocupar interinamente o cargo até que novas eleições livres sejam realizadas.
A Venezuela vive uma crise socioeconômica sem precedentes em sua história, com hiperinflação, emigração em massa, desnutrição e colapso do sistema de saúde e de outros serviços públicos.
Maduro ainda se aferra ao poder, com o suporte de Rússia, China e Turquia. Nesta segunda, seu governo expressou “sua mais enérgica rejeição à decisão adotada por alguns governos europeus, na qual eles oficialmente se submetem à estratégia da administração dos EUA de derrubar o governo legítimo do presidente Nicolás Maduro”, afirmou em um comunicado.
Moscou também reiterou seu alinhamento com o ditador. Em nota, o governo russo diz que a movimentação europeia para legitimar a “tentativa ilegal” de tomada de poder por Guaidó constitui intromissão externa indevida.
Apesar do aumento da pressão internacional, o dirigente venezuelano mantém o tom desafiador e triunfante. Tem dito que a Europa age como fantoche de Washington. Em entrevista a uma rede de TV espanhola exibida neste domingo (3), mirou dos dois lados do Atlântico.
“Pare agora, Trump! Você está cometendo erros que deixarão suas mãos cobertas de sangue, e você mesmo deixará a Presidência manchado de sangue”, afirmou Maduro. “Por que repetir o Vietnã?”
Sobraram ainda alfinetadas para os europeus. “Não nos importamos com o que a Europa diz. Não aceitamos ultimatos de quem quer que seja. Não se pode basear a política externa em ultimatos. Isso é coisa de império, dos tempos coloniais.”
Maduro chegou a pedir ajuda ao papa Francisco, segundo entrevista gravada em Caracas divulgada nesta segunda-feira.
"Enviei uma carta ao papa Francisco", afirmou Maduro. "Disse a ele que estou a serviço da causa de Cristo (…) e nesse espírito peço sua ajuda, em um processo de facilitação e reforço do diálogo."
Depois das sucessivas declarações de apoio a Guaidó, Caracas anunciou que "revisará integralmente as relações bilaterais com esses governos a partir deste momento, até que haja uma retificação que descarte seu apoio aos planos golpistas", segundo comunicado do Ministério das Relações Exteriores.
Os pronunciamentos europeus ocorrem dias após outra importante vitória para Guaidó: o primeiro reconhecimento oriundo de um general venezuelano.
No último dia 2, Francisco Estéban Yánez Rodríguez afirmou desconhecer o mandato de Nicolás Maduro. Rodríguez é general-de-divisão e diretor de Planificação Estratégica do Alto Comando da Aviação (equivalente à Força Aérea).
O premiê canadense Justin Trudeau, um dos primeiros líderes a anunciar apoio ao opositor, anunciou um pacote de 53 milhões de dólares canadenses (R$ 148 milhões) em ajuda humanitária para a Venezuela.
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