18/05/2024 - Edição 540

Especial

MORALISMO E HIPOCRISIA

Prisão de usuários de drogas condena jovens, negros e pobres a serem bucha de canhão das facções

Publicado em 25/08/2023 11:40 - André Richter (Agência Brasil), Josias de Souza e Leonardo Sakamoto (UOL), Yurick Luz (DCM), Carta Capital, Felipe Gutierrez (G1) – Edição Semana On

Divulgação Victor Barone - Midjourney

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O Supremo Tribunal Federal (STF) contabilizou na quinta-feira (24) cinco votos pela descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal.

Apesar dos votos proferidos, um pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) feito pelo ministro André Mendonça suspendeu o julgamento, Não há data para retomada.

O placar do julgamento é de 5 votos a 1 para a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. O plenário é formado por 11 ministros.

Conforme os votos proferidos até o momento, há maioria de seis votos para fixar uma quantidade da maconha para caracterizar uso pessoal, e não tráfico de drogas, deve ficar entre 25 e 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis. A quantidade será definida quando o julgamento for finalizado.

Os cinco votos pela descriminalização foram proferidos pelos ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e a presidente, Rosa Weber

O ministro Cristiano Zanin votou contra a descriminalização, mas defendeu a fixação de uma quantidade máxima de maconha para separar criminalmente usuários e traficantes.

Votos

Os votos de Rosa Weber e Cristiano Zanin foram os destaques da sessão de ontem.

A ministra decidiu adiantar o voto sobre a questão após Mendonça pedir a suspensão do julgamento. Em setembro, Rosa vai se aposentar ao completar 75 anos e não deve participar da retomada do julgamento.

A presidente disse que a manutenção da criminalização do porte é desproporcional e atinge a vida privada dos usuários. Além disso, a ministra citou que a criminalização provoca o encarceramento de pessoas vulneráveis. Os argumentos também foram citados pelos demais ministros.

“As nossas prisões estão cheias de meninos e meninas, geralmente negros, pardos e, na imensa maioria, está lá em função do tráfico”, afirmou.

A presidente também ressaltou que a decisão da Corte não está estimulando o consumo de drogas.

“Penso que o STF pode ajudar nessa solução, sem prejuízo na atuação do Congresso. Quem despenalizou para o usuário foi o Congresso, em 2006. Se mantém apenas a criminalização. O Supremo daria um passo no sentindo de descriminalizar quando se trata de uso próprio”, completou.

O único voto divergente foi proferido pelo ministro Cristiano Zanin. Apesar de reconhecer que o atual sistema penal é falho e não aplica a despenalização para pessoas pobres, negras e de baixa escolarização, Zanin disse que a descriminalização apresenta “problemas jurídicos” e pode agravar o combate às drogas.

Contudo, o ministro votou para fixar a quantidade de 25 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas de cannabis para configurar a situação de uso pessoal em apreensões policiais.

Entenda

O Supremo julga a constitucionalidade do Artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 11.343/2006). Para diferenciar usuários e traficantes, a norma prevê penas alternativas de prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e comparecimento obrigatório a curso educativo para quem adquirir, transportar ou portar drogas para consumo pessoal.

A lei deixou de prever a pena de prisão, mas manteve a criminalização. Dessa forma, usuários de drogas ainda são alvos de inquérito policial e processos judiciais que buscam o cumprimento das penas alternativas.

No caso concreto que motivou o julgamento, a defesa de um condenado pede que o porte de maconha para uso próprio deixe de ser considerado crime.  O acusado foi detido com três gramas de maconha.

No início do mês, o ministro Alexandre de Moraes criticou a atual política contra drogas do país e diz que ela gera um “ciclo vicioso” para jovens pretos de periferia. O magistrado diz que o entendimento das instituições sobre o tema acabam prejudicando “o jovem preto, pardo e sem instrução”.

“A partir do momento em que foram presos por tráfico de entorpecentes, eles acabam sendo cooptados pelas organizações criminosas. Quando saem, têm que pagar o que estão devendo. Aí voltam [para a prisão] por furto, voltam por roubo”, afirmou o ministro.

“É um ciclo vicioso que nós acabamos criando, nós enquanto instituições, por essa interpretação da lei que quis compensar a despenalização do usuário puxando um naco do ‘usuário’ para ‘traficante’. Qual naco? O jovem preto, pardo, sem instrução. Foi isso que nós fizemos, triplicando em seis anos o número de presos por tráfico de drogas”, prosseguiu.

Moraes ainda ironizou que o número não cresceu por meio da detenção de pessoas brancas. “Não triplicamos o número de presos por tráfico de drogas de brancos, maiores de 30 anos, com curso superior. Triplicamos com pretos e pardos, sem instrução e jovens”, finalizou.

Em tabelinha inusitada, Zanin levanta bola e Mendonça corta

Zanin abortou o que seria o principal destaque dos portais de internet e dos telejornais na noite de quinta-feira, a manchete de capa dos jornais desta sexta. Zanin pronunciou o voto mais conservador até aqui no julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Já votaram a favor Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber. Num plenário de 11 ministros, o voto de Zanin consolidaria a maioria de meia dúzia. Mas o indicado de Lula para o Supremo Tribunal Federal votou contra, expondo um viés bolsonarista nos costumes.

Zanin como que levantou a bola para André Mendonça cortar. O ministro terrivelmente evangélico pediu vista do processo, adiando por pelo menos 90 dias uma decisão que o Supremo retarda há oito anos. Não está em discussão o comércio de drogas no Brasil. A venda continuará ilegal seja qual for a deliberação. A legislação atual já diferencia traficante de usuário. Embora ambos sejam considerados criminosos, o usuário não deveria ser preso. Mas a cadeia está abarrotada deles.

O artigo 28 da Lei de Drogas prevê que portadores de entorpecentes para consumo próprio devem ser punidos com “advertência sobre os efeitos das drogas” e “prestação de serviços à comunidade”. Admite-se também a imposição de “comparecimento a programa ou curso educativo”. O diabo é a que a lei não define a quantidade que faz de um portador de drogas usuário. A encrenca chegou ao Supremo porque a Defensoria Pública de São Paulo apresentou o caso de um réu preso por ter sido flagrado com três gramas de maconha. Daí o questionamento à constitucionalidade da lei.

Ironicamente, a Lei de Drogas foi sancionada por Lula em 2006. O texto trazia duas novidades alvissareiras: o fim da pena de prisão para usuários de drogas e o aumento da pena para traficantes. Imaginou-se que as cadeias seriam esvaziadas. Deu-se o oposto. Um ano antes da nova lei, havia 297 mil presos no Brasil. Hoje, há mais de 770 mil.

Descriminalizar não é sinônimo de liberar o consumo. Significa apenas que usuário não vai em cana. O Supremo empurra a decisão com a barriga desde 2015. Em 2019, outro ministro indicado por Lula, Dias Toffoli, chegou a pautar o julgamento. Mas devolveu a ação à gaveta dois dias depois de se encontrar com Bolsonaro. Hoje, como ontem, Lula silencia.

Maioria de presos por tráfico de drogas é negra, pobre e sem relação com facções

Dados da pesquisa “Perfil do processado e produção de provas nas ações criminais por tráfico de drogas”, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mostram que maioria dos processados por tráficos de drogas no país é de homens (87%) jovens (72%) negros (67%).

O levantamento ainda aponta uma incidência maior da repressão às drogas sobre quem tem baixa escolaridade (75%), com ensino fundamental incompleto, é desempregado ou autônomo (66%) e tem passagem anterior pelo sistema de Justiça (50%).

A pesquisa analisou 41.100 processos dos tribunais de justiça estaduais com decisão no primeiro semestre de 2019. Os dados preliminares foram apresentados em junho deste ano, durante encontro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública em Belém, no Pará.

Apenas 20% dos processos analisados no estudo começam a partir da atuação de órgãos especializados em investigação, como a Polícia Civil. Os 80% restantes são feitos por órgãos que não são responsáveis por investigações.

Em quase um quinto dos casos (17%), não há apreensão de qualquer tipo de substância com os réus. Vale destacar que a mediana de substâncias apreendidas é de 85g de maconha e 24g de cocaína. Em 80% das ocorrências, o réu permanece em prisão preventiva durante o processo.

O estudo ainda mostra que 93% dos processos têm apenas a menção a denúncias anônimas, enquanto 7% têm algum registro do autor da denúncia, como telefone, ou o conteúdo do relato. As informações foram obtidas pelo jornal Folha de S.Paulo.

Descriminalizar drogas é remédio contra chacinas policiais em SP, RJ e BA

A falida guerra às drogas produz, anualmente, montanhas de mortos pelo tráfico e chacinas policiais em série – como as desta semana em São Paulo, na Bahia e no Rio – sem conseguir reduzir o consumo de psicoativos.

A questão está bem mais avançada em outros lugares. No “subversivo” Estados Unidos, por exemplo, a erva é legal na capital Washington, em Nova York ou na Califórnia. Em países “atrasados”, como Alemanha, Espanha e Portugal, o uso pessoal de cocaína não é crime. Em nosso vizinho Uruguai, maconha pode ser comprada livremente por moradores. Em países como a Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, México e Peru, o usuário não é criminalizado.

Aqui estamos discutindo que o uso pessoal de maconha não seja crime.

As maiores batalhas do tráfico sempre acontecem longe dos olhos das classes média e alta, uma vez que a imensa maioria dos corpos contabilizados é de jovens, negros, pobres, que se matam na conquista de territórios para venda de drogas, pelas leis do tráfico e pelas mãos da polícia e das milícias. Os mais ricos sentem a violência, mas o que chega neles não é nem de perto o que os mais pobres são obrigados a viver no dia a dia.

Considerando que policiais, comunidade e traficantes são, não raro, de uma mesma origem social e, não raro, da mesma cor de pele, é uma batalha interna. E muita gente torce não para resolver o problema em definitivo, mas para que os conflitos voltem a ser contidos naquele território, gerando falsa sensação de segurança na parte “civilizada” da cidade.

A forma como o tráfico se organizou e a política adotada pelo poder público para combatê-lo estão entre as principais razões desse conflito armado organizado. Sim, o combate ao tráfico gera mais mortos que o consumo de drogas – até porque a droga que, estatisticamente, mais mata e provoca mortes se chama álcool. Você pode comprá-la no supermercado ou ver sua propaganda na TV. Mas ela não é proibida, apenas regulada. Tal como o tabaco.

Em seu voto, Moraes foi didático quanto ao fracasso dessa guerra

“Nixon [ex-presidente dos Estados Unidos], num discurso famoso, disse que o uso abusivo de drogas seria o inimigo público número 1 dos EUA e lançou a guerra às drogas. Todos sabemos, independentemente de posicionamento, que de 1971 para cá, se fosse feito um ranking de quem ganhou a guerra as drogas certamente não foram as autoridades públicas”, avaliou em seu voto o ministro Alexandre de Moraes.

“Infelizmente, os narcotraficantes conseguiram um poderio muito grande. Bilhões que o narcotráfico arrecada, unindo-se ao tráfico de armas. E a criminalidade violenta acabou aumentando muito.”

Toda a expansão de mercado é conflituosa. Em uma sociedade que funciona dentro das normas legais, apela-se à Justiça para decidir quem tem razão em uma disputa. Mas quando se vive em um sistema ilegal, condenado pela própria Justiça, a solução é ter o maior poder bélico possível para fazer valer o seu ponto de vista sobre os demais, sobre a polícia, sobre os moradores de determinada comunidade.

Policiais honestos também são vítimas dessa situação, em detrimento aos que não seguem as regras e os que criam milícias. Muitas dessas mortes não são de agentes de segurança em serviço. Eles morrem porque são descobertos com armas ou identidade policial em assaltos no bairro pobre onde moram. Como a maioria da população.

Em uma semana, contamos 16 cadáveres de uma chacina policial com cara de vingança após a morte do soldado Patrick Bastos Reis no Guarujá (SP). Mas também 19 mortes na Bahia em três operações policiais em Salvador (4 óbitos), Camaçari (7) e Itatim (8) – o Estado foi, no ano passado, o campeão brasileiro de letalidade policial.

E na Vila Cruzeiro, no Complexo da Penha, no Rio, outros dez foram mortos. O local já havia sido, em maio do ano passado, palco de outra chacina policial, com 23 mortos.

Não há saída para a violência armada organizada que não passe pela discussão da interrupção da atual política, o que passa pela descriminalização e legalização de psicoativos, estrangulando os recursos que chegam às mãos das organizações criminosas.

Outros países têm avançado nesse sentido como uma das soluções para reduzir a disputa armada por territórios. Sabem que a “guerra às drogas” falhou, servindo apenas para controle político e para fortalecer grupos de poder locais e o tráfico de armas. Por aqui, infelizmente, o STF ainda tem que debater que 3 gramas de maconha não fazem de alguém um traficante perigoso.

Guerra às drogas matam mais do que as drogas em si

Em seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2017, o então presidente da Colômbia Juan Manuel Santos criticou a “guerra às drogas” e defendeu que eram necessários outros enfoques e novas estratégias. “É preciso entender o consumo de drogas como um assunto de saúde pública e não de política criminal”, disse.

Foi uma resposta ao ex-presidente norte-americano Donald Trump, que demandou que a Colômbia aumentasse o combate à produção e ao comércio de cocaína. Santos lembrou que, enquanto houver consumo, haverá oferta e pediu aos outros chefes de Estado que conhecessem as experiências de regulação da produção, comércio e uso de drogas que estão sendo implementadas ao redor do mundo.

“A guerra contra o narcotráfico ceifou muitas vidas, e, na Colômbia, estamos pagando um preço muito alto, talvez o mais alto entre as nações, e o que estamos vendo é que o remédio está sendo pior que a doença”, afirmou o presidente colombiano, um dos responsáveis pelo acordo de paz que pôs fim à guerra contra as Farc.

Isso cai como uma luva para São Paulo, para a Bahia, para o Rio de Janeiro de hoje: o remédio está sendo pior que a doença.

No intuito de combater o tráfico, estamos matando milhares de pessoas todos os anos – a maioria, moradoras de áreas pobres, policiais ou traficantes. Negros e pobres. Ou seja, gente considerada dispensável.

E, ao mesmo tempo, vamos mantendo a indústria do medo em curso e promovendo o controle de determinadas classes sociais através da justificativa de conter a violência que grassa em seu território. As mutações teratogênicas de policiais, as milícias, aprenderam com o tráfico que o controle desses locais dá muito dinheiro.

Tudo isso é muito mais danoso à sociedade do que a liberação controlada e regulamentada de drogas.

Há, neste momento, debates sendo realizados nas comunidades sobre as soluções para a violência na disputa de territórios controlados pelo crime organizado. Os governos estaduais precisam participar disso, e não apenas chegar distribuir balas perdidas que matam crianças a caminho da escola.

Assumir um planejamento legal e de saúde pública para a legalização e a regulamentação das drogas, desidratando o tráfico de drogas e o tráfico de armas através do fim de seu mercado ilegal.

Por fim, se o Estado brasileiro quiser resolver a bomba-relógio do sistema carcerário legalizaria paulatinamente as drogas, começando pela maconha. Isso quebraria as pernas do tráfico, reduzindo o número de jovens que hoje são enviados aos presídios para aprender a roubar e matar e desidratando o poder econômico das facções criminosas.

Acreditamos que desconectando os presídios do restante do tecido social, tornando-os uma espécie de limbo para onde vai quem atentou contra a sociedade, tudo será resolvido. O aprendizado de presos durante sua estada no inferno, por tudo o que viram e viveram, será levado para fora. E quem sofre as consequências dessa política burra somos todos nós.

Entenda as regras sobre consumo nos países onde houve mudança de lei

Nos últimos anos, diversos países alteraram as leis sobre maconha, e algumas dessas nações descriminalizaram não só a posse e o consumo, mas também a produção, a distribuição e a comercialização da droga.

Cada país tem seu próprio modelo regulatório em relação às drogas, e isso pode envolver a Justiça ou o Legislativo na tomada de decisões, afirma Cristiano Maronna, diretor do Justa, uma organização que analisa dados do financiamento e da gestão do Sistema de Justiça.

Como são as regras em alguns dos países que descriminalizaram

Portugal

Em Portugal, a posse drogas não é crime, mas, sim, um ato ilícito (o tráfico de drogas ainda é considerado um crime).

O país tem um critério para distinguir: a posse de até 25 gramas de cannabis é considerada posse para consumo, assim como o cultivo de até seis plantas fêmeas.

Argentina

Na Argentina houve uma decisão da Justiça que determinou que a posse de drogas para o uso pessoal não é um crime, mas não há uma regra que define como distinguir os produtores, os distribuidores e os comerciantes dos consumidores.

Uruguai

No Uruguai toda a cadeia da maconha é legalizada: produção, distribuição, comercialização e posse de maconha para uso pessoal são permitidas e reguladas.

Não é uma liberação geral, no entanto. No Uruguai, por exemplo, é preciso ter licença para cada uma dessas atividades. O consumidor precisa ser cadastrado e pode comprar maconha em farmácias ou pertencer a uma espécie de clube de consumidores ou plantar (há limites para quantas plantas as pessoas podem ter).

Espanha

Na Espanha também existem esses clubes. Os membros dessas organizações pagam uma taxa mensal para consumir cannabis. Os clubes existem formalmente, são registrados como pessoas jurídicas, inscritas como associações. Cada província espanhola estabelece algumas regras para esses clubes.

Holanda

Na Holanda, em teoria, o uso e o tráfico de maconha ainda são crimes, mas na prática isso não é penalizado.

Estados Unidos

Nos EUA, as regras variam de acordo com o estado.

Como aconteceram as mudanças

Grosso modo, as mudanças nas regras podem acontecer das seguintes formas:

– Leis aprovadas pelo Legislativo do país, como no Uruguai.

– Decisões da Justiça, como na Argentina.

– Por decisões do Executivo ou do Legislativo para simplesmente parar de gastar recursos com a repressão ao consumo de maconha, como na Holanda

– Referendos sobre a maconha em que a população decidiu legalizar a droga, como em estados dos EUA.

Leis aprovadas pelo Legislativo do país

Em alguns países, como no Uruguai, a mudança ocorreu através de um projeto de lei proposto pelo governo e aprovado pelo congresso. No Canadá, ocorreu algo similar, afirma Maronna.

O Uruguai foi o primeiro país a legalizar o consumo de maconha. Lá, no entanto, há regras sobre como se pode adquirir maconha –é principalmente em farmácias, mas também é possível fazer parte de clubes de maconha ou plantar em casa.

A legalização da maconha aconteceu durante o governo de Pepe Mujica, de esquerda, mas depois dele, foram eleitos dois presidentes que mantiveram a legalização.

Em países como Portugal, foi aprovada uma lei que considera a posse de drogas como uma infração administrativa, estabelecendo critérios objetivos para cada substância. No caso da maconha, por exemplo, a posse de até 25 gramas é considerada para uso pessoal e o indivíduo é encaminhado a um órgão administrativo, onde os casos mais simples são resolvidos de forma rápida. Já os casos mais graves são tratados como questões de saúde e são encaminhados para tratamento.

Decisões da Justiça

Na Argentina e na Colômbia, as cortes constitucionais (órgãos semelhantes ao STF no Brasil) analisaram a criminalização da posse de drogas para uso pessoal e concluíram que a proibição é inconstitucional, afirmando que o Estado não tem legitimidade para criminalizar a posse de drogas para uso pessoal, diz Maronna.

No entanto essas decisões podem ser revistas ou revertidas pelo Legislativo.

Mudanças decididas por referendos

A maioria dos estados dos Estados Unidos mudou a legislação sobre maconha depois de referendos sobre o tema. Nos EUA, os estados têm muita autonomia para determinar suas próprias leis, e as alterações nas leis sobre a droga não mudaram da mesma forma (Minnesota foi o 23º e último estado a legalizar a maconha, mas essa foi uma decisão do Legislativo estadual, e não em um referendo).

Priorizar outros gastos

Na Holanda, o Congresso define as prioridades no combate ao crime, afirma Cristiano Maronna, diretor do Justa.

“Eles decidem focar em questões como lavagem de dinheiro, crimes violentos e corrupção, e consideram o uso de drogas como menos importante. Eles reconhecem que têm recursos limitados e que a polícia não pode reprimir todos os crimes, sendo necessário fazer escolhas. Optam por combater crimes mais graves em vez daqueles que consideram menos sérios. A polícia é orientada a não priorizar a repressão ao uso de drogas, pois acreditam que isso seria ineficaz e desperdiçaria recursos valiosos”, diz ele.

Portanto, há uma política de tolerância aos “coffeeshops” (locais onde o consumo é liberado) pois as autoridades preferem direcionar seus recursos para crimes mais graves.

Referendos sobre maconha

Nos EUA existe um sistema de regras fragmentado e complexo em relação à cannabis. São 23 estados onde a maconha é legalizada. O mais recente deles foi Minnesota, que mudou as leis sobre a droga nesta semana. Na maioria dos estados, a mudança foi decorrente de referendos, mas isso não aconteceu em todos os locais (em Minnesota, foi uma alteração do Poder Legislativo local).

O país possui as leis federais, que são aplicadas por agências federais. Os EUA criminalizam diversas ações relacionados à maconha, como tráfico, comércio, importação e exportação, principalmente quando envolvem o atravessamento de fronteiras estaduais ou internacionais, diz Paul Armentano, vice-diretor da fundação Norml, uma organização para alterar as leis sobre maconha nos EUA.

Mais de dez anos se passaram desde que o estado do Colorado, o primeiro a legalizar a cannabis, alterou as leis estaduais. Armentano afirma que hoje há um consenso nos locais onde houve legalização que isso é preferível à criminalização. “A discussão não está mais centrada em se a maconha é boa ou ruim, ou se as pessoas vão usá-la. A razão para a legalização é que, ao longo de cerca de 100 anos, os estados e o governo federal tentaram desencorajar o uso de cannabis por meio da criminalização, prisões e processos legais, na esperança de reduzir a oferta e a demanda. No entanto, essa abordagem não funcionou”, diz ele.


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