20/05/2024 - Edição 540

Ágora Digital

O broxa

O jornalista Victor Barone resume a semana política

Publicado em 09/09/2022 11:21 - Victor Barone

Divulgação

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

Em seu discurso após o desfile de 7 de Setembro, o presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) fez um discurso no qual repetiu clichês apelando à masculinidade e a um padrão estereotipado do papel da mulher e do conceito de “família”, acenando em especial para a base do seu eleitorado.

Após falar que a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, “muitas vezes está é na minha frente” e não ao seu lado, recomendou aos homens solteiros que se casassem. “E eu tenho falado para os homens solteiros, para os solteiros que estão cansados de ser infelizes. Procure uma mulher, uma princesa, se casem com ela, para serem mais felizes ainda.” Em seguida, beijou a primeira-dama, para puxar o coro de “imbrochável, imbrochável, imbrochável” junto com parte da plateia.

“Imbrochável é um significante fundamental do Bolsonaro desde sua campanha e ele se refere a esse apelo pela masculinidade que compõe boa parte dos apoiadores e cria um conjunto de identificações com aquelas pessoas que sentem que a sua masculinidade tradicional heteronormativa está ameaçada com as transformações recentes. Com as mudanças que a gente tem no Brasil, muitas pessoas sentem que perderam o lugar e que as coisas estão ‘desorganizadas’, que estão subvertendo hierarquias tradicionais”, avalia o psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), Christian Dunker.

O adjetivo já usado por Bolsonaro em outras ocasiões, portanto, não é colocado à toa em suas falas. “A ideia do imbrochável é aquela que suscita a intromissão no discurso público de um aspecto da vida privada, que é aquele que está permanentemente ereto, que nunca fraqueja, que está oferecendo assim, tal como uma arma cheia de balas, sempre prontas para serem empregadas, a sua masculinidade como forma de garantir proteção para aqueles que estão se sentindo inseguros”, explica Dunker.

“Então, em uma retórica mais ou menos conhecida, você primeiro incita um tema, um lado da fantasia, e para isso usa o discurso libidinal, libidinoso, e em seguida oferece a proteção, a identificação com o líder. Oferece assim o pai protetor”, aponta. “Essa é uma síntese do bolsonarismo, a masculinidade frágil, um apelo a uma segurança genérica, a criação de inimigos que são vistos como fracos, como os brocháveis, não suficientemente violentos. Os brocháveis são os outros.”

A fala de Bolsonaro, completamente fora de qualquer script convencional, gerou reações de políticos, jornalistas e comentaristas nas redes sociais. As candidatas à Presidência Simone Tebet e Soraya Thronicke repudiaram as declarações do presidente.

Por Glauco Faria

O HORROR

ESTORVO

Daqui a 200 anos, quando a posteridade puder falar sobre o 7 de Setembro de 2022 sem ser xingada nas redes sociais, dirá que a estrela do Bicentenário da Independência do Brasil foi dom Bolsonaro, não dom Pedro I. Candidato à reeleição, o presidente promoveu um cancelamento da data histórica. Substituiu a celebração cívica por megacomícios. Aproveitando-se da estrutura estatal, promoveu os mais vistosos atos de sua campanha. Os ritos oficiais tornaram-se puxadinhos dos palanques. As Forças Armadas viraram adornos de uma subversão institucional.

Do ponto de vista formal, Bolsonaro pareceu isolado. Os presidentes de outros Poderes preferiram não comparecer à celebração cívico-eleitoral. Faltaram à cerimônia de Brasília Luiz Fux e Rodrigo Pacheco, presidentes do Supremo e do Congresso. Algo inédito no Brasil pós-redemocratização. Nem mesmo o réu Arthur Lira, presidente bolsonarista da Câmara, se animou a comparecer. Sob o ângulo estritamente eleitoral, Bolsonaro produziu uma notável exibição de força. Atraiu multidões para ouvi-lo em Brasília e no Rio de Janeiro. Mesmo ausente, encheu também a Avenida Paulista.

Os operadores do comitê de Bolsonaro estão em festa. Avaliam que o presidente moderou o seu discurso em relação ao 7 de Setembro do ano passado. Defendeu o governo e suas pautas conservadores. Declarou-se imbrochável. Atacou Lula, o “ladrão nove dedos”. Defendeu o “extermínio” dos adversários. Fez tudo isso, mas teria poupado as instituições, segundo a visão do staff da campanha à reeleição.

De fato, Bolsonaro não chamou nenhum magistrado de “canalha”, como fizera em 2021. Entretanto, alguns trechos dos seus discursos passaram longe da moderação. Em Brasília, disse que “todos sabem o que é o Supremo Tribunal Federal”. Em seguida pronunciou algo que soou como ameaça: “É obrigação de todos jogarem dentro das quatro linhas da Constituição. Com a minha reeleição, nós traremos para as quatro linhas todos aqueles que ousam ficar fora dela.” No Rio, repetiu a referência ao Supremo. Fez uma pausa dramática, facultando aos devotos a oportunidade de preencher o seu silêncio com uma vaia estridente.

A pergunta a ser respondida nos próximos dias é a seguinte: a apropriação eleitoral do Dia da Pátria renderá a Bolsonaro votos novos em quantidade suficientes para mantê-lo no poder. Suspeita-se que o presidente tenha consolidado os votos que já possui, falando sobretudo para convertidos.

Seja como for, o 7 de Setembro consolidou uma sólida e irreversível certeza: o país terá que conviver com o incômodo por muitos anos. Bolsonaro consolidou-se como candidato favorito à posição de estorvo do Brasil. Se for reeleito, o que as pesquisas indicam ser improvável, dom Bolsonaro II ganhará mais quatro anos de Poder. Se for derrotado, será o líder incômodo de uma oposição agressiva. A perversão institucional dispõe de popularidade. Bolsonaro firmou-se como uma força política que arrasta multidões às ruas do Brasil.

Por Josias de Souza

GOLPISTA

O 7 de setembro do presidente Jair Bolsonaro começou com um café da manhã no Palácio do Alvorada com apoiadores. Diante de empresários como Luciano Hang (o véio da Havan), investigado pela Polícia Federal e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ministros e parentes, Bolsonaro repetiu discurso golpista. “A história pode se repetir”, disse durante a refeição, ao citar movimentos golpistas, como o golpe civil-militar (1964) e o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff (2016). Neste rol, também citou sua própria eleição, em 2018, alcançada com a prisão arbitrária de Lula, favorito a vencer naquele ano.

“O bem sempre venceu o mal”, prosseguiu. Após o café da manhã, Bolsonaro concedeu uma entrevista para a emissora estatal TV Brasil. Novamente, o presidente inflamou seus apoiadores e adotou um tom de pastor, ao invocar a religião para sustentar suas intenções golpistas. “O que está em jogo é nossa liberdade, é o nosso futuro (…) Todos, compareçam às ruas de verde e amarelo para festejar a terra onde vivemos, uma terra prometida, aqui é um grande paraíso (…) Estamos aqui porque acreditamos em nosso povo e nosso povo acredita em Deus.”

IMOBILIÁRIA FAMILIAR

A fortuna do clã presidencial construída com a negociação de 107 imóveis, sendo 51 deles comprados com dinheiro vivo, caiu como uma bomba na campanha de Jair Bolsonaro (PL) ainda mais depois que a pesquisa Ipec (antigo Ibope) apontou uma tendência de queda, com oscilação de um ponto negativo. As transações imobiliárias da família, que ainda não se explicou sobre o caso, foram narradas por PT em vídeo, que agora a campanha de Bolsonaro busca desesperadamente censurar.

MAIS MISOGENIA

O presidente Jair Bolsonaro (PL) fez um ataque contra a jornalista Amanda Klein com referência à sua vida pessoal. O episódio ocorreu em entrevista à rádio Jovem Pan. Depois de ouvir uma pergunta de Klein sobre supostos casos de corrupção envolvendo a família presidencial, Bolsonaro disse: “Amanda, você é casada com uma pessoa que vota em mim”.

“Não sei como é que é seu convívio na sua casa com ele”, continuou o presidente. “Minha vida particular não está em pauta”, respondeu a jornalista. “A minha vida particular está em pauta por que?”, retrucou Bolsonaro, no que foi confrontado por Amanda Klein: “Porque o senhor é o presidente da República”.

GENTE DE BEM

Apoiadora fanática de Jair Bolsonaro (PL), a socialite ruralista Roseli Vitória Martelli D’Agostini Lins, dona da Imbuia Agropecuária na cidade de Luiz Eduardo Magalhães, no interior da Bahia, virou alvo do Ministério Público do Trabalho (MPT) após divulgar um vídeo em seu perfil no Instagram em que orienta outros ruralistas que “demitam sem dó” os funcionários que votarem em Lula (PT). “Façam um levantamento. Quem for votar no Lula, demitam, e demitam sem dó, porque não é uma questão de política, é uma questão de sobrevivência. E você que trabalha com o agro e que defende o Lula, faça o favor, saia também”, bradou a socialite, que é sócia da empresa que emprega em 100 e 199 funcionários e presidenta da Associação de Produtories Rurais do Alto Horizonte. Em nota, o MPT baiano diz que foi aberto um inquérito civil  para investigar a possível ocorrência de assédio eleitoral em declarações publicadas nas redes sociais pela ruralista.

LAVANDO A ALMA

Após ser mandado tomar no c* pela torcida do Flamengo em peso no Maracanã na noite de quarta-feira (7), o presidente Jair Bolsonaro (PL) se retirou indignado. Um novo vídeo mostra o presidente saindo do estádio, enquanto a torcida continua gritado a plenos pulmões o famoso coro que tem ecoado por todo o país.

LAVANDO A ALMA 2

Uma foto, tirada em meio às micaretas eleitorais de Jair Bolsonaro, tem grande chance de ficar registrada como o puro suco deste 7 de Setembro distópico por retratar um microcosmo das dinâmicas do país. Jovens negros em um ônibus que ia de Copacabana para o Jacaré, na Zona Norte do Rio, vaiaram apoiadores do presidente que estavam na motociata puxada por ele, cavalgando belas motos. Na avenida Atlântica, onde os bolsonaristas se concentraram ao longo do dia, predominavam o amarelo das camisas e o branco da pele. Na sequência, os jovens foram alvo de um “enquadro” pela PM carioca…

LAVANDO A ALMA 3

Foi ao ar na última semana o site “Bolsopédia“. A iniciativa resgata a memória dos últimos anos do Brasil, sob comando de Jair Bolsonaro. De acordo com a própria “enciclopédia”, o objetivo é registrar “o legado de destruição” do período. O site compila uma série de ações e declarações do presidente em relação a temas como covid-19, desmatamento da Amazônia, relações promíscuas com o centrão político, crise econômica, corrupção, discursos de ódio, mentiras. Estão ali textos, matérias jornalísticas, vídeos e imagens que retratam o governo Bolsonaro. “Tudo o que Bolsonaro fez em quatro anos de governo (e não quer que você saiba)”, convidam os criadores. Os organizadores atribuem o levantamento a um coletivo independente. Todas as informações que constam do site são verificáveis nos registros do governo e portais jornalísticos.

FRASES DA SEMANA

“A Rainha Elizabeth morreu sem saber de onde veio o dinheiro usado pelo clã Bolsonaro para comprar 107 imóveis, 51 deles com dinheiro vivo”. (Guga Noblat, jornalista)

“A vontade do povo se fará presente no próximo dia 2 de outubro. Vamos todos votar, vamos convencer aqueles que pensam diferente de nós. Vamos convencê-los do que é melhor para nosso Brasil. Podemos fazer várias comparações até entre as primeiras-damas.” (Bolsonaro, 7/9/2022)

“O governo Bolsonaro tem problemas? Tem. Pode ter corrupção? Pode, mas numa escala muito menor. E para mim não tem nada pior para um país do que a praga da corrupção. Para mim, PT significa corrupção, significa atraso”. (Romeu Zema, NOVO, governador de Minas Gerais)

“Eu passo a campanha inteira dizendo que o PT virou uma organização criminosa, eles me insultam e me agridem todo dia, e depois esperam que eu apoie Lula no segundo turno? Nunca mais, Juvenal”. (Ciro Gomes, PDT, candidato a presidente da República pela quarta vez)

“Não se engane, nenhuma mulher é insubmissa, independente e livre”. (Heloísa Bolsonaro, psicóloga, mulher do deputado Eduardo Bolsonaro, em evento para mulheres, no Rio Grande do Sul)

“Prefere sacar da bolsa a Lei Maria da Penha ou uma pistola?” (Bolsonaro, em evento com mulheres na cidade de Nova Hamburgo, a 40 quilômetros de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul.)

“É motivo de preocupação a manipulação religiosa e a disseminação de fake news que têm o poder de desestruturar a harmonia entre pessoas, povos e culturas, colocando em risco a democracia”. (Trecho de carta da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, divulgada ontem)

Leia outros artigos da coluna: Ágora Digital

Victor Barone

Jornalista, professor, mestre em Comunicação pela UFMS.


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *