05/05/2024 - Edição 540

Poder

Moraes decide poupar STF de olho no julgamento de Bolsonaro por golpe

Ministro resolveu escolher melhor as batalhas que irá enfrentar daqui até o julgamento do ex-presidente por tentativa de golpe de Estado

Publicado em 25/04/2024 9:17 - Leonardo Sakamoto e Josias de Souza (UOL) – Edição Semana On

Divulgação Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

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Alvo de ataques da extrema direita, de parlamentares do centrão, de trumpistas em Washington e até de bilionário da tecnologia, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, resolveu escolher melhor as batalhas que irá enfrentar daqui até o julgamento de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado. E arquivou ação que pedia a prisão preventiva do ex-presidente por tentativa de asilo e de fuga devido a um bizarro Airbnb que Jair fez na embaixada da Hungria.

Após ter tido o seu passaporte apreendido em uma operação da Polícia Federal exatamente para evitar sua fuga do país, ele passou dois dias na representação diplomática do governo de extrema direita de Viktor Orbán, em Brasília, em fevereiro. Imagens de câmeras de segurança mostram o ex-presidente sendo recebido pelo embaixador Miklos Halmai, segundo reportagem do jornal The New York Times.

Moraes afirmou, contudo, que não há evidências que comprovem que ele buscou asilo. E disse que como embaixadas “não são consideradas extensão de território estrangeiro”, Bolsonaro não se ausentou do país.

Não são extensões, mas de acordo com convenções internacionais seguidas pela comunidade internacional (com exceção do governo do Equador), eles são territórios protegidos e invioláveis. Portanto, Jair não poderia ser alcançado pela polícia e pela Justiça brasileiras enquanto lá estivesse. Ou seja: não é que ele tentou ficar inatingível, ele de fato ficou. Foi um, digamos, pocket asilo.

Em sua avaliação da petição enviada ao Supremo Tribunal Federal por parlamentares do PT e do PSOL, a Procuradoria-Geral da República de Paulo Gonet já havia afirmado que o Airbnb de Jair não violava as medidas impostas para ele não se ausentar do país.

Uma ordem de prisão é tudo o que o núcleo do bolsonarismo deseja para o processo de vitimização do ex-presidente neste momento em que a investigação da PF sobre o caso ainda está em curso, ou seja, que ele nem foi denunciado formalmente ainda. Mas ao arquivar o caso, o ministro do STF preferiu ignorar também outras medidas que seriam cabíveis, como o uso de tornozeleira eletrônica ou uma obrigação para se apresentar periodicamente às autoridades. Foi cauteloso.

Em meio a ataques de diversos lados, ele resolveu poupar a própria imagem e a do STF para outras pedreiras, como o julgamento de civis e militares pela tentativa de golpe de Estado ocorrida o final de 2022 e o 8 de janeiro de 2023. Sim, muita gente já esqueceu, mas quase a democracia virou vinagre por aqui por conta do ex-presidente e seus amigos.

Resta saber se Bolsonaro e aliados vão encarar tal decisão como sinal de fraqueza da Justiça brasileira e ampliar o bombardeio.

‘Fator rua’ inibe o ímpeto de Moraes, avalia bolsonarismo

Ao arquivar o caso dos pernoites de Bolsonaro na embaixada da Hungria sem impor novas sanções cautelares ao hóspede, Alexandre de Moraes deixou em êxtase o bolsonarismo.

Após celebrar a novidade numa conversa com o próprio Bolsonaro, na tarde desta quarta-feira, um parlamentar aliado enxergou no encerramento do caso uma “autocontenção” de Moraes. Atribuiu a decisão do ministro do Supremo ao que chamou de “fator rua”.

Nessa versão, os atos políticos realizados na Avenida Paulista, em fevereiro, e em Copacabana, no último domingo, teriam elevado o “custo político do cerco judicial” a Bolsonaro.

Repetindo um argumento que ecoa entre os bolsonaristas desde a Semana Santa, o parlamentar declarou que “falta coragem” a Moraes para impor a Bolsonaro um tratamento semelhante ao que vem sendo dispensado ao seu ex-ajudante de ordens.

“Encarcerar Mauro Cid é uma coisa. Outra coisa bem diferente é prender Bolsonaro sem uma sentença”, repetiu o congressista. “O barulho seria grande.”

Moraes escorou sua decisão nos mesmos argumentos técnicos expostos em parecer da Procuradoria-Geral da República. Concluiu que não há evidências de que Bolsonaro buscou asilo na embaixada da Hungria. Portanto, não violou a medida cautelar que o proíbe de se ausentar do país.

Bolsonaro chegou à embaixada húngara na noite de 12 de fevereiro e deixou o prédio no dia 14. Quatro dias antes, a Polícia Federal havia apreendido o seu passaporte.

Disseminou-se a percepção segundo a qual o capitão refugiou-se na embaixada para fugir de uma eventual ordem de prisão, não para renovar contatos com autoridades da autocracia amiga de Viktor Orbán.

Ao segurar a caneta, Moraes sinalizou a intenção de customizar os seus embates conforme as especificações do cliente. Estimulou nos partidários do investigado mais ilustre a ilusão de que Bolsonaro realizará, em algum momento, a grande façanha de desfritar todos os ovos que a Polícia Federal levou à frigideira dos seus inquéritos.

Para aliados, faltaria ‘coragem’ a Moraes para prender Bolsonaro

Um integrante da brigada parlamentar bolsonarista disse que “falta coragem ao Xandão”. Esmiuçou seu raciocínio, compartilhado pelos colegas de bancada: “Encarcerar Mauro Cid é uma coisa. Outra coisa bem diferente é prender Bolsonaro sem uma sentença. O barulho seria grande no Congresso e nas ruas”.

O parlamentar comparou a rivalidade entre Moraes e Bolsonaro a uma “desavença de pátio de colégio”, sujeita a uma certa ponderabilidade cômica. “Se quisesse, Moraes poderia quebrar as pernas de Bolsonaro”, afirmou, entre risos. “Mas a demora da reação compromete a seriedade da cena. É nítida a ausência de propósito. A prisão preventiva seria uma covardia injustificável.”


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