18/05/2024 - Edição 540

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Juristas apostam que denúncias contra “cabeças coroadas” do golpismo saem neste semestre

Supremo precisa encerrar novela criminal estrelada por Bolsonaro

Publicado em 23/01/2024 10:01 - Carolina Brigido e Josias de Souza (UOL), Agência Brasil - Edição Semana On

Divulgação Marcelo Camargo - Abr

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Fontes do Ministério Público Federal e de tribunais superiores apostam que a partir de fevereiro, quando serão retomadas as atividades da cúpula do Judiciário, serão apresentadas denúncias contra autoridades investigadas de participação nos ataques de 8 de janeiro do ano passado na Praça dos Três Poderes.

Entre as autoridades que são alvo de inquérito estão o ex-presidente Jair Bolsonaro e oficiais das Forças Armadas.

O subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, que conduziu a primeira parte das investigações durante a gestão Aras, foi o responsável por recuperar uma prova chave que poderá subsidiar a denúncia contra Bolsonaro: um vídeo postado e apagado do perfil do ex-presidente no Facebook.

Em dezembro, pouco antes de Carlos Frederico deixar o posto, o relatório de perícia, as imagens e as informações relativas à postagem foram encaminhadas para o STF e podem servir como prova de incitação aos atos de 8 de janeiro.

As investigações contra Bolsonaro também ganharam fôlego com a delação do seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid. Segundo o militar, o ex-presidente teria participado de reunião para discutir um possível golpe de Estado.

Desde que tomou posse no cargo, em 19 de dezembro, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tem priorizado as investigações decorrentes dos atos golpistas do ano passado. Embora ele tenha trocado os procuradores responsáveis pelas apurações, parte dos assessores que atuavam na gestão de Augusto Aras continuaram nos casos.

Deputados na mira

Outros quatro inquéritos abertos para investigar deputados federais por suposta incitação aos atos golpistas estão parados, mas podem começar a andar.

A Polícia Federal concluiu que praticaram crimes:

– André Fernandes (PL-CE);

– Clarissa Tércio (PP-PE);

– Silvia Waiãpi (PL-AP);

– General Girão (PL-RN).

Em parte das investigações, a PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu o arquivamento durante a gestão Aras. Agora, Gonet pode reter essa posição e apresentar denúncia contra os parlamentares.

O governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB-DF), e o ex-ministro e ex-secretário Anderson Torres ainda não foram denunciados, mas seguem investigados.

As denúncias da PGR

A PGR já apresentou 1.413 denúncias ao STF. Dessas, 1.156 foram por incitação, 248 por execução dos crimes e oito por omissão de agentes públicos, sendo sete delas contra integrantes da cúpula da Polícia Militar do Distrito Federal.

O único denunciado como financiador é o empresário Pedro Luis Kurunczi, de Londrina (PR). Segundo a acusação da PGR, ele fretou quatro ônibus ao custo de R$ 59,3 mil para levar 108 bolsonaristas à capital federal.

Até agora, 30 pessoas foram condenadas por participar dos atos, todas do grupo dos executores, que vandalizaram os prédios públicos e atentaram contra a democracia. Oficiais da PM-DF estão presos e respondem por conivência com os ataques.

Estão na mira agora oficiais das Forças Armadas, autoridades, financiadores e mentores intelectuais da tentativa de golpe.

Entre integrantes do STF, o entendimento é que o Exército tolerou de forma indevida o acampamento de bolsonaristas em frente ao quartel-general, em Brasília, onde estava instalada parte dos golpistas de 8 de janeiro.

Fontes do Ministério Público e de cortes superiores acreditam que, no julgamento final, o STF tratará financiadores, mentores intelectuais e autoridades com o mesmo rigor que tratou os executores do 8 de janeiro.

PGR é contra ida de Daniel Silveira para regime semiaberto

A PGR enviou ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) parecer contrário à progressão do regime de prisão do ex-deputado federal Daniel Silveira. Atualmente, ele está preso em regime fechado no presídio de Bangu, no Rio de Janeiro.

Em abril de 2022, Silveira foi condenado pelo STF a 8 anos e 9 meses de prisão pelos crimes de tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes e coação no curso do processo.

De acordo com a defesa, somando o tempo que ficou preso antes da condenação, o ex-parlamentar tem direito a passar para o regime semiaberto por ter cumprido 16% da pena.

Ao opinar contra a progressão de regime, o vice-procurador da República, Hindenburgo Chateaubriand, entendeu que o cálculo feito pelos advogados levou em conta o cometimento de crimes sem violência e não pode ser utilizado no caso concreto.

“Este órgão ministerial manifestou-se pelo indeferimento do pedido, porque o cálculo desenvolvido pela defesa considerou, para fins de transferência para regime menos rigoroso, o cumprimento de 16% da pena a ser computado em casos de crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça, não aplicável ao caso concreto”, afirmou.

Após receber o parecer da PGR, Alexandre de Moraes vai decidir sobre o pedido de progressão de regime.

No ano passado, o Supremo anulou o decreto de graça constitucional concedido em 2022 pelo então presidente Jair Bolsonaro para impedir o cumprimento da pena de Silveira. A Corte entendeu que o decreto é inconstitucional por desvio de finalidade de Bolsonaro para beneficiar Silveira.

Supremo precisa encerrar novela criminal estrelada por Bolsonaro

A Justiça brasileira tarda. E nem sempre chega. Nos quatro anos do mandato de Bolsonaro, a delinquência antidemocrática esteve dentro do gabinete presidencial ou na vizinhança. Os inquéritos nos quais o Supremo Tribunal Federal varre esse período consolidam a percepção de que o crime é perto. Mas a punição mora muito longe.

Em despacho divulgado na segunda-feira (23), Alexandre de Moraes esticou por mais 90 dias o inquérito sobre milícias digitais. Essa investigação já foi prorrogada uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove vezes. Em março, o processo fará aniversário de três anos. Outro inquérito, sobre fake news, completará cinco anos. Ambos foram cruciais à defesa do processo eleitoral de 2022 e das instituições.

Entretanto, a duração perpétua de investigações sigilosas não combina com a democracia que os inquéritos visam defender. Aberto originalmente para apurar a disseminação de ataques do bolsonarismo às instituições nas redes sociais, o inquérito sobre as milícias encostou definitivamente em Bolsonaro ao incorporar os casos das joias sauditas, da falsificação de cartões de vacina, das mensagens que desaguaram no 8 de janeiro e a própria delação de Mauro Cid.

Apenas quando os inquéritos se tornarem públicos será possível avaliar integral e conclusivamente as críticas que atribuem abusos a Alexandre de Moraes. Mas até quem considera que o ministro e seus pares cumpriram o papel de zelar pela defesa da Constituição numa fase em que havia um usurpador na Presidência e um antiprocurador na Procuradoria-Geral já percebeu que convém colocar um ponto final nas investigações.

É hora de encaminhar a novela criminal para um encerramento. Considerando-se a profusão de evidências, seria decepcionante se o epílogo não incluísse um bom lote de sentenças criminais contra Bolsonaro e seus cúmplices. Seja como for, é preciso recuperar a noção segundo a qual o encerramento de processos, com a fixação das penas ou o arquivamento de eventuais inconsistências, também é parte essencial do trabalho do Judiciário.


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