18/05/2024 - Edição 540

Poder

General de pijama liga forças especiais do Exército a atos golpistas de 8/1

Comandante do Exército defende almirante acusado de golpista

Publicado em 29/09/2023 10:15 - Leonardo Sakamoto e Josias de Souza (UOL), Ricardo Noblat (Metrópoles), André Richter (Agência Brasil), Yurick Luz (DCM) – Edição Semana On

Divulgação Reprodução

Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.

O general da reserva Ridauto Lúcio Fernandes, alvo da 18ª fase da Operação Lesa Pátria, nesta sexta (29), pode confirmar que o 8 de janeiro foi uma tentativa de golpe planejada e executada com a ajuda de membros das forças especiais do Exército – do qual ele fazia parte.

Quem acompanhou os atos golpistas, com a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, percebeu que determinadas ações não condiziam com uma turba amalucada e amadora. A forma como eles derrubaram as grades de proteção e as usaram posteriormente como escada para acessar o Congresso Nacional por entradas de ventilação ou mesmo como se deu o enfrentamento ao gás disparado pela Polícia Militar indica gente com treinamento militar especial.

O objetivo nunca foi tomar o poder através da turba, mas criar uma justificativa para uma intervenção militar com a desculpa de reestabelecer a ordem. E, daí, derrubar o resultado das eleições e trazer de volta Jair ao poder.

Ridauto participou dos atos golpistas e a investigação aponta que ele pode ser um dos seus organizadores. Seu último cargo público foi o de diretor de Logística do Ministério da Saúde durante a pandemia de covid-19, mas ele chegou a ocupar chefia no Comando de Operações Especiais. Ele é um “kid preto”, como são chamados os que fazem o curso das forças especiais, elite do Exército.

Também fazem parte dessa elite outros nomes importantes do governo Bolsonaro, como o tenente-coronel Mauro Cid (ex-faz-tudo de Jair), o general Luiz Eduardo Ramos (ex-ministro-chefe da Casa Civil), o general Eduardo Pazuello (ex-ministro da Saúde e hoje deputado federal), o coronel Élcio Franco (ex-secretário executivo da Saúde) e o general Dutra (ex-chefe do Comando Militar do Planalto).

Vale lembrar, inclusive, que conversas obtidas pela Polícia Federal dos celulares dos envolvidos mostram Franco e o major Aílton Barros discutindo as possibilidades para um golpe de Estado diante da negativa do comandante do Exército, general Freire Gomes, em participar.

“Esse Alto Comando de merda que não quer fazer as porras, é preciso convencer o comandante da Brigada de Operações Especiais de Goiânia a prender o Alexandre de Moraes. Vamos organizar, desenvolver, instruir e equipar 1.500 homens”, diz Barros.

Outros grupos de elite da Forças Armadas também foram citados nas investigações sobre a tentativa de golpe de Estado.

Um dos bolsonaristas condenados por plantar uma bomba para tentar explodir um caminhão de combustível no aeroporto de Brasília na véspera de Natal, Alan Diego dos Santos, afirmou à Polícia Civil do Distrito Federal que um grupo bem treinado de militares da reserva se ofereceu para fabricar e instalar o explosivo.

Mas, segundo o terrorista, como os “Boinas Vermelhas” queriam cobrar pelo serviço, ele resolveu fazer e colocar o explosivo por conta própria com a ajuda de George Washington de Sousa. Tal como Alan, o homônimo do primeiro presidente dos Estados Unidos foi condenado e preso. Como todos sabemos, a bomba plantada no caminhão-tanque feita por amadores deu chabu.

Se tivesse explodido e matado centenas no aeroporto, isso seria usado como gatilho para detonar uma intervenção dos militares. Minutas golpistas para embasar isso já estavam prontas, inclusive, tendo sido achadas na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, e no celular de Mauro Cid.

Um relatório da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), de 27 de dezembro, ou seja, três dias após o atentado que flopou, alertou para a presença do grupo extremista de militares da reserva no acampamento golpista em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília. Eles teriam se apresentado como membros da reserva das Brigadas de Infantaria Paraquedista do Exército. Os dados foram enviados à CPMI dos Atos Golpistas.

O material apreendido pela PF na operação de busca e apreensão contra Ridauto Lúcio Fernandes, um general de pijama, pode ajudar a esclarecer quais militares das forças especiais, da ativa e da reserva, participaram do plano. E reforçar o que todos já sabem: que o 8 de janeiro não foi uma manifestação popular espontânea, mas uma tentativa estruturada para manter Bolsonaro e os militares no poder.

Comandante do Exército defende almirante acusado de golpista

Quase 60 anos e várias gerações passadas, algum chefe militar admitiria hoje que o golpe de março de 1964 suprimiu a democracia e implantou uma ditadura que torturou e matou?

A famosa frase “Um por todos e todos por um”, do escritor francês Alexandre Dumas, autor dos romances “Os Três Mosqueteiros” e “O Conde de Monte Cristo”, se aplica aos militares à perfeição.

Não se abandona companheiros mortos ou feridos no campo de batalha, tenham eles travado o bom ou o mal combate. É assim que os militares agem, vençam ou percam. Espírito de corpo.

O almirante Almir Garnier Santos, comandante da Marinha até dezembro último, foi acusado de ter dito sim à proposta de golpe apresentada por Bolsonaro para impedir a posse de Lula.

Embora não falem, os militares não gostaram nem um pouco da denúncia feita em delação premiada pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante-de-ordem de Bolsonaro. Mauro Cid estava lá.

Garnier está mudo e sumido. Mas o comandante do Exército, general Tomás Paiva, saiu em sua defesa. Em entrevista à Folha de S. Paulo, disse que Garnier “sempre foi uma pessoa honrada”: Eu fui colega dele, sempre foi uma pessoa honrada, correta. Eu acho difícil ele ter apoiado uma tentativa de golpe. Mas isso está sob investigação e eu não devo me pronunciar mais sobre isso”.

Não se discute as qualidades de Garnier, “uma pessoa tranquila e inteligente”, segundo Piva, mas se ele foi ou não cúmplice de uma tentativa de golpe. Se não foi, por que o silêncio? Medo do quê?

Tomás Paiva também saiu em defesa do general Freire Gomes, que o antecedeu no cargo, ouviu a proposta de Bolsonaro e recusou-a, chegando a ameaçá-lo com ordem de prisão: “O que eu posso garantir é que o meu comandante [general Freire Gomes], quando eu era integrante do Alto Comando, deixou claro que não tinha possibilidade de fazer qualquer coisa que não fosse constitucional”.

Deixou claro para quem, só para os colegas? Por que Freire Gomes não prendeu Bolsonaro ou não deu parte dele à Justiça? Poderia tê-lo feito, deveria tê-lo feito, mas não fez. Golpe é crime.

Como a Folha publicou, quando Garnier disse que deixaria o cargo antes da posse de Lula, em reunião no Rio de Janeiro às vésperas do Natal, o conjunto de chefes da Marinha se opôs a isso.

Em sinal inédito de protesto, Garnier faltou à solenidade de passagem do comando da Marinha para seu sucessor, o almirante Marcos Sampaio Olsen. Pessoa honrada e correta, esse Garnier.

Barroso afirma que Forças Armadas não sucumbiram ao golpismo

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, defendeu ontem (28) a democracia e disse que as Forças Armadas não “sucumbiram ao golpismo”.

No primeiro discurso no plenário da Corte após a posse, Barroso fez referência aos atos golpistas de 8 de janeiro e disse que os ministros estão unidos em defesa da democracia.

“As instituições venceram, tendo ao seu lado a presença indispensável da sociedade civil, da imprensa e do Congresso Nacional. E, justiça seja feita, na hora decisiva, as Forças Armadas não sucumbiram ao golpismo”, afirmou.

Moraes vota para condenar mais 5 réus por atos terroristas do 8/1

No último dia 26, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), proferiu seu voto a favor da condenação de cinco réus envolvidos nos atos terrorista promovidos por bolsonaristas em Brasília, no dia 8 de janeiro. As penas propostas variam de 12 a 17 anos de prisão.

Após a manifestação de Moraes, os outros dez magistrados do STF têm até as 23h59 de domingo para apresentar seus posicionamentos. Os advogados de defesa tiveram a oportunidade de realizar sustentações orais por meio do sistema eletrônico antes do início da sessão virtual.

O ministro emitiu votos individuais para cada um dos acusados, enfatizando que a “resposta estatal não pode falhar quanto à observância da necessária proporcionalidade na fixação das reprimendas”.

“Como já assinalado, a motivação para a condutas criminosas visava o completo rompimento da ordem constitucional, mediante a prática de atos violentos, em absoluto desrespeito ao Estado Democrático de Direito, às Instituições e ao patrimônio público”, disse Moraes.

Quem são os réus?

Davis Baek

Davis Baek, de 41 anos e residente em São Paulo, foi preso na Praça dos Três Poderes. As autoridades policiais o detiveram com dois rojões não disparados, munições de gás lacrimogêneo, balas de borracha, uma faca e dois canivetes. Baek alegou ser cristão e afirmou estar no acampamento em frente ao QG do Exército, em Brasília.

Ele é considerado executor e incitador dos atos golpistas. A defesa solicitou sua absolvição com base no argumento de que as testemunhas ouvidas pelo STF não confirmaram sua participação em ameaças graves ou atos violentos, tampouco em destruição de patrimônio público. Moraes propôs uma pena de 12 anos, e Baek continua detido.

João Lucas Valle Giffoni

Com 26 anos e morador de uma área nobre de Brasília, João Lucas Valle Giffoni foi preso após a invasão do Congresso. Ele é acusado de fazer parte de um grupo que invadiu o Congresso para depredar as instalações, causando danos a vidraças, móveis, computadores, obras de arte e câmeras de circuito fechado de TV.

Giffoni alegou que estava participando de uma manifestação pacífica e que considerava sua ação como um ato patriótico, não praticando violência. Ele afirmou que entrou no Senado para se proteger das bombas lançadas pela polícia e que, lá dentro, havia pessoas cantando e orando.

O bolsonarista também negou ter a intenção de dar um golpe ou depor o governo eleito, pois não possui preferência político-partidária. A defesa pede sua absolvição, enquanto Moraes propôs uma pena de 14 anos.

Jupira Silvana da Cruz Rodrigues

Jupira, servidora pública aposentada de 57 anos e residente em Betim (MG), foi presa no interior do Palácio do Planalto. A Polícia Federal (PF) encontrou seu material genético em uma garrafa esquecida no local.

A defesa solicita sua absolvição, alegando que não há provas de sua participação em destruição ou depredação, já que nada foi apreendido com ela, e que a PGR não conseguiu comprovar sua participação nos crimes denunciados. Moraes propôs uma pena de 14 anos para a investigada.

Moacir José dos Santos

Moacir José dos Santos, de 52 anos e natural de Cascavel (PR), foi preso após a invasão do Palácio do Planalto. A Polícia Federal encontrou seu material genético em objetos dentro do Planalto, além de vídeos e fotos da destruição em seu celular.

Santos afirmou que foi a Brasília em um ônibus fretado com mais de 60 pessoas em busca de um Brasil melhor, sendo um defensor das escrituras sagradas. A defesa argumenta que ele entrou no Planalto por instinto e para se proteger das bombas lançadas pela polícia, com os próprios policiais indicando que os manifestantes entrassem no prédio.

Bolsonaristas durante depredações na sede do Congresso, em Brasília. Foto: Reprodução

Além disso, a defesa pede sua absolvição, alegando que ele não cometeu atos criminosos, não se associou a ninguém e não estava armado. No entanto, Moraes propôs uma pena de 17 anos para o acusado.

Nilma Lacerda Alves

Nilma Lacerda Alves, de 47 anos e residente em Barreiras (BA), foi presa no Palácio do Planalto, acusada de integrar um grupo que destruiu obras de arte e bens públicos no local.

A defesa nega as acusações, argumentando que não há provas que sustentem as alegações e que nenhum indício contundente foi apresentado. Eles pedem o arquivamento imediato do processo. Moraes propôs uma pena de 14 anos para a ré.

Reginaldo Carlos Beagiato Garcia

O caso de Reginaldo Carlos Beagiato Garcia estava previsto para julgamento, mas foi retirado da análise no plenário virtual.

A decisão final sobre a condenação ou absolvição dos réus será determinada com base nos votos dos demais ministros do STF nas próximas semanas.

Ao retirar militares das urnas, TSE reconhece erro histórico

Existe, sem dúvida, um remédio para cada erro: corrigi-lo. Em decisão unânime, o plenário do Tribunal Superior Eleitoral aprovou resolução que retira as Forças Armadas do rol de órgãos e entidades aptas a fiscalizar o sistema eleitoral. Não haverá mais fardados na comissão de transparência das futuras eleições.

Ao apresentar a novidade, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, declarou que a participação dos militares “não se mostrou necessária, razoável e eficiente”. As palavras de Moraes valem como reconhecimento de um erro histórico.

Foi de boa-fé que o então presidente do TSE Luís Roberto Barroso atravessou os militares no caminho das urnas. A providência revelou-se desnecessária, irracional e ineficiente. O pressuposto era o de que as Forças Armadas, supostamente legalistas, funcionariam como antídoto contra o veneno de Bolsonaro. Deu tudo errado.

Barroso deu crédito à superstição segundo a qual oficiais do alto-comando poderiam atuar como moderadores de Bolsonaro. Aconteceu o oposto. A cabeça de certos generais e de outros generalistas incertos revelou-se um terreno baldio no qual o capitão jogava todo tipo de lixo —de teorias conspiratórias a mentiras sobre as urnas.

Desde 1996, quando a votação eletrônica estreou, Bolsonaro e sua prole disputaram 21 eleições. Venceram 19. Em 2016, quando disputou a prefeitura do Rio de Janeiro, o primogênito Flávio Bolsonaro caiu no primeiro turno, com irrisórios 14% dos votos. Em 2022, Bolsonaro perdeu para Lula no segundo turno pela magra diferença de 1,8% dos votos.

A despeito do histórico, Bolsonaro cavalgou as “minhas Forças Armadas” na sua cruzada contra o sistema eleitoral. Sua implicância era com o risco de derrota, não com as urnas eletrônicas. Isso ficou claro no documento em que o Ministério da Defesa expôs suas conclusões sobre a fiscalização das Forças no sistema eletrônico de votação.

Os militares concluíram que “houve conformidade entre os boletins de urna impressos e os dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral”. O mesmo texto anotou que foi “inconclusivo” o teste com biometria. E colocou em dúvida a segurança das urnas.

Os militares sustentaram no documento que sua fiscalização “não permite afirmar que o sistema eleitoral de votação está isento de um eventual código malicioso que possa alterar o seu funcionamento.”

Hoje, sabe-se que Bolsonaro enviou para a pasta da Defesa o hacker de Araraquara. Em depoimentos à PF e à CPI do Golpe, Walter Delgatti disse ter orientado os militares escalados para implicar com as urnas. A esse ponto de esculhambação chegou a democracia brasileira.

Entregue a Alexandre de Moraes pelo então ministro da Defesa, o agora sumido general Paulo Sérgio Nogueira, o resultado da inspeção militar nas urnas foi usado por Bolsonaro para esticar sua estratégia de questionamento da vitória de Lula. O teor do documento e a pregação do capitão mostraram-se compatíveis. Ambos usaram a insinuação como principal matéria-prima.

O texto jogou lenha na fogueira que ardia nos atos antidemocráticos e nos acampamentos que pediam golpe nas portas dos quarteis desde a proclamação do resultado da eleição presidencial, em 30 de outubro do ano passado.

Num trecho do relatório da inspeção eleitoral, os militares escreveram: “…Em suma, as oportunidades de melhoria indicam que é pertinente ampliar o acesso ao conteúdo do sistema, bem como realizar o trabalho das entidades fiscalizadoras conjuntamente com os técnicos do TSE, para o esclarecimento imediato de quaisquer dúvidas da equipe fiscalizadora.”

Mais adiante tropeça-se em coisas assim: “Devido à complexidade do sistema eleitoral de votação e à falta de esclarecimentos técnicos oportunos e de acesso aos conteúdos de programas e bibliotecas […] não foi o possível fiscalizar o sistema completamente, o que demanda a adoção de melhorias no sentido de propiciar a sua inspeção e análises completas.”

Ou assim: “Na vertente dos mecanismos de fiscalização do sistema no momento da votação, a incapacidade de o teste de integridade e do projeto-piloto com biometria reproduzirem, com fidelidade, as condições normais de uso das urnas eletrônicas que foram testadas não permite afirmar que o sistema eleitoral de votação está isento de um eventual código malicioso que possa alterar o seu funcionamento.”

No ofício em que encaminhou para Moraes o resultado da inspeção, o general Paulo Sérgio fez questão de borrifar suspeição: “Assinalo que o trabalho restringiu-se à fiscalização do sistema eletrônico de votação, não compreendendo outras atividades, como, por exemplo, a manifestação acerca de eventuais indícios de crimes eleitorais.”

O general sugeriu ao presidente do TSE a realização de “uma investigação técnica para melhor conhecimento do ocorrido na compilação do código-fonte [das urnas] e de seus possíveis efeitos”. Aconselhou a Justiça Eleitoral a “promover a análise minuciosa dos códigos binários” usados nas urnas.

A serviço de Bolsonaro, o general propôs “a criação de uma comissão específica, integrada por técnicos renomados da sociedade e por técnicos representantes das entidades fiscalizadoras.” Insinuou, a 52 dias da posse de Lula, que a democracia brasileira estava sob risco. Pediu pressa.

“Em face da importância do processo eleitoral para a harmonia política e social do Brasil, solicito ainda a essa Corte Superior considerar a urgência na apreciação da presente proposição”. Deu no que está dando.

Contra esse pano de fundo radioativo, não basta expurgar as Forças Armadas da fiscalização das urnas. É preciso retirar da toca os golpistas que continuam escondidos atrás das fardas e do patriotismo de fancaria.

A página do golpe só será virada depois da punição dos culpados

No passado, generais que falavam muito eram quase sempre da reserva que, à falta do que fazer, jogavam dominó em praças públicas do Rio e vestiam terno completo para frequentar a sede do Clube Militar, onde discutiam a situação do país.

Os generais calados eram da ativa, em comando de tropa. A esses, que de fato são os que decidem os rumos do Exército, junta-se agora um novo tipo de oficial: os Calados do B, da ativa, investigados por um golpe que falhou.

Cadê o general Freire Gomes, comandante do Exército até dezembro último? Oito oficiais-generais disseram ao repórter Cézar Feitosa que Freire Gomes relatou que Bolsonaro apelou às Forças Armadas por um golpe para impedir a posse de Lula.

À Polícia Federal, em delação premiada, o tenente-coronel Mauro Cid contou que Freire Gomes chegou a ameaçar prender Bolsonaro se ele insistisse com a proposta de golpe. Por que não o prendeu? Por que não o denunciou? Por que Freire Gomes está mudo?

Por que se calam o brigadeiro Baptista Júnior e o almirante Almir Garnier, à época comandantes da Aeronáutica e da Marinha, respectivamente? Dizem que o brigadeiro ouviu calado a proposta de Bolsonaro, e que a ela o almirante aderiu com entusiasmo.

Os dois e Freire Gomes são cúmplices de um crime. Bolsonaro não se reuniu com eles uma dezena de vezes apenas para trocar ideias sobre um golpe hipotético. Reuniu-se para avaliar se as Forças Armadas estariam dispostas a apoiá-lo no caso de um golpe.

Era o que mais desejavam os generais falantes da reserva, alguns também da ativa, além de oficiais de patente inferior, contrários à volta da esquerda ao poder, e que em 2018 votaram em Bolsonaro e em 2022 se frustraram com a sua derrota.

Os generais calados barraram o golpe. Em julho de 2022, o general Paulo Sérgio de Oliveira, ministro da Defesa, ouviu do secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, que seu país não apoiaria um golpe no Brasil, mas sim o presidente eleito.

Os encarregados de negócios dos Estados Unidos no Brasil, Douglas Knoff, e do Reino Unido, Melanie Hopkins, participaram de reuniões secretas com generais para sondá-los sobre a posição das Forças Armadas se Lula vencesse Bolsonaro.

Quantas vezes de janeiro para cá você não ouviu militares e seus porta-vozes dizerem que “é preciso virar a página”? Por “virar a página”, entenda-se: pôr um ponto final na discussão e nas investigações sobre as tentativas fracassadas de golpe.

Sim, tentativas. Porque foi mais de uma: a que se daria entre novembro e dezembro para impedir a posse de Lula, e a amadora e atabalhoada de 8 de janeiro que resultou na invasão do Palácio do Planalto, do Congresso e do prédio do Supremo Tribunal Federal.

Nas últimas 48 horas, em sucessivas declarações, o senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice de Bolsonaro, recomendou que se passe uma borracha no que aconteceu. Quem já foi pego que se defenda. Por que correr atrás de mais gente?

Mourão chamou de “revanchismo” do governo do PT a convocação para depor à CPI do Golpe do general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional de Bolsonaro: “A CPI é para investigar o 8 de janeiro e essa turma aí já estava fora do governo, não teve nada a ver com esse processo. Então a minha visão é muito clara: isso é revanchismo. Não havia necessidade nenhuma (do depoimento de Heleno)”.

Na opinião de Mourão, a convocação de generais como Heleno e Braga Netto tensiona o ambiente com as Forças Armadas, “principalmente com o pessoal da reserva que pressiona, obviamente, o pessoal da ativa.”

Quanto a Bolsonaro, que corre o risco de ser indiciado pela CPI, Mourão afirma: “É vergonhoso indiciar o Bolsonaro, com base em quê? Tem que aparecer uma prova concreta de que o Bolsonaro financiou, exortou, planejou e preparou os acontecimentos de 8 de janeiro. Ele não fez isso”.

Bolsonaro não é o foco das preocupações de Mourão, e sim seus colegas de farda. É com eles que também se preocupa o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, que diz que as “Forças estão cientes do seu papel de parceiras do governo”.

Parceiras, como assim? Os militares são servidores públicos, pagos por nós, obrigados a trabalhar com qualquer governo e a respeitar a lei acima de tudo. Os que não respeitarem, tanto mais porque andam armados, devem ser punidos com extremo rigor.

 


Voltar


Comente sobre essa publicação...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *