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Publicado em 24/01/2019 12:00 -
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O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, e o autoproclamado presidente interino, o opositor Juan Guaidó, intensificarão a ofensiva pelo poder, em meio a uma mobilização internacional sobre a crise do país sul-americano.
Depois de receber na quinta-feira (24) o apoio decisivo das Forças Armadas, Maduro terá um encontro nesta sexta-feira com a imprensa nacional e estrangeira para intensificar as denúncias de um golpe de Estado em marcha, orquestrado por Washington.
O procurador-geral, Tarek William Saab, também fará um discurso nesta sexta sobre a ordem do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) para a abertura de uma investigação penal sobre a Assembleia Nacional de maioria opositora, acusado de "usurpar" as funções de Maduro.
Guaidó, presidente da Assembleia Nacional que proclamou ser o governante do país na quarta-feira (23), declarou na noite de quinta, em uma entrevista ao canal Univisión, que em breve serão anunciadas ações para sábado (26) e domingo (27).
"Vamos seguir adiante para obter o fim da usurpação, um governo de transição e eleições livres", afirmou, de um local de Caracas não revelado.
Ele pediu aos venezuelanos que prossigam com os protestos, que em quatro dias de distúrbios deixaram 26 mortos.
Guaidó se autoproclamou presidente invocando o artigo 233 da Constituição, entre outros, que aponta um vácuo de poder em caso de renúncia, incapacidade mental, morte do presidente ou abandono de cargo, embora suas decisões tenham sido consideradas nulas pelo TSJ.
"Há perigos que advêm de governos paralelos", advertiu Michael Shifter, do Diálogo Interamericano.
Reconhecimento brasileiro
O presidente Jair Bolsonaro reconheceu na quarta-feira (23) o deputado Juan Guaidó, de 35 anos, como presidente interino da Venezuela e prometeu apoio político e econômico para que “a democracia e a paz social voltem” ao país. O anúncio foi feito por Bolsonaro pelas redes sociais diretamente de Davos, na Suíça, onde participa do Fórum Econômico Mundial. Ele seguiu o mesmo posicionamento do presidente norte-americano, Donald Trump.
“O senhor Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional venezuelana, assumiu hoje, 23/01, as funções de presidente encarregado da Venezuela, de acordo com a Constituição daquele país, tal como avalizado pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). O Brasil reconhece o senhor Juan Guaidó como presidente encarregado da Venezuela. O Brasil apoiará política e economicamente o processo de transição para que a democracia e a paz social voltem à Venezuela", escreveu Bolsonaro.
Trump havia se manifestado no mesmo sentido: “Os cidadãos da Venezuela sofreram muito tempo nas mãos do regime ilegítimo de Maduro". O presidente Nicolás Maduro foi reeleito em uma eleição cercada de suspeitas de fraude, segundo seus opositores. O atual mandato, iniciado em 10 de janeiro, está previsto até 2025.
Além do Brasil e dos Estados Unidos, também reconheceram Guaidó como presidente da Venezuela, até o momento, os seguintes países: Argentina, Paraguai, Colômbia e Canadá.
Cenários possíveis
A Venezuela está em uma situação fluida que pode resultar nos seguintes cenários nos próximos dias, semanas e meses.
Transição para a democracia: Maduro seria deposto ou renunciaria. Guaidó lideraria a redemocratização até eleições serem convocadas. Seria o melhor de todos os cenários. Com o isolamento do regime venezuelano e apoio dos EUA e das maiores nações da América Latina, esta possibilidade tem ganhado força. Ditadores tão ou ainda mais poderosos do que Maduro, como Hosni Mubarak do Egito, não aguentaram a pressão e acabaram deixando o cargo. Uma saída para o atual ditador, como o exílio em Cuba, poderia ajudar a reduzir a resistência. Mais importante, as Forças Armadas precisariam deixar de apoiá-lo.
Militares assumem o poder: Maduro seria removido do cargo pelos militares atualmente ao lado dele. Neste caso, estes generais poderiam tanto levar adiante uma transição para a democracia como também estabelecer um regime militar sem associação ao atual ditador do país. Desta forma, eles evitariam o risco de serem processados por um futuro governo democrático por crimes cometidos durante as décadas de chavismo. Há uma série de regimes que conseguiram se perpetuar trocando o líder.
Maduro sobrevive: Os protestos teriam de perder força, o que é altamente improvável neste momento. A tendência parece ser de crescimento na oposição, ainda mais com o respaldo internacional a Guaidó. Para conter o avanço, o ditador precisaria intensificar a repressão. As mortes e prisões gerariam enorme repúdio internacional, com o isolamento aumentando. Maduro tentaria buscar amparo em países como Turquia, China, Irã e Rússia. Mas não está claro o quanto estas nações, apesar da aliança com o chavismo, bateriam de frente com países da América Latina e os EUA para defender Maduro. A Venezuela não tem, para Putin, a importância da Síria.
Governos paralelos: Seria a coexistência de dois governos paralelos, como ocorre na Líbia. Acho quase impossível isso acontecer na Venezuela. Governos paralelos funcionam quando há divisões geográficas entre os dois lados. No caso venezuelano, todos estão em Caracas e espalhados pelo restante do país. Pode, no máximo, Guaidó simbolicamente ser chamado de presidente, mas com a burocracia de Estado seguindo nas mãos de Maduro. Seria a manutenção do status quo de hoje pelos próximos meses. Guaidó não seria preso e Maduro seguiria no poder. Mas a ditadura seguiria e basicamente seria o cenário similar ao “Maduro sobrevive”.
Guerra civil: Parte das Forças Armadas rompe com Maduro, mas outros seguem leais ao regime, assim como milícias chavistas. Os dois lados passariam a lutar abertamente pelas ruas numa guerra civil similar à observada na América Central nos anos 1980. Líderes civis perderiam força. Milhares poderiam morrer, e talvez milhões tentem buscar abrigo em outros países da região. Até mesmo uma intervenção externa não poderia ser descartada.
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