02/11/2024 - Edição 550

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Lula defende diálogo e critica escalada da guerra entre Rússia e Ucrânia em cúpula do Brics

Com veto do Brasil, Venezuela e Nicarágua foram excluídas de uma lista prévia que define os países candidatos ao status de parceiros dos Brics

Publicado em 23/10/2024 12:43 - Semana On, DW – Edição Semana On

Divulgação Agência Brasil

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Em discurso transmitido por videoconferência durante a cúpula do Brics, realizada na Rússia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva destacou a importância de evitar a escalada do conflito entre Rússia e Ucrânia. Embora não tenha mencionado diretamente o presidente russo, Vladimir Putin, que acompanhava a fala, Lula enfatizou a necessidade de negociações de paz para encerrar o confronto, que já dura mais de um ano.

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“Ao abordar a guerra entre Ucrânia e Rússia, é crucial evitar uma escalada e iniciar negociações de paz”, declarou o líder brasileiro. Embora tenha dado mais ênfase ao conflito no Oriente Médio, com duras críticas às ações de Israel na Faixa de Gaza, Lula também reforçou sua posição de mediador no cenário internacional, pedindo que os países do Brics atuem em conjunto para promover a paz global.

Putin elogia proposta de Brasil e China

Na semana anterior à cúpula, Putin havia demonstrado apoio à iniciativa conjunta de Brasil e China de mediar o conflito entre Moscou e Kiev. O líder russo considerou a proposta “uma boa base”, mas lamentou que o governo ucraniano, liderado por Volodymyr Zelensky, não esteja interessado em negociar no momento.

A proposta mencionada por Putin foi anunciada em maio pelos governos de Lula e Xi Jinping e prevê a criação de um grupo de países neutros para facilitar as negociações de paz. Um dos principais pontos seria a convocação de uma conferência mundial com a participação de ucranianos e russos, algo que, até agora, não foi concretizado. Putin ressaltou que nem Rússia nem Ucrânia foram consultadas previamente sobre o projeto, o que, segundo ele, demonstra a independência da proposta de Brasil e China.

Críticas de Zelensky à postura brasileira

A relação entre Brasil e Ucrânia tem sido marcada por tensões desde o início da guerra. Em agosto, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, criticou Lula por, segundo ele, adotar “narrativas da União Soviética” ao discutir o conflito. Durante entrevista ao jornal O Globo, Zelensky afirmou que a proposta de paz brasileira, ao lado da China, seria apenas uma “declaração política” sem efeito prático.

Zelensky também destacou o contraste entre o Brasil, uma democracia consolidada, e países como Irã e Coreia do Norte, que também se posicionaram como mediadores no conflito, questionando o alinhamento do Brasil com essas nações. Apesar das críticas, o líder ucraniano expressou gratidão pelo diálogo que manteve com Lula em 2023 e afirmou estar disposto a apresentar um novo plano de paz.

Lula critica “apartheid” no acesso à tecnologia e vacinas

Além de tratar dos conflitos geopolíticos, Lula aproveitou o discurso na cúpula do Brics para criticar o que chamou de “apartheid” no acesso a vacinas e no desenvolvimento de novas tecnologias, como a Inteligência Artificial (IA). “Não podemos aceitar a imposição de ‘apartheids’ no acesso a vacinas e medicamentos, como ocorreu na pandemia, nem no desenvolvimento da Inteligência Artificial, que caminha para tornar-se privilégio de poucos”, declarou.

O presidente brasileiro também responsabilizou os países ricos pela crise climática, afirmando que eles têm a maior parcela de culpa pelo aquecimento global devido ao histórico de emissões de gases poluentes. No entanto, Lula ressaltou que os países emergentes, como os integrantes do Brics, também precisam fazer sua parte para enfrentar o problema.

“Queremos reafirmar a vocação do bloco na luta por um mundo multipolar e por relações menos assimétricas entre os países”, concluiu, reforçando o papel do Brics como um contraponto ao poder das nações mais ricas.

Com veto do Brasil, Venezuela fica fora de lista dos Brics

A Venezuela e a Nicarágua foram excluídas de uma lista prévia que define os países candidatos ao status de parceiros dos Brics, grupo formado pelas principais economias emergentes do mundo.

Segundo apurações dos canais CNN Globo News, a cúpula do grupo atendeu ao pedido do governo brasileiro para impedir a entrada dos latino-americanos na aliança.

Apenas 13 países são considerados para participar do bloco na nova categoria de “Estados-parceiros”. Entre eles, estão Cuba e Bolívia. A lista final ainda será definida em encontro da 16ª cúpula do Brics que acontece em Kazan, na Rússia, até o dia 24 de outubro.

Brasil rejeitou adesão da Venezuela

A pressão do Itamaraty acontece em meio ao estremecimento de relações entre o Planalto e os dois países.

Em 7 de agosto, a Nicarágua expulsou o embaixador brasileiro em Manágua após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentar mediar e apaziguar a ofensiva do regime de Daniel Ortega contra a Igreja Católica no país. O Brasil fez o mesmo com o embaixador nicaraguense um dia depois.

Já a proximidade de Lula com o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, se deteriorou após o resultado contestado das eleições venezuelanas. Lula, antes aliado de Maduro, sugeriu, ao lado de Estados Unidos e Colômbia, a realização de novas eleições no país e pediu a apresentação das atas eleitorais, o que o governo chavista rechaçou.

Em entrevista à CNN, o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, disse não concordar com a adesão venezuelana à aliança, mesmo como status de país parceiro. “Eu não defendo a entrada da Venezuela. Acho que tem que ir devagar. Não adianta encher de países, senão daqui a pouco cria um novo G-77”, disse.

Também à CNN, diplomatas brasileiros afirmaram que o Brasil usou o argumento de que a escolha dos futuros países-parceiros dos Brics deveria partir de um consenso, o que elimina a possibilidade de entrada da Venezuela e da Nicarágua.

Maduro pressiona por adesão

A posição do Itamaraty, porém, vai na contramão do governo chavista, que solicitou formalmente acesso ao grupo em agosto de 2023.

Já nesta terça-feira, o presidente venezuelano desembarcou em Kazan para participar como observador da cúpula do grupo, em uma visita que não era esperada pela cúpula. Até segunda-feira, a Venezuela era representada por sua vice-presidente, Delcy Rodríguez.

Ao desembarcar na Rússia, Maduro disse que o Brics se tornou “o epicentro do novo mundo multipolar, da nova geopolítica, da diplomacia da paz”.

Também defendeu que os membros estabeleçam “a possibilidade de acesso a outra economia, que não seja administrada com base em sanções e chantagens”, em referência às medidas coercitivas impostas por Washington ao seu governo.

Ele deve se reunir ainda hoje com o presidente russo, Vladimir Putin, e sua presença foi percebida como uma tentativa de pressionar pela entrada da Venezuela no bloco.

Brics busca expansão

O Brics, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, ganhou novos Estados-membros no início do ano – Egito, Irã, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, esse ainda em processo de adesão. A Argentina também foi convidada, mas o presidente Javier Milei declinou a oferta.

Agora, a cúpula que se reúne nesta semana em Kazan decide sobre a criação da categoria de Estados-parceiros, que reúne nações interessadas em acompanhar e referendar as discussões dos países-membros.

A estratégia de expansão da aliança tem sido tomada como prioridade da política externa russa, que, assim como a Venezuela, busca rechaçar seu isolamento do sistema internacional e contornar sanções impostas a ela.

Putin quer, por exemplo, usar o bloco para apresentar uma alternativa ao dólar como moeda internacional. A cúpula debate ainda a criação de um sistema de pagamento liderado pelo Brics para rivalizar com o Swift, um sistema de transferências internacionais da qual os bancos russos foram cortados em 2022, após a invasão da Ucrânia.

Segundo Putin, ao menos 30 países se candidataram para entrar na aliança, entre eles, Venezuela e Nicarágua. A lista extra-oficial que circula em Kazan, porém, inclui apenas 13 nações que estão sendo consideradas para inaugurar a categoria de parceiros dos Brics: Argélia, Belarus, Bolívia, Cuba, Indonésia, Cazaquistão, Malásia, Nigéria, Tailândia, Turquia, Uganda, Uzbequistão e Vietnã. A lista foi definida nesta terça-feira (22/10) pelos atuais membros e ainda pode passar por um novo filtro.

As nações do Brics representam pouco menos da metade da população mundial e cerca de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) global.

Lula ausente devido a acidente

Embora fosse esperado na Rússia para participar presencialmente da cúpula, Lula precisou cancelar sua viagem após sofrer um acidente doméstico. O presidente caiu no banheiro e cortou a cabeça, o que o impediu de viajar por recomendação médica. Apesar da ausência física, o líder brasileiro participou de toda a agenda do evento por videoconferência.

A cúpula do Brics reuniu, além de Putin e Lula, líderes de outros países emergentes, como o presidente chinês Xi Jinping e o presidente iraniano, Masoud Pezeshkian. O bloco, que busca um maior equilíbrio nas relações internacionais, tem se posicionado como uma alternativa ao predomínio das nações ocidentais em questões políticas, econômicas e tecnológicas.


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