12/10/2024 - Edição 550

Mundo

Após apagar Gaza do mapa, Israel expande sua guerra de extermínio no Líbano

Governo enviará avião para repatriar brasileiros que estão em território libanês

Publicado em 01/10/2024 10:22 - Jamil Chade (UOL), Agência Brasil – Edição Semana On

Divulgação Hassan Ammar - AP

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A guerra já é regional. Um ano depois dos ataques do Hamas contra Israel e da operação devastadora de Benjamin Netanyahu contra Gaza, é impossível – e irresponsável – continuar a nutrir a narrativa de que a diplomacia vem atuando nos bastidores para conter o conflito.

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O primeiro-ministro de Israel terminou seu discurso na última sexta-feira na sede da ONU, em Nova York, e ordenou um ataque a um grupo inimigo em um outro país. Impossível imaginar que tal operação tenha ocorrido sem uma chancela, ainda que discreta, dos EUA.

Uma vez mais, como tem feito ao longo de meses, o governo norte-americano apelou para que o conflito “não saia do controle” e pediu moderação às partes. Não foi a primeira vez. Há poucos meses, ouvi essa frase aqui nos EUA: “Até agora, não há um conflito regional mais amplo”, afirmou o porta-voz do Pentágono, Pat Ryder.

Mas nos corredores da ONU, essa narrativa é recebida com ironia e até acusações. Diplomatas do mundo árabe alertam que a pressão para se evitar uma escalada do conflito vale para todos. Menos para Israel, que mantém sua ofensiva para redesenhar o mapa do Oriente Médio, enquanto recebe armas e é blindado pelo veto americano no Conselho de Segurança.

Depois de borrar cidades inteiras do mapa e deixar quase 2 milhões de pessoas desalojadas em Gaza, Israel atacou Teerã, Beirute e continuou a lançar mísseis sobre a Síria. A partir do Iêmen, milícias disparam seus foguetes em direção às cidades israelenses, enquanto o Hezbollah e o Hamas mantêm seus ataques, muitas vezes indiscriminados, contra civis.

Há poucos meses, quando Israel atacou o Irã e o regime teocrático ensaiou um resposta com mais de uma centena de mísseis e drones, o governo americano estabeleceu em silêncio uma rede de aliados. Ela incluiu baterias de mísseis instaladas em Iraque, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, Qatar, Arábia Saudita, Jordânia e Israel.

Quatro navios americanos desempenharam um papel central para impedir ataques do Irã, atuando tanto no Mar Vermelho como no Golfo de Aden. Esses mesmos navios passaram pelo Omã, Arábia Saudita e Djibuti.

Em Gaza, os deslocados chegam a 1,8 milhão de palestinos. No Líbano, mais 1 milhão. Depois de fugir de sua própria guerra, 100 mil sírios deixaram o Líbano nos últimos dias, voltando a seu país. Fogem de guerra em guerra.

Como continuar, portanto, a falar que um conflito regional está sendo evitado?

No mundo árabe, o assassinato de Ismail Haniyeh chacoalhou as lógicas de poder. Nesta semana, observadores ainda destacaram como, para o mundo árabe, a morte de Hassan Nasrallah poderia ser comparada à derrota do egípcio Gamal Abdel Nasser, em 1967.

Não foram apenas americanos e israelenses que comemoraram sua morte. Em certos rincões da Síria, o assassinato foi motivo de festa. Para a resistência síria, o Hezbollah foi chave para garantir a permanência do ditador Bashar Al Assad no poder.

Com um poder militar dos mais sofisticados, com a decisão política de não parar mais nas fronteiras, com o apoio implícito e cínico dos EUA e com o reconhecimento do colapso do sistema internacional, Israel sabe que poucos hoje terão como frear sua ambição.

Ameaçado e acuado, Teerã observa como sua estratégia de criar um eixo de defesa desmonta a olhos nu.

A guerra já não é mais um cálculo apenas de israelenses ou do Hamas. Talvez nunca tenha sido. A guerra não está nas ruas destruídas de Gaza. Nem nas periferias de Beirute. Estamos diante de uma guerra regional, com consequências imprevisíveis.

Governo enviará avião para repatriar brasileiros que estão no Líbano

Um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) irá buscar brasileiros que estão no Líbano nos próximos dias. Segundo comunicado do Ministério das Relações Exteriores, a determinação para repatriar os brasileiros é do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A região sofre com os contínuos ataques aéreos israelenses contra áreas civis em Beirute, no Sul do Líbano e no Vale do Beqaa.

A operação, coordenada pelo Itamaraty e pelo Ministério da Defesa, terá a data anunciada nos próximos dias, após análise das condições de segurança para o voo. O planejamento inicial da FAB prevê a decolagem do aeroporto de Beirute, que se encontra aberto.

“A Embaixada no Líbano está tomando as providências necessárias para viabilizar a operação, em contato permanente com a comunidade brasileira e em estreita coordenação com as autoridades locais”, diz a nota do Itamaraty.

Na semana passada, os bombardeios israelenses no Líbano causaram a morte de dois adolescentes brasileiros. A maior comunidade de brasileiros no Oriente Médio atualmente está no Líbano. Ao todo, 21 mil brasileiros vivem no país.

Satélites mostram que Gaza foi ‘apagada’ do mapa em um ano

Praticamente um ano depois da eclosão do conflito entre o Hamas e Israel, um levantamento realizado pela ONU usando satélites revela uma destruição generalizada de Gaza, a aniquilação de 90% dos ativos agrícolas, a queda de 81% no PIB do local e o fechamento de oito de cada dez empresas.

“A velocidade e a escala da matança e da destruição em Gaza são diferentes de tudo o que aconteceu em meus anos como secretário-geral”, afirmou António Guterres, chefe da ONU há uma década. Mais de 40 mil pessoas morreram, enquanto outros 100 mil foram feridos.

Os informes estão sendo publicados enquanto o mundo caminha para marcar um ano dos ataques do Hamas de 7 de outubro e que deram início a uma operação sem precedentes por parte de Israel.

No total, 66% de edifícios foram danificados na Faixa de Gaza e representam um total de 163.778 estruturas. “Isso inclui 52.564 estruturas que foram destruídas, 18.913 gravemente danificadas, 35.591 estruturas possivelmente danificadas e 56.710 moderadamente afetadas”, indicou o informe da ONU. A análise tem como base as imagens de satélite de altíssima resolução coletadas em 3 e 6 de setembro de 2024.

A região mais afetada em geral é a província de Gaza, com 46.370 estruturas afetadas. A Cidade de Gaza foi notavelmente afetada, com 36.611 estruturas destruídas.

O Centro de Satélites das Nações Unidas (Unosat), em colaboração com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), também divulgou dados que revelam a destruição no campo.

“Aproximadamente 68% dos campos de cultivo permanentes na Faixa de Gaza apresentaram um declínio significativo em termos de saúde e densidade em setembro de 2024”, afirmou.

“As análises baseadas em imagens de satélite realizadas pela Unosat documentam a destruição generalizada e destacam a necessidade de apoio da população afetada”, alertou o informe.

Nikhil Seth, diretor executivo do departamento da ONU, destaca que as imagens apresentam “análises objetivas” e “têm sido vitais para os esforços de resposta humanitária e para melhorar a compreensão da comunidade global sobre o impacto do conflito na infraestrutura civil.

Contração da economia em 81%

De acordo com a ONU, a destruição não é só física. O impacto combinado da operação militar em Gaza e suas repercussões na Cisjordânia provocaram um “choque sem paralelo” sobre a economia palestina.

“No início de 2024, entre 80% e 96% dos ativos agrícolas de Gaza – incluindo sistemas de irrigação, fazendas de gado, pomares, maquinário e instalações de armazenamento – haviam sido dizimados, prejudicando a capacidade de produção de alimentos da região e piorando os já altos níveis de insegurança alimentar”, alertou a entidade.

A destruição também atingiu duramente o setor privado, com 82% das empresas danificadas ou destruídas. “Os danos à base produtiva continuaram a se agravar à medida que a operação militar persiste”, diz.

Como resultado, o Produto Interno Bruto (PIB) de Gaza despencou 81% no último trimestre de 2023, levando a uma contração de 22% em todo o ano.

Em meados de 2024, a economia de Gaza havia encolhido para menos de um sexto de seu nível de 2022.


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