Judiciário

República dos Juízes: os novos intocáveis

Série documental foca o nascedouro de nomes hoje famosos como Joaquim Barbosa, Rodrigo Janot, Deltan Dallagnol e Sérgio Moro

Publicado em 25/08/2022 12:57 - Matheus Trunk - Ponte

Divulgação Reprodução

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Eles se tornaram protagonistas depois da Constituição de 1988. Viraram uma espécie de quarto poder da República. Não derrubam os poderosos por armas ou batalhas, mas com canetadas, sentenças e articulações com o Ministério Público. Aproveitam-se do descrédito do Estado, dos partidos políticos e conseguem o protagonismo nos meios de comunicação. Vivem sendo um poder que sufoca os outros poderes. Uma autoridade que amordaça as demais autoridades.

Eles são o poder Judiciário, de onde emergiram nomes hoje famosos como Joaquim Barbosa, Rodrigo Janot, Deltan Dallagnol e Sérgio Moro. Esse é o foco da série documental de não-ficção República dos Juízes, que estreou na quarta-feira (24) no canal Cinebrasil TV e no streaming Claro tv+ (antigo NOW).

Extremamente bem-produzida, a série tem uma linguagem toda própria, não acadêmica e muitas vezes não linear. É uma espécie de “documentário de invenção” que mescla os depoimentos de entrevistados com imagens de arquivo, debates eleitorais, programas antigos de televisão, cinejornais e até mesmo filmes mudos. Os poucos depoentes são especialistas em Direito e cientistas políticos que apresentam uma visão crítica sobre esse momento.

Um aspecto que chama a atenção é a trilha sonora composta e executada por Mari Herzer, entregando uma atmosfera de desolação aos espectadores. Outro destaque é a dinâmica montagem, que consegue ter ritmo certeiro e seco para cada episódio apresentado. “Cada vez mais as relações de poder resultam em relações de opressão”, diz um dos entrevistados sem nenhuma cerimônia.

República dos Juízes é composto por cinco episódios de 26 minutos que abordam uma diferente faceta do poder Judiciário do Brasil de hoje. “Poder” é o primeiro episódio, “Controle” o segundo, “Vaidade” o terceiro, “Abuso” o quarto e “Corrosão” o quinto. Idealizada pelo professor Jean-Claude Bernardet, a série é dirigida e produzida pelo cineasta Eugênio Puppo, tendo co-direção dos realizadores Cédric Fanti e Hugo Leonardo.

A Nova República e a Constituição de 1988 dão um novo fôlego para o Judiciário, mas os magistrados ficaram um tanto decepcionados com esta Carta Magna. Ela preocupava-se mais com os direitos dos cidadãos e não deram tanto poder quanto os juízes esperavam. Esses assuntos são abordados nos dois primeiros episódios da série. A virada no mundo Judiciário acontece pelo ano 2000. Existia toda uma demanda jurisdicional e a tentativa de uma centralização administrativa dentro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Já em 2010, o descrédito com os políticos e as instituições organizadas causa uma aposta no judiciarismo como a saída para o Brasil. Eles são vistos como órgãos autônomos e neutros que não precisam de controle. “Parece que quando alguém vira promotor público ele ganha asas”, destaca um dos entrevistados.

O Judiciário ganha novos poderes com a TV Justiça, mostra o terceiro episódio. O circo midiático acaba influenciando a opinião pública. Certos nomes tornam-se conhecidos pelo público em geral. Já o quarto capítulo analisa como o sistema de justiça pode servir como anteparo para regimes totalitários. O foco é o papel duplo da chamada Lei de Anistia, promulgada no final da ditadura militar em 1979. A lei serviu tanto para interromper as perseguições impostas no momento autoritário como para anistiar os torturadores.

“Esse é o nosso problema: uma tradição pouco democrática com instituições pouco democráticas. (…) Não existe nenhuma visão das Forças Armadas no Pós-Guerra Fria”, dispara um dos entrevistados. Já o último episódio vai analisar de maneira mais detalhada o atual momento da Lava Jato e seu papel na política brasileira contemporânea. “A Lava Jato acha que é a Revolução de 1930, ela é liberal, mas tem um trading conservador que iria aparecer mais cedo ou mais tarde.”

República dos Juízes acaba sendo um documento histórico valoroso que revela os meandros e os empoderamentos do meio judicial. É bom ser visto diversas vezes. Eugênio Puppo e sua equipe conseguiram realizar bom trabalho documental utilizando uma linguagem não convencional, que pode ser que não agrade todas as plateias, mas mesmo assim trata-se de uma série valorosa que joga luz sobre esse verdadeiro quarto poder da República.

Série República dos Juízes
Direção: Eugênio Puppo, co-direção Cédric Fanti e Hugo Leonardo
Brasil, 2022
Duração: cinco episódios de 26 minutos
Onde ver: Cinebrasil TV e Claro tv+


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