13/10/2024 - Edição 550

Brasil

Lideranças temem ação orquestrada contra terras indígenas

Publicado em 17/01/2019 12:00 -

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No caminho entre a cidade e uma das aldeias dentro da Terra Indígena Uru-eu-wau-wau, em Rondônia, um acampamento clandestino está em construção. Mais de 40 pessoas invadiram o terreno nos últimos dias, derrubaram árvores na área protegida e repetem aos indígenas: "Não vamos tirar o pé daqui", conta Awapu Uru-eu-wau-wau.

Uma das lideranças indígenas locais, Awapu chegou nesta segunda-feira (14/01) a Porto Velho, capital do estado, para buscar ajuda. "Os invasores dizem que o novo presidente ganhou e que agora está tudo liberado", disse à DW Brasil.

"Eles dizem que não veremos mais árvores em pé, que vão plantar soja e capim", complementou. Segundo ele, o desmatamento em curso desde a semana passada é um dos maiores já vistos no local. 

Questionado, o Ministério da Agricultura – que passou a ser responsável pela demarcação de terras indígenas após a chegada de Jair Bolsonaro à Presidência – respondeu que "não se implantou nenhuma 'nova política de demarcação'".

"O uso de terra indígena para atividades comerciais por terceiros, mesmo em parceria, é hoje proibido. Até eventuais iniciativas econômicas da União, previstas na Constituição, dependem de regulamentação no Congresso. A questão excede, portanto, a competência da Funai e do Ministério da Agricultura", diz a resposta enviada por e-mail.

Para Sonia Guajajara, presidente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a invasão na Terra Indígena Uru-eu-wau-wau faz parte de uma ação orquestrada – e crescente – em todo o país.

"Está acontecendo de forma articulada e orientada pelos invasores, que estão ligados aos grandes produtores rurais e à especulação imobiliária", disse à DW Brasil.

Desde o início do ano, foram registradas invasões na Terra Indígena Arara, no Pará, e um ataque a tiros contra os guarani mbya, da comunidade Ponta do Arado, em Porto Alegre (RS).

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que também acompanha o cenário, manifestou preocupação em relação ao ataque. "Segundo o cacique (dos guarani mbya), os agressores afirmaram que, com o novo governo, eles têm agora poder de polícia para defender as propriedades. Há um estímulo no âmbito da política para que esse tipo de ação se desenvolva", comentou Roberto Liebgott, do Cimi na região sul do país.

No Maranhão, invasores expulsos da Terra Indígena Awá-Guajá numa grande ação comandada por órgãos federais em 2014 se organizam para voltar às terras indígenas. Uma carta direcionada às famílias "atingidas pela Funai" circulou amplamente por São João do Caru como convite para um encontro, que aconteceu domingo passado.

"Por enquanto, estamos sem ter com quem conversar no governo", comenta Sonia Guajajara sobre a ausência de diálogo com a Fundação Nacional do Indio (Funai). "O órgão criado para cuidar das causas indígenas perdeu completamente a autonomia. Esse governo quer destruir os direitos dos povos indígenas", diz.

Desde que Bolsonaro assumiu, a Funai não tem se manifestado publicamente sobre os últimos conflitos. O Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Humanos, ao qual a Funai deve ser vinculada após decreto presidencial, informou à DW Brasil que o órgão "ainda está na estrutura do Ministério da Justiça".

Para o Ministério da Justiça, por outro lado, o órgão já não está mais sob a pasta: "A Funai faz parte, agora, do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos", respondeu a assessoria de comunicação ao questionamento da DW Brasil.

Enquanto isso, em Rondônia, Awapu teme um embate. "Está muito perigoso para os moradores da aldeia mais próxima de onde os grileiros invadiram."

Com mais de 1 milhão de hectares, a Terra Indígena Uru-eu-wau-wau foi reconhecida oficialmente em 1991 e segue sendo a maior área de Floresta Amazônica preservada que restou no estado. No local, ainda há povos indígenas que escolheram viver em isolamento.

Segundo Awapu, invasões do território sempre existiram. "São grileiros, madeireiros, garimpeiros… Mas desta vez está diferente. A invasão é mais organizada e maior", relata.

"Viemos à cidade pedir ajuda para Funai, Ibama, Ministério Público. Acreditamos que a lei para os indígenas ainda existe. E nós ainda estamos aqui", afirmou.


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