05/05/2024 - Edição 540

Poder

A Polícia Federal está pronta para prender Bolsonaro

Até gente do PL quer isso: e não é difícil entender o motivo

Publicado em 13/03/2024 9:38 - Ricardo Noblat (Metrópoles), Juliana Dal Piva e Karla Gamba (ICL Notícias), João Filho (Intercept_Brasil) – Edição Semana On

Divulgação Reprodução

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A Polícia Federal se deu mais 60 dias para concluir o inquérito sobre as tentativas de golpe contra a democracia comandadas por Bolsonaro depois que ele não conseguiu se reeleger.

Sem contar outras, também abortadas por falta de apoio suficiente, ele tentou mais duas vezes. A primeira em dezembro, a segunda em 8 de janeiro, por meio de seguidores.

No caso da última, Bolsonaro sempre poderá dizer que estava fora do país quando ela aconteceu – em Orlando, nos Estados Unidos, torcendo para que a Festa da Selma desse certo.

Selma, não Selva. Selva é uma saudação militar. Selma, o nome da operação tramada para depor Lula, que dias antes tomara posse. Militares da ativa assistiram inertes a tudo.

Os golpistas, depois de invadirem a Praça dos Três Poderes, caminharam de volta ao acampamento montado à porta do QG do Exército, e ali foram de novo bem acolhidos.

A Polícia Militar foi ao QG com a missão de prendê-los. O comandante do Exército movimentou tanques para impedir. A prisão só foi possível no dia seguinte. É o que sabemos.

Mas a Polícia Federal sabe muito mais. E com o tanto que já sabe, pelas provas e evidências que recolheu até agora, sente-se pronta e à vontade para prender o ex-presidente.

Para isso, está no aguardo de uma ordem da Justiça – leia-se: Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do inquérito que corre por lá há muitos anos.

Moraes parece não ter pressa. Como a jiboia, ele mata por constrição, que quer dizer aperto, estreitamento. Enrola-se na presa, quebra-lhe os ossos e a mata aos pouquinhos.

Jiboias não apresentam glândulas de veneno, nem dentes inoculadores. Não são, portanto, cobras venenosas. Moraes têm glândulas e dentes inoculadores, mas prefere não usá-los.

Foi o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordem do presidente da República, quem escancarou de vez a porta da prisão para que por ela possa entrar Bolsonaro, seu ex-chefe.

Fê-lo para salvar seu pai, o general Mauro Cesar Lourena Cid, que vendeu e recomprou joias roubadas por Bolsonaro do acervo de presentes recebidos pelo Estado brasileiro.

Salvando o pai, Mauro Cid também salvaria da curiosidade geral os negócios da sua família feitos nos Estados Unidos e, ao que tudo indica, não declarados aqui à Receita Federal.

Mauro Cid já depôs à Polícia Federal sete vezes desde que foi preso, em 3 de maio do ano passado. Nas três primeiras, calou-se. Nas seguintes, cantou como um canário campeão.

No total, cantou durante 33 horas para cumprir sua parte na delação premiada sancionada por Moraes. O depoimento mais longo que prestou, de 12 horas, ocorreu em 31 de agosto.

Dada à falta de pressa de Moraes, típico das jiboias, Mauro Cid poderá voltar a depor. É muita história para contar – golpe, roubo de joias, certidão de vacina falsificada…

Diz Bolsonaro que pedirá de volta seu passaporte apreendido por Moraes para viajar a Israel a convite do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. O pedido não será atendido.

Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, que cada vez mais se espelha em Bolsonaro, disse que também foi convidado por Netanyahu a visitar Israel.

Foi desmentido pelo embaixador de Israel no Brasil. O convite partiu de uma mesquita montada por brasileiros em Tel Aviv. Mas nada impede que Netanyahu esteja por trás do convite.

Seria para provocar Lula. Netanyahu não o perdoa por comparar o massacre dos palestinos na Faixa de Gaza com o massacre dos judeus na Alemanha nazista.

Após ouvir Cid, PF não vê necessidade de acareação com Freire Gomes

Depois do depoimento de Mauro Cid, a Polícia Federal decidiu que não irá fazer acareação entre ele e o ex-comandante do Exército, general Freire Gomes, na investigação que apura a tentativa de golpe de Estado após as eleições em 2022.

Na avaliação de fontes próximas da investigação, o último depoimento do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro foi “satisfatório”. Uma dessas fontes afirmou à coluna que ficou “nas entrelinhas” que os esclarecimentos prestados batem com as informações levadas pelo general Freire Gomes, ex-comandante do Exército.

A princípio, a PF tinha intenção de dividir o tempo da oitiva e marcar outra data caso fosse necessário. No entanto, a decisão de seguir o depoimento de uma só vez foi do próprio Cid e de sua defesa.

Um dos presentes definiu o depoimento como “longo, sofrido e desgastante”. Ainda segundo relatos, Cid demonstrou cansaço em alguns momentos, mas manteve o que já havia acordado, inclusive com sua defesa, de prestar todos os esclarecimentos necessários em um só dia.

Mauro Cid foi interrogado sobre diversos assuntos e investigações que têm o ex-presidente Jair Bolsonaro como alvo. De reuniões entre a cúpula do antigo governo e outros investigados, minuta golpista, ao caso que apura inserção de dados falsos no sistema do Ministério da Saúde para a fabricação de certificados de vacinação. Ele também respondeu perguntas referentes à investigação das joias, recebidas como presentes pessoais por Jair e Michelle Bolsonaro. Neste caso, o Tribunal de Contas da União (TCU) já decidiu que os itens não se enquadram como de “uso personalíssimo” e, portanto, devem ser devolvidos à União.

Até gente do PL quer Bolsonaro preso. E não é difícil entender o motivo

O PL não é apenas o maior e mais forte partido dentro do Congresso. É também o partido oficial da conspiração golpista que tomou conta do país nos últimos anos.

Além de abrigar Jair Bolsonaro, líder máximo do golpismo,  e sua tropa de choque, a legenda, liderada pelo seu presidente, foi colocada na linha de frente dos ataques às urnas eletrônicas — as mesmas que lhe garantiram a maior bancada parlamentar. Segundo a Polícia Federal, Valdemar Costa Neto usou a estrutura do PL para planejar um golpe de estado e financiar uma auditoria fake para descredibilizar as urnas eletrônicas. Isso significa que o partido usou grana do fundo partidário — leia-se verbas públicas — para financiar o golpismo no Brasil.

Golpistas do PL foram presos ou estão desfilando por aí com tornozeleiras eletrônicas. A legenda do golpe está encalacrada, com vários outros integrantes fazendo fila para ir para a cadeia, mas continua muito forte politicamente. Nesta semana, o partido conseguiu o comando de duas importantes comissões na Câmara: Caroline de Toni, do PL de Santa Catarina, na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, além  de Nikolas Ferreira, do PL  de Minas Gerais, na Comissão de Educação. São nomes que não estiveram envolvidos diretamente na organização da tentativa de golpe, mas foram grandes entusiastas do golpismo. A escolha de duas figuras histriônicas e completamente despreparadas para esses cargos mostram que o PL continua desprezando a democracia.

Apesar de ser o mais forte no jogo de correlação de forças do parlamento, o partido encontra-se numa sinuca de bico jurídica. Inevitavelmente mais correligionários serão presos e a sigla corre risco de ter o registro partidário cassado. Sem ter nada de concreto para apresentar ao país além da gritaria moralista dos extremistas, o PL usará a narrativa da perseguição como o grande trunfo nas próximas eleições. Manter-se forte eleitoralmente e se apegar à popularidade do bolsonarismo é o que sobrou para o partido que está sendo arrastado pela Polícia Federal e pela justiça brasileira. E isso não é pouca coisa.

Façamos aqui um breve resumo da trajetória do PL. Fundado em 1985, durante a redemocratização, o partido serviu de abrigo para os políticos que sustentaram o regime militar. Demonstrou-se uma legenda pragmática e com ânsia pelo governismo, tendo integrado a base de governo de todos os últimos presidentes da República. Com a ascensão do bolsonarismo, o PL deixou de ser um nanico sanguessuga para se tornar o partido que dá as cartas no Congresso. Incentivado por Bolsonaro, o PL encampou uma aventura golpista e, agora, encurralado pela polícia e pela justiça, vê suas lideranças sendo punidas e transforma isso em trunfo eleitoral. Esse é o histórico de um partido que se diz vítima de uma perseguição do “sistema”.

Encantado pela força demonstrada pelo bolsonarismo na avenida Paulista no domingo retrasado, o PL apostará todas as suas fichas em novas manifestações que serão mobilizadas por Bolsonaro. A narrativa fantasiosa de que existe uma perseguição contra Bolsonaro e sua turma já demonstrou ser capaz de engajar muita gente. Rio de Janeiro e Belo Horizonte provavelmente serão as próximas escolhidas como palco para a micareta golpista travestida de ato pela anistia. O objetivo, ainda que não declarado, é óbvio: intimidar o STF mostrando que segue com apoio de parte significativa da população, mobilizar a militância bolsonarista para o ano eleitoral e impulsionar seus candidatos. Assim, caso o partido não seja punido com a cassação, ele se manterá forte no jogo político-eleitoral e soberano no Congresso.

O caráter eleitoral dessas manifestações será velado para não configurar campanha antecipada. É bom que o TSE fique atento, pois o PL de Valdemar já demonstrou não ter qualquer pudor em desrespeitar leis. É evidente que os atos servirão de palanque para os candidatos apoiados pelo partido, como ficou claro na Avenida Paulista. Nada mais nada menos que 20 pré-candidatos a prefeituras e atuais prefeitos estiveram presentes na manifestação.

O ato no Rio de Janeiro, por exemplo, servirá para alavancar a candidatura do deputado e ex-chefe da Abin, o Delegado Ramagem para a prefeitura carioca. O fato dele ser alvo de investigação da PF por espionagem ilegal na Abin não é um problema. Muito pelo contrário, para o PL isso não só não atrapalha como será o seu principal apelo eleitoral. O candidato se venderá como um dos heróis perseguidos pelo “sistema”. A vitimização será a principal plataforma eleitoral do PL. E, como se vê pelas ruas e pelas pesquisas, há grandes chances de dar certo. Cerca de 40% dos brasileiros acreditam que Bolsonaro está sendo perseguido. Ele, Valdemar e seus comparsas de golpe seguirão agarrados nesse delírio coletivo para se manterem vivos.

É deprimente a constatação elementar de que uma possível prisão de Bolsonaro antes das eleições impulsionará ainda mais os candidatos do PL. Na cadeia, ele virará mártir e se tornará um cabo eleitoral ainda mais forte. Não é exagerado supor que há candidatos do PL torcendo para que a prisão ocorra antes da eleição. Nós sabemos como funcionam as mentes golpistas.


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Uma resposta para “A Polícia Federal está pronta para prender Bolsonaro”

  1. Ricardo de oliveira piranha disse:

    As imagens do dia 08/fala tudo quem está por de trás de tudo e o pt

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