19/05/2024 - Edição 540

Palavra do Editor

Estamos criando monstros

Publicado em 24/09/2014 12:00 -

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"Não volto mais para a sala de aula. Antes que a situação piore e a minha saúde fique mais abalada eu prefiro abandonar a profissão”. O depoimento é de uma professora de 39 anos, agredida a socos e pontapés por um aluno de 13 anos dentro da Escola Estadual Zulmira Campos, em Santos (SP).

Em Franco da Rocha (SP), uma professora quase ficou cega depois de ser agredida por um aluno. A confusão começou durante um apagão na escola. Os alunos cortaram a energia elétrica para fazer arrastões nas salas de aula. Maria de Fátima Costa dos Santos foi agredida por um aluno que arremessou uma lixeira no rosto dela. “Dá medo”, afirma.

Estes são apenas dois dos inú­meros de casos de agres­sões contra pro­fes­sores que ocorrem dentro das salas de aula de es­co­lhas pú­blica e, também, par­ti­cu­lares do país. Casos como esses causam es­panto e co­moção so­cial, es­tampam por algum tempo as man­chetes po­li­ciais, mas logo caem no es­que­ci­mento. Ou­tros, se­quer chegam a co­nhe­ci­mento pú­blico: são aba­fados para pre­servar a boa imagem ins­ti­tu­ci­onal das escolas e das secretarias de educação.

Apesar de não haver es­ta­tís­ticas na­ci­o­nais sobre a vi­o­lência contra pro­fes­sores nas es­colas, al­guns sin­di­catos es­ta­duais já fi­zeram le­van­ta­mentos que ajudam a co­nhecer me­lhor a si­tu­ação.

Não são ne­ces­sá­rias pes­quisas para atestar que a falta de li­mites e de au­to­ri­dade na re­lação entre pais e fi­lhos está no cerne deste fenô­meno.

Pes­quisa re­a­li­zada em 2007 pelo Sin­di­cato dos Pro­fes­sores do En­sino Ofi­cial do Es­tado de São Paulo (Apoesp) com 684 pro­fes­sores fi­li­ados mos­trou que 93,3% dos casos de vi­o­lência no am­bi­ente es­colar são pra­ti­cados por alunos. Entre os en­tre­vis­tados, 56% ad­mi­tiram co­nhecer casos de pes­soas ar­madas dentro da es­cola, e 77% ti­nham co­nhe­ci­mento de con­sumo de drogas no am­bi­ente es­colar.

Outra pes­quisa, ela­bo­rada pelo Sin­di­cato dos pro­fes­sores de Minas Ge­rais (Sinpro-Minas) ra­ti­ficou o di­fícil co­ti­diano dos edu­ca­dores: 20% dos en­tre­vis­tados já pre­sen­ci­aram si­tu­a­ções de trá­fico de drogas na es­cola, 62% so­freram algum tipo de agressão verbal. O es­tudo mos­trou que 39% dos pro­fes­sores vi­veram si­tu­a­ções de in­ti­mi­dação e 35%, de ameaça. 

Na ten­ta­tiva de punir a agres­si­vi­dade dos alunos, o Pro­jeto de Lei 267/11, em análise na Câmara federal, prevê pu­nição para es­tu­dantes que des­res­pei­tarem pro­fes­sores ou vi­o­lem re­gras éticas e de com­por­ta­mento de ins­ti­tui­ções de en­sino.

Re­lator do pro­jeto, o de­pu­tado Luiz Hen­rique Man­detta (DEM-MS), des­tacou que a vi­o­lência contra pro­fes­sores do en­sino médio e fun­da­mental é uma das causas da falta de qua­li­dade da edu­cação bra­si­leira. “Pro­fes­sores têm medo de so­frer vi­o­lência ou re­pre­sá­lias ver­bais e fí­sicas, prin­ci­pal­mente por parte de alunos”, afirmou.

Esta crise sem pre­ce­dentes tem um mo­tivo claro. Não são ne­ces­sá­rias pes­quisas para atestar que a falta de li­mites e de au­to­ri­dade na re­lação entre pais e fi­lhos está no cerne deste fenô­meno. Es­tamos cri­ando mons­tros.


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