Palavra do Editor
Publicado em 08/01/2015 12:00 -
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Não é aceitável que grupos sociais, políticos, raciais ou religiosos ditem os limites da liberdade de expressão. Ela é a base da democracia e suas fronteiras devem ser delimitadas apenas pela justiça.
Os atentados dos últimos dias na França, especialmente a execução de membros da equipe do semanário satírico Charlie Hebdo, em Paris, que causou a morte de 12 pessoas, feriu outras tantas e revoltou o mundo foi mais uma tentativa de inverter esta lógica que é pedra angular das sociedades ocidentais.
Versões fundamentalistas do pensamento religioso costumam, historicamente, levar à violência. A Igreja Católica contribuiu com seu quinhão durante centenas de anos, nas cruzadas, na inquisição. Há pouco mais de meio século o sionismo tem usado a fé judaica para esmagar populações inteiras condenando-as ao ostracismo social. Nos últimos 20 anos, no entanto, é o fundamentalismo islâmico quem tem centralizado a barbárie de cunho religioso.
Não há justificativa para o massacre de inocentes, embora algumas cabeças iluminadas – imersas na escuridão das disputas políticas que cegam e desnorteiam a razão – tenham procurado, nos últimos dias, lançar sobre as vítimas do massacre em Paris a culpa por suas execuções. Os argumentos são os mais variados.
O sangue dos inocentes assassinados em Paris está nas mãos de todos aqueles que relativizam a liberdade de expressão e justificam o fundamentalismo religioso.
Há quem justifique a brutalidade cometida contra a equipe do Charlie Hebdo argumentando que o jornal desrespeitou o islamismo, passou dos limites… É mais ou menos como justificar o estupro apontando o tamanho da saia da vítima.
Isso já não importa. O massacre na 11° arrondissement de Paris inverte a questão. Ela já não é mais sobre os limites da arte ou da liberdade de expressão, mas sobre se estamos ou não dispostos a pagar o preço por ela. Os integrantes do Charlie Hebdo pagaram este preço, fizeram seu trabalho ao espicaçar as instituições em meio a críticas de colegas e ameaças de morte. Honraram o adágio de Orwell: Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Todo o resto sé publicidade.
O preço desta ousadia ficou claro. No entanto, ficou claro também que a liberdade de expressão não pode ser mensurada pela régua do terror.
Outros argumentos são calcados no medo da xenofobia e na islamofobia que assola a Europa. É uma falácia. Da mesma forma que não se pode classificar como anti-semita aquele que critica o sionismo, não é inteligente classificar como islamofóbico aquele que condena o terrorismo do fundamentalismo islâmico.
Falar, neste momento, sobre a extrema direita europeia, xenofobia e islamofobia é uma ofensa contra os mortos desta semana e suas famílias. É uma agressão à liberdade de expressão. Estes males que insistem ressurgir em nossa época não podem ser usados para justificar o injustificável.
O sangue dos inocentes assassinados em Paris está nas mãos de todos aqueles que relativizam a liberdade de expressão e justificam o fundamentalismo religioso.
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