08/05/2024 - Edição 540

True Colors

O que diz nova lei de autodeterminação de gênero da Alemanha

Legislação simplifica mudança de nome e sexo no registro civil. Qualquer pessoa maior de idade poderá solicitar as alterações, sem necessidade de laudos ou decisão judicial

Publicado em 25/08/2023 3:42 - Alexandre Schossler – DW

Divulgação Marcelo Camargo - Abr

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O governo da Alemanha aprovou na quarta-feira (23) o projeto da chamada Lei de Autodeterminação de Gênero, que permitirá a uma pessoa modificar seu nome e seu sexo no registro civil com uma simples declaração de vontade.

Após a aprovação do projeto no Bundestag (Parlamento), onde a coalizão formada por social-democratas, verdes e liberais tem maioria, não será mais necessário um laudo pericial, como era exigido até agora.

O projeto é voltado para pessoas transexuais, intersexuais e não binárias. Segundo o projeto, transexuais são pessoas que não se identificam com o sexo com o qual foram registradas no nascimento. Intersexuais são pessoas que tem características físicas que as impedem de serem claramente identificadas como “(apenas) masculinas ou (apenas) femininas”. Não binário é uma autodesignação para pessoas que não se identificam nem como homens nem como mulheres, segundo a proposta.

Como era

Pela lei vigente, de 1980, quem deseja alterar o sexo registrado deve apresentar dois laudos psicológicos diferentes e aguardar decisão judicial.

Muitas pessoas trans já reclamaram que esse processo é burocrático, oneroso e também discriminatório, por incluir perguntas de caráter íntimo.

O Tribunal Federal Constitucional (suprema corte alemã) já havia determinado que vários trechos da lei de 1980 eram inconstitucionais.

Como fica

De acordo com o projeto de lei, qualquer cidadão maior de idade pode dirigir-se a um cartório do registro civil e solicitar a alteração. Há tempo para reflexão, pois só depois de três meses é que a mudança passa a valer. O registro poderá ser novamente alterado após um ano.

Os menores de idade poderão modificar o sexo registrado com o consentimento dos pais a partir dos 14 anos, enquanto abaixo dessa idade serão os pais que poderão fazer a alteração se a considerarem conveniente.

A reforma também previne que o sexo anterior de uma pessoa seja revelado contra a vontade dela, sob pena de multa. No entanto, o governo diz que há exceções para impedir que a lei seja usada por pessoas que querem escapar de processos criminais alterando seu nome e sexo.

Reações

“A Lei Fundamental (Constituição alemã) garante o livre desenvolvimento da personalidade e o respeito à identidade de gênero”, afirmou ministra da Família, Lisa Paus, do Partido Verde, ressaltando que se trata de um “grande momento” para as pessoas transexuais e intersexuais na Alemanha.

A partir de agora, as pessoas transexuais poderão fazer com que seus documentos reflitam sua identidade de gênero “com um trâmite simples” e “sem processos complicados”, declarou a parlamentar verde Nyke Slawik, uma das primeiras integrantes transexuais do Parlamento alemão, em entrevista à emissora Phoenix.

“Cada um tem o direito de ter sua identidade de gênero respeitada pelo Estado”, afirmou o ministro da Justiça, Marco Buschmann, do Partido Liberal. “A lei atual discrimina pessoas transgênero. Queremos acabar com essa situação indigna.”

Também o Comitê Central dos Católicos Alemães (ZdK), principal instância representativa dos católicos leigos na Alemanha, saudou o projeto, afirmando que se trata de um “bom dia para a autodeterminação e a dignidade humana”.

A oposição criticou o projeto. Segundo o deputado democrata-cristão Günter Krings, é uma mudança “muito abrangente” e é “problemático” que o sexo registrado possa ser modificado continuamente.

A lei “não faz justiça à importância do gênero no nosso sistema jurídico”, frisou Krings, que é porta-voz para questões jurídicas do grupo parlamentar dos partidos conservadores CDU e CSU, de oposição.

A feminista alemã Alice Schwartzer, de 80 anos, é uma das principais críticas da nova lei. Ela disse numa entrevista à revista Der Spiegel que teme que a lei incentive os jovens a mudar de gênero só porque “está na moda”.

De forma mais geral, movimentos feministas argumentaram com o risco de que homens potencialmente abusivos possam fazer mau uso das novas regras para obter acesso a espaços reservados às mulheres, como saunas ou mesmo abrigos para vítimas de violência doméstica.

Buschmann declarou que esses locais continuam estabelecendo suas regras de acesso. Paus lembrou que a autodeterminação já existe em outros países sem que haja indícios de abusos desse tipo.

A encarregada de antidiscriminação do governo federal, Ferda Ataman, disse que esse debate é irracional. “A maior parte das saunas na Alemanha é mista. Nenhum homem na Alemanha precisa mudar seu registro de sexo para ver uma mulher pelada”, declarou.

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Equipe Semana On

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