Saúde
Publicado em 28/06/2017 12:00 -
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Então presidente em exercício – devido a viagem de Michel Temer à Rússia – o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) sancionou no último dia 23 a lei que libera produção, comercialização e consumo de inibidores de apetite feitos a partir das substâncias anfepramona, femproporex e mazindol. Derivados das anfetaminas, esses anorexígenos foram usados por décadas no país – até a proibição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária(Anvisa) em 2011.
A decisão gerou uma guerra de forças entre Anvisa, Congresso e representantes de entidades médicas. Na época da proibição, a Agência alegou que não havia comprovação suficiente de eficácia e que os riscos à saúde eram maiores que os possíveis benefícios.
A liberação dividiu especialistas. Para médicos que atuam na área de obesidade, o retorno dos inibidores de apetite pode aumentar as possibilidades de tratamento.
Hoje, o país tem quatro opções de medicamentos para controle da obesidade: sibutramina, orlistat (Xenical), liraglutida (Saxenda) e cloridrato de lorcasserina (Belviq).
Segundo Durval Ribas Filho, presidente da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia), o problema é que nem todos os pacientes respondem a eles ou têm como custeá-los –o Saxenda custa em torno de R$ 900 ao mês.
"Por serem mais baratos, eram opção para a população de baixa renda, na qual a obesidade predomina", diz. Segundo ele, os três anorexígenos diferem da sibutramina. "A sibutramina [R$ 30 a caixa] tem um efeito sacietógeno, enquanto os anorexígenos agem no hipotálamo e têm como função diminuir a fome. Não interferem na saciedade."
Para a endocrinologista Maria Edna de Melo, presidente da Abeso (Associação Brasileira de Estudos da Obesidade), há uma "estigmatização" do tratamento da obesidade, e nem todos os pacientes conseguem emagrecer com exercícios físicos e dieta, por exemplo. "Todo mundo fala: é só fechar a boca. Não é. Se fosse só isso, não teríamos essa epidemia mundial de obesidade."
Já para Francisco Paumgarten, professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, a liberação por meio do Congresso é "lamentável" e fere a autonomia da Anvisa, responsável por regular o mercado de medicamentos.
Segundo ele, que estuda o tema, a eficácia desses medicamentos é "questionável". "Muitos pacientes não respondem a esses medicamentos. E mesmo os que perdem peso, quando suspendem o uso, ganham de novo."
Ele cita um estudo com a sibutramina feito com 10 mil pacientes que detectou um aumento do risco de infarto entre aqueles que utilizavam a substância."Os riscos são maiores do que os benefícios", diz ele, que também cita como efeitos colaterais o risco de dependência, aumento da hipertensão arterial e problemas psiquiátricos.
Já para Melo, da Abeso, o fato de inibidores de apetite como o anfepramona, femproporex e mazindol terem ficado disponíveis no mercado por décadas mostra que eles são seguros. "Os problemas foram a má prática e abuso das prescrições, com doses elevadas", diz ela, para quem casos como esses podem ser evitados com maior fiscalização da Anvisa e dos conselhos de medicina.
A Anvisa recomendou que o projeto seja vetado. "A decisão permite que as substâncias em questão sejam manipuladas mesmo sem a devida comprovação de segurança e eficácia, caracterizando-se como risco para a saúde da população", informa.
Cenário Incerto
O prazo para retorno desses medicamentos é incerto. Representantes da indústria dizem que é pouco provável que haja interesse em fabricar os medicamentos, já que ainda são necessários estudos clínicos para comprovar a segurança e eficácia, que têm alto custo –sem a certeza de resultados superiores a outros medicamentos. "Vai facilitar que sejam manipulados nas farmácias, sem o mesmo rigor da indústria", diz Nelson Mussolini, presidente-executivo do Sindusfarma, que reúne as maiores farmacêuticas do país.
Um ano antes da proibição, as farmácias de manipulação já respondiam por 60% das 4,4 milhões de prescrições dessas substâncias e da sibutramina.
Questionada, a Anfarmag (Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais) informa que ainda não é possível saber "quais os desdobramentos práticos" ao setor caso o projeto seja sancionado. "Qualquer que seja a decisão, o setor continuará a cumprir de forma estrita as exigências legais, sempre com foco na promoção da saúde", diz, em nota.
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