07/07/2024 - Edição 550

Campo Grande

Tribunal retoma julgamento sobre anulação da concessão do Consórcio Guaicurus em Campo Grande

Relator defendeu manutenção do contrato, mas desembargadora solicitou mais tempo para análise

Publicado em 04/07/2024 9:16 - Semana On

Divulgação

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A Justiça retoma nesta quinta-feira (4) o julgamento que pode anular o contrato milionário do Consórcio Guaicurus com o município de Campo Grande. A sessão foi retomada pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) após a desembargadora Jaceguara Dantas da Silva pedir vista no último dia 20 de junho.

Na sessão anterior, o relator, desembargador Alexandre Raslan, negou os recursos e manteve a sentença que não anulou o contrato das empresas de transporte coletivo. Em 17 de julho de 2023, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa julgou improcedente os pedidos do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) contra o Consórcio Guaicurus.

O contrato, avaliado em bilhões, foi questionado pela 30ª Promotoria da Comarca de Campo Grande em uma ação civil pública que aponta indícios de corrupção e incapacidade das empresas de ônibus em prestar um serviço adequado. O promotor Fábio Ianni Goldfinger destacou que, mesmo após vencer o processo licitatório de 2012, o Consórcio não conseguiu satisfazer a população e que o processo licitatório apresenta indícios de corrupção desde antes de seu lançamento.

“O Consórcio Guaicurus venceu a Concorrência nº 082/2012 porque sua vitória já havia sido ajustada, com pagamentos ao escritório de Sacha Reck e Guilherme Gonçalves para garantir seu êxito na licitação fraudulenta”, afirmou o promotor em sua manifestação.

Durante a defesa da anulação do contrato, o promotor destacou problemas de atrasos nos serviços, obrigando cidadãos a utilizar carros particulares para chegar aos seus destinos. Segundo a licitação, o Consórcio deve faturar cerca de R$ 3,4 bilhões durante os 20 anos de contrato.

Na fase de audiência, o MPMS dispensou o depoimento do delator, advogado Sacha Breckenfeld Reck, que forneceu informações cruciais para a instauração do processo. Embora Reck tenha sido condenado por fraude no processo de concessão do transporte público no Distrito Federal, ele foi dispensado como testemunha de acusação no caso de Campo Grande, o que causou estranheza e foi comemorado pela defesa do Consórcio Guaicurus.

Em delação premiada ao Ministério Público do Paraná (MPPR), Reck revelou como a licitação foi direcionada para o Consórcio Guaicurus. Ele informou ao MPMS que a gestão municipal de Campo Grande exigiu a participação de mais de uma empresa no certame. Reck intermediou para que uma empresa do Paraná participasse como figurante.

Na delação, Reck afirmou que a prefeitura de Campo Grande exigiu a inclusão de uma segunda empresa no certame para dar impressão de regularidade ao edital. “A prefeitura queria que tivessem duas empresas, no mínimo. Não sei quem da prefeitura, mas não dava para ser só o Consórcio participando da licitação”, afirmou Reck. Ele alertou que isso poderia causar problemas, mas não identificou de quem partiu a ordem.

A situação foi considerada um pedido despropositado e sem lógica, segundo Reck. “Os políticos têm na cabeça que um consórcio só é monopólio e três não, pensam que participar três, quatro ou cinco empresas é atestado de regularidade, e não é isso”, completou o advogado.

Irregularidades apontadas pelo MPMS na concessão do transporte

No processo, o MPMS elencou uma série de irregularidades identificadas durante a investigação e que, na visão da 30ª Promotoria de Justiça de Campo Grande, são suficientes para anulação do contrato.

– apresentação de garantia de proposta das empresas concorrentes antes da sessão pública de abertura dos envelopes com as propostas;

– determinação do município de que empresa vencedora pagasse R$ 5,5 milhões ao município em 180 dias;

– ausência de justificativa técnica da empresa vencedora sobre exigências de frota e serviço;

– modelo da licitação no formato melhor técnica e preço que reduziu a competitividade do certame;

– ausência de parecer técnico que justificasse a composição do valor da outorga estabelecido em 70% “técnica” e 30% “preço”;

– irregularidade do município em cobrar R$ 3 mil das empresas concorrentes para retirar cópia de documentação física referente ao edital de concorrência.

Todas as irregularidades apresentadas pelo MPMS são, ao longo dos anos, rebatidas tanto pela prefeitura de Campo Grande quanto pelo Consórcio Guaicurus. Atualmente, o processo possui 17,1 mil páginas.

“Após a audiência, o MP terá o prazo de 30 dias para apresentar as alegações finais, assim como as outras partes, para, em seguida, ser proferida a sentença”, afirmou o Ministério. A assessoria do juiz que conduziu as oitivas afirmou que o processo segue para alegações finais.

A Licitação

O processo licitatório foi concluído em outubro de 2012, com a declaração das empresas Viação Cidade Morena, São Francisco, Jaguar Transportes Urbanos e Viação Campo Grande — que formaram o Consórcio Guaicurus — como vencedoras. O grupo apresentou uma proposta de R$ 20 milhões. A licitação foi encerrada pouco mais de dois meses antes do fim do mandato do então prefeito de Campo Grande, Nelsinho Trad, atual senador. Trad foi uma das testemunhas do Consórcio, que garantiu ao grupo o direito de faturar até R$ 3,4 bilhões explorando o transporte da cidade por 20 anos.

O contrato de concessão, assinado em 25 de outubro de 2012, teve como signatários o então prefeito Nelson Trad, o diretor da Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito), Rudel Trindade, o então diretor da Agereg (Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos), Marcelo Luiz Bonfim do Amaral, e Nelson Guenshi Asato, empresário representante das quatro empresas que formam o Consórcio.


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