Poder
Publicado em 08/04/2022 12:00 -
Clique aqui e contribua para um jornalismo livre e financiado pelos seus próprios leitores.
Gravações obtidas pelo jornal Folha de S.Paulo a partir de escutas telefônicas realizadas pela Polícia Civil do Rio de Janeiro mostram a irmã do miliciano e ex-policial militar Adriano da Nóbrega afirmando que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) ofereceu cargos comissionados no Palácio do Planalto pela morte do ex-capitão.
Em conversa grampeada pela polícia, Daniela fala com uma tia e diz que o irmão era considerado "arquivo morto". As escutas fazem parte da investigação da Operação Gárgula, que apura o esquema de lavagem de dinheiro e da estrutura para fuga de Adriano, morto na Bahia em fevereiro de 2020.
"Ele já sabia da ordem que saiu para que ele fosse um arquivo morto. Ele já era um arquivo morto. Já tinham dado cargos comissionados no Planalto pela vida dele, já. Fizeram uma reunião com o nome do Adriano no Planalto. Entendeu, tia? Ele já sabia disso, já. Foi um complô mesmo", disse Daniela em gravação autorizada pela Justiça.
Adriano comandava o "Escritório do Crime", maior grupo miliciano do Rio de Janeiro, é apontado como um dos mentores da morte da vereadora Marielle Franco (Psol), é citado no caso das "rachadinhas" de salários de funcionários do gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro (Republicanos) e chegou a ser condecorado pelo filho de Bolsonaro com a Medalha de Tiradentes, da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
Na conversa, Daniela reforça as suspeitas da família do ex-PM sobre "queima de arquivo". Ela conta que o irmão pensou em se entregar à polícia, mas que também já suspeitava que seria morto. Desde a morte de Adriano pairam dúvidas sobre o suposto confronto que teria havido entre ele e os policiais que o capturaram.
Daniela também negou que o irmão fosse miliciano, ela afirma que ele era bicheiro. Ela também diz à tia que o responsável por ordenar aos policiais que Adriano fosse morto foi o então governador Wilson Witzel (PSC), e não de Jair Bolsonaro. Na época da morte de Adriano, Bolsonaro disse que o ex-capitão era um "herói da Polícia Militar" e que foi ele próprio quem orientou Flávio a homenagear o miliciano.
Na época em que exerceu mandatos como deputado estadual na Alerj, logo depois da homenagem com a Medalha Tiradentes, Flávio empregou em seu gabinete tanto a mãe quanto uma das irmãs de Adriano da Nóbrega.
Em outra conversa gravada no âmbito da operação da Polícia Civil, o sargento da PM Luiz Carlos Felipe Martins, conhecido como Orelha e apontado como braço direito de Adriano da Nóbrega, comenta em conversa telefônica com uma pessoa não identificada sobre a proximidade do miliciano com Jair Bolsonaro.
"Ele [Adriano] falava para mim: 'Orelha, nunca vi isso. Estamos se fudendo por ser amigo do presidente da República. Porra, todo mundo queria uma porra dessa. Sou amigo do presidente da República e tô me fudendo'. Morreu por causa disso" , diz Orelha na gravação.
O Palácio do Planalto não se pronunciou a respeito do teor das conversas que fazem parte da investigação da Polícia Civil.
URGENTE! BOLSONARO SE ENTREGA EM ATO FALHO! O próprio Bolsonaro se colocou na cena do crime. Eu não relacionei os áudios sobre o assassinato do PM Adriano Nóbrega com a Marielle. Mas peixe morre pela boca, né? O capitão engoliu a chumbada! pic.twitter.com/4p388R00ed
— Orlando Silva (@orlandosilva) April 8, 2022
Em "ato falho", Bolsonaro liga morte de Adriano a Marielle
O presidente Jair Bolsonaro (PL) cometeu um "ato falho" ao comentar os desdobramentos do caso do miliciano Adriano da Nóbrega durante transmissão nas redes sociais, na noite de quinta-feira (7).
Mesmo sem a comprovação das autoridades de que os dois crimes estão relacionados, Bolsonaro citou o caso de Marielle Franco, vereadora assassinada no Rio de Janeiro, em 2018.
Durante o comentário sobre o assunto, o presidente surpreendeu ao trazer o caso de Marielle à mesa e aproveitou para dizer que não tinha “motivo nenhum” para ser acusado como mandante do crime.
“Alguém me aponte um motivo que eu poderia ter para matar Marielle Franco. Motivo nenhum, zero, não dá nem para discutir mais. Os áudios dela, pelo que tomei conhecimento, ela se equivocou: em vez de falar Palácio das Laranjeiras, falou Palácio do Planalto”, declarou.
Ao se referir à irmã de Adriano da Nóbrega, Daniele da Nóbrega, Bolsonaro disse: “Nunca conversei com ela, pelo que eu lembre.”
O presidente ainda criticou uma publicação no Twitter do deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que chamou a família Bolsonaro de "mafiosa". "É público que o miliciano tinha relações íntimas com a família Bolsonaro e a hipótese de queima de arquivo sempre esteve à mesa", escreveu Orlando.
Depois do "ato falho" de Bolsonaro, Orlando Silva disse que o presidente "se entregou" ao fazer relação entre os dois casos.
"O próprio Bolsonaro se colocou na cena do crime. Eu não relacionei os áudios sobre o assassinato do PM Adriano Nóbrega com a Marielle. Mas peixe morre pela boca, né? O capitão engoliu a chumbada", disse Orlando Silva.
Deixe um comentário