18/05/2024 - Edição 540

Poder

Com graça a Silveira, Bolsonaro atinge 1.175 casos de assédio institucional

Publicado em 02/05/2022 12:00 -

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Na sua política de destruição institucional, o presidente Jair Bolsonaro bate recordes seguidos de uma recente forma de assédio. Trata-se do assédio institucional, que pode ser entendido como uma estratégia deliberada de enfraquecimento de políticas públicas construídas desde a redemocratização de 1985.

O livro "Assédio Institucional no Brasil: Avanço do Autoritarismo e Desconstrução do Estado" será lançado na terça-feira que vem na Câmara dos Deputados, em Brasília. O assediômetro contabiliza 1.175 casos no governo Bolsonaro, incluída a graça concedida por Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), parlamentar condenado pelo Supremo Tribunal Federal a oito anos e nove meses de prisão por crimes contra a democracia.

O livro foi organizado por José Celso Cardoso Jr., presidente da Afipea (Associação dos Funcionários do Ipea, o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada, uma fundação vinculada ao Ministério da Economia).

Esse tipo de assédio não é novo no poder público. Surgiu no impeachment de Dilma Rousseff (golpe parlamentar), mas ganhou impulso com Bolsonaro devido à estratégia de destruição das políticas públicas. O assédio institucional é uma prática que vai além do assédio moral e individual. Ele atinge as instituições do estado.

Exemplos: o desmonte da fiscalização ambiental no Ibama e no ICMBio, corte no orçamento do IBGE, flexibilização da legislação sobre terras públicas (o que facilita invasões), paralisação de políticas culturais (caso Ancine) e os projetos para permitir garimpo e exploração agrícola em reservas indígenas.

Assista acima à entrevista concedida por José Celso Cardoso Jr. ao "UOL News" na noite desta quinta-feira, na qual ele diz que o assédio institucional é um "método" do governo Bolsonaro.

Deputado vai de malfeitor a popstar da Câmara

Em menos de uma semana, Daniel Silveira migrou da condição de ameaça à democracia para a de popstar do Legislativo. Com a pena de quase nove anos de cadeia perdoada por Bolsonaro, o deputado foi escolhido como membro de cinco comissões na Câmara. Entre elas a de Constituição e Justiça. O problema não é que os deputados qualificam um malfeitor. A questão é que o destaque concedido a Daniel Silveira desqualifica o Legislativo.

Além da vaga na CCJ, o colegiado mais importante da Câmara, Daniel Silveira foi acomodado por seu partido, o PTB de Roberto Jefferson, em outras quatro comissões: Cultura, Educação, Esporte e Segurança Pública. Nessa última, o absurdo ganhou uma dose de escárnio, pois Silveira foi eleito vice-presidente da comissão.

Tanta coisa já aconteceu com Daniel Silveira que as pessoas esquecem quem é o personagem. Trata-se de um ex-PM. Passou seis anos na corporação. Puxou 26 dias de xadrez. Colecionou 14 repreensões e duas advertências. Antes de entrar para a polícia, trabalhou como cobrador de ônibus. Valia-se de atestados médicos falsos para faltar ao serviço. Foi eleito na aba do bolsonarismo depois de destruir uma placa com o nome da vereadora assassinada Marielle Franco.

Uma democracia em que um sujeito como Daniel Silveira é prestigiado no Parlamento é um regime com a cabeça a prêmio.

Bolsonaro é denunciado na ONU por indulto

A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) apresentou uma denúncia ao relator da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Independência do Judiciário, Diego Garcia-Sayan, contra o presidente Jair Bolsonaro. O motivo é o indulto concedido pelo chefe de estado ao deputado federal Daniel Silveira.

Para a entidade, trata-se de uma "usurpação de poderes" por parte do presidente e uma ação que viola a independência do Judiciário. Na carta preparada pelo advogado Carlos Nicodemos, solicita-se que o relator da ONU conceda uma reunião para que a ABI apresente ao representante "as ameaças à democracia e independência do Judiciário" no Brasil.

O documento ainda pede que o relator acompanhe o caso do deputado Daniel Silveira e que o mecanismo da ONU se posicione diante das violações.

Conforme o UOL revelou na semana passada, a decisão de conceder o instituto da graça ao deputado federal reforçou a preocupação internacional em relação à democracia brasileira. Os questionamentos do chefe de estado contra o Poder Judiciário estão no radar das organizações internacionais como um dos principais aspectos da ameaça autoritária que paira sobre o Brasil em 2022.

Ainda no ano passado, às vésperas da comemoração de 7 de setembro, o Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos afirmou estar preocupado com as ameaças dirigidas contra o Supremo Tribunal Federal e informou que estava "acompanhando de perto" a situação do país diante da convocação de atos.

De acordo com a entidade, seu Escritório Regional para a América do Sul "reitera a importância de proteger o direito à liberdade de reunião pacífica, bem como suas preocupações com casos de discurso de ódio contra povos indígenas e ameaças contra instituições como o Supremo Tribunal Federal".

Não é a primeira vez que o relator da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre Independência do Judiciário, Diego Garcia-Sayan, tem de lidar com casos relacionados com Bolsonaro.

Em 2020, ele enviou uma carta ao governo brasileiro cobrando explicações sobre operações contra advogados, questionando abertamente a imparcialidade de Marcelo Bretas e cita proximidade do juiz com Jair Bolsonaro.

No documento, o relator também lembrou ao Brasil que "é imperativo que juízes sejam imparciais, e notou as supostas conexões do Juiz Bretas com as autoridades políticas, incluindo o Presidente Jair Bolsonaro".

"Em 17 de setembro, o Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu por esmagadora maioria – por votação a 12 contra 1 – que o apoio aberto demonstrado pelo juiz ao Presidente do Brasil era incompatível com suas obrigações profissionais. A Ordem dos Advogados do Brasil havia iniciado um processo disciplinar contra o juiz em relação a seus vínculos com o presidente", indicou comunicado da ONU.

Um ano antes, o foco era o então ministro da Justiça, Sérgio Moro. García-Sayán alertou que a informação publicada (sobre as mensagens dos bastidores da Operação Lava Jato "questionaria um elemento absolutamente essencial nos processos judiciais em geral, e nos processos penais de envergadura em particular, que são os princípios de integridade e de neutralidade nas decisões judiciais".

"Existem disposições claras nas leis internas em vários países, e o Brasil não é exceção, onde a função da procuradoria tem que ser independente e diferente da função dos juízes. Cada qual deve se desenvolver dentro de seu próprio", completou.


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