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STF, PF e Anatel sofrem ataque cibernético
Publicado em 04/09/2024 10:40 - Mônica Bergamo e Michele Oliveira (Folha de SP), Tales Farias (UOL), DW, Jessé Souza (ICL Notícias) – Edição Semana On
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Senadores e deputados seguiram postando mensagens no X mesmo depois da suspensão da plataforma no Brasil e da determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) de multar aqueles que tentem burlar o bloqueio. O acesso ao X está bloqueado desde o sábado (31).
Pelo menos oito senadores fizeram postagens desde a suspensão, efetivada no domingo (1o): Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Eduardo Girão (Novo-CE), Sergio Moro (União-PR), Rogério Marinho (PL-RN), Marcos do Val (Podemos-ES), Jorge Seif (PL-SC), Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e Paulo Paim (PT-RS).
A assessoria de Paim afirma que abrirá um Boletim de Ocorrência na polícia, já que a mensagem não teria sido postada por seu gabinete. “Decisão do STF não se discute, se cumpre”, afirma.
Os demais senadores, de oposição ao governo, postaram mensagens questionando a decisão do ministro Alexandre de Moraes e explicitaram que usavam a plataforma apesar da proibição do Supremo.
No domingo (1º), Flávio Bolsonaro escreveu que Alexandre de Moraes é “o grande câncer da democracia brasileira”. E convocou seus seguidores para os atos de 7 de Setembro organizados para defender o impeachment do magistrado.
Ele escreveu que a mobilização é necessária para que a corregedoria do Senado “funcione”, dando andamento ao pedido que visa tirar Moraes da Corte.
“Todos os 81 senadores e os 11 ministros do STF sabem que existem infinitos motivos para fazer o impeachment de Alexandre de Moraes. Ele é o grande câncer da democracia brasileira e o STF não pode mais continuar dando suporte a seus delírios vingativos! Todas as suas decisões são publicamente ilegais”, afirmou.
Flávio também escreveu mensagens em inglês –em uma delas, pedia para que as pessoas assinassem um manifesto pelo impeachment de Moraes.
O senador Sergio Moro seguiu postando no X para se comunicar “com os paranaenses e com a comunidade internacional”. Mas teve o cuidado de afirmar que não estava acessando a plataforma a partir do Brasil. E sim pedindo a um “amigo nos US [Estados Unidos] para postar a partir de lá na minha rede”.
“Se a imprensa pode usar correspondentes [internacionais que acessam o X e divulgam conteúdos das publicações], eu posso usar meus amigos no exterior”, afirmou ele na segunda (2).
Moro escreveu ainda que é senador da República e que, de acordo com a Constituição Federal “em pleno vigor”, tem “imunidade material por opiniões, palavras e votos”.
“Se entenderem que [a Constituição] foi revogada ou suspensa, que me avisem primeiro. Continuarei, assim, postando minhas opiniões, inclusive as críticas, como sempre sem ofensas pessoais, nessa rede que constitui um importante instrumento do mandato e meio de comunicação com os paranaenses e com a comunidade internacional”.
Seguidores o criticaram: “Falou o frouxo que passou três dias consultando todos os assessores, advogados, amigos e aspones para poder fazer um post numa rede social, e além de frouxo é cara de pau para esfregar na cara do cidadão comum as regalias do seu cargo pago com nosso dinheiro”, afirmou um deles. “Cara, como você é fraco e covarde, pqp”, disse outro.
O senador Rogério Marinho, que está licenciado, também seguiu ativo no X. E usou a plataforma para convocar as pessoas para os atos de 7 de Setembro que vão pedir o impeachment e até a prisão de Alexandre de Moraes.
Na segunda (2), ele retuitou uma reportagem sobre o decreto de prisão do ex-candidato à Presidência da Venezuela, Edmundo González, e afirmou: “O que está em jogo é a nossa liberdade, o que acontece na Venezuela poderá acontecer no Brasil se não defendermos o nosso direito de sermos livres. Dia 7 de Setembro todos nas ruas em defesa da Constituição e contra abusos”.
O senador Marcos do Val também seguiu postando, inclusive em inglês.
Do Val é um dos pivôs da disputa entre Elon Musk e o STF. O bilionário desobedeceu a ordem judicial para retirar o perfil do parlamentar do ar.
O senador é investigado por supostamente integrar uma organização criminosa que tenta coagir e ameaçar delgados federais que atuam na investigação sobre as milícias digitais no Brasil.
Já o senador Jorge Seif Junior retuitou uma postagem do PT para mostrar que o partido também seguia atuante na plataforma, apesar da suspensão determinada por Alexandre de Moraes. “Olha que fofo! PT segue normalmente no X… Viva la libertad, CARAJO!”, escreveu ele.
Em outras postagens, o parlamentar publicou frases atribuídas a Franklin D. Roosevelt, John F. Kennedy e Thomas Jefferson sobre liberdade.
O PT afirma que a postagem já estava agendada, e que não foi possível desprogramá-la já que o acesso à plataforma foi bloqueado. Novas postagens estão suspensas.
O senador Eduardo Girão escreveu em seu perfil que Moraes “deixou 22 milhões de brasileiros órfãos do X por interesses próprios… não ficará assim”. E retuitou outras lideranças que seguem usando a rede, como o deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS).
Na mensagem compartilhada por Girão, Hattem informa que a ação de seu partido no STF pedindo a reversão da suspensão do X “caiu para [o ministro Kassio] Nunes Marques decidir. Cabe a ele agora dar a liminar para suspender a censura!”.
Outros parlamentares também seguem fazendo publicações. Eduardo Bolsonaro (PL-SP), em português e em inglês, fez um longo texto para convocar manifestantes para os atos de 7 de Setembro. “Se estou fazendo este post, assumindo todos os riscos, é porque acredito que vale a pena lutar pela nossa liberdade e a de nossos filhos”, disse. E deixou claro: “Estou postando no X, escrevendo do Brasil”.
Mesmo tom de Carla Zambelli (PL-SP). “Postando aqui, direto do X”, para anunciar a própria presença no ato do próximo sábado em São Paulo.
O deputado bolsonarista Nikolas Ferreira (PL-MG) também faz postagens bilíngues. Em uma delas, se dirigiu em inglês a Kamala Harris, que concorre à Presidência dos EUA, questionando o que a candidata pensa da “ditadura no Brasil”. Kamala ainda não respondeu.
Em português, Nikolas chamou o ministro do STF de “Mimado de Moraes” e disse que não migrará para outras plataformas. “X é meu país”, afirmou.
Em nota, Flávio Bolsonaro disse que não é “parte no processo conduzido e manipulado ilegalmente por Alexandre de Moraes”.
“Não fui citado para apresentar minha possível defesa e não tomei ciência de nenhuma decisão me obrigando a não fazer algo. Que eu saiba, a imprensa ainda não virou Diário Oficial e tenho imunidade parlamentar por minhas opiniões, palavras e votos, inclusive em minhas redes sociais, pois são extensão do meu mandato. Alexandre de Moraes tem a obrigação de seguir as leis brasileiras para tomar suas decisões e nenhum brasileiro é obrigado a seguir decisões tomadas com base nas leis alexandrinas, pois o Congresso Nacional não as aprovou e não foram sancionadas pelo Presidente da República”, afirmou o senador.
O gabinete Paim disse que o X apenas foi usado “quando ele estava desbloqueado”. “O gabinete do senador Paulo Paim recebeu com surpresa a notícia. A mensagem citada foi postada apenas no Threads e no BlueSky. Será registrada uma ocorrência policial. Decisão do STF não se discute, se cumpre.”
STF, PF e Anatel sofrem ataque cibernético
A Polícia Federal (PF), o STF e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) foram alvo de ataques cibernéticos que geraram instabilidade em seus sistemas nos últimos dias.
A ação dos hackers ocorreu após a publicação de decisões do ministro do STF Alexandre de Moraes contra a operação da rede social X no Brasil. Segundo a Anatel, que é responsável por regular o setor de telecomunicações no país, os ataques eram “esperados”.
A agência afirmou que é alvo frequente de ações deste tipo, especialmente em circunstâncias que “envolvem temas sensíveis”. A Anatel detectou tentativas de derrubar seu sistema operacional na sexta-feira (30/09), quando o antigo Twitter começava a ser suspenso no país após ordem de Moraes.
“Após a decisão do STF de bloquear o X, a Agência observou um aumento esperado nesses ataques, o que ocasionou instabilidades momentâneas em seus sistemas e redes”, escreveu. “Em resposta, a equipe de TI da Anatel agiu de forma contínua para mitigar os impactos e garantir a segurança das operações.”
Já os sistemas do STF foram alvo na última quinta-feira de um ataque chamado de DDoS, quando um site é sobrecarregado com milhares de acessos simultâneos e não consegue operar. Um dia antes, Moraes havia dado 24 horas para o X indicar um representante no Brasil, sob pena de suspensão da plataforma.
A Corte afirmou que seus sistemas ficaram inoperantes por 10 minutos, mas que não houve prejuízo operacional. “A equipe técnica do tribunal agiu rapidamente, retirando os serviços do ar e implantando novas camadas de segurança, de modo que todos os acessos foram normalizados”, disse, em nota.
No caso da PF, a corporação investiga um ataque cibernético que gerou instabilidade em seus sistemas nesta terça-feira. “O acesso aos serviços já foi restabelecido e não foi detectado comprometimento aos sistemas e acessos a dados da instituição”, afirmou.
A disputa entre o dono do X, Elon Musk, e o ministro Alexandre de Moraes ganha cada vez mais fôlego. Na terça-feira, a empresa de internet via satélite de Musk, Starlink, recuou e decidiu cumprir a ordem do magistrado de bloquear o acesso à plataforma X no país.
Elon Musk e o imperialismo sem vergonha
Poucos percebem, mas a dominação mundial de alguns países sobre outros — ou simplesmente do Norte global sobre o Sul do planeta — não é só algo “econômico”, consubstanciado em trocas desiguais de produtos manufaturados com alto valor agregado e a condenação do Sul global a exportar matéria-prima. Além da dimensão econômica, ou melhor, para que a própria espoliação econômica possa acontecer, há que se convencer o oprimido, no caso os povos oprimidos, que eles são inferiores.
Precisa haver, portanto, uma dominação simbólica, ou seja, um amálgama de valores e de ideias, que convença os oprimidos que eles são mais feios, menos inteligentes e, cereja do bolo, mais corruptos para animalizar e desumanizar os povos do Sul do global. Tudo como se a corrupção sistêmica mundial não fosse comandada pelos EUA. Quando se diz — e essa é a crença dominante seja na ciência, seja no senso comum global — que a corrupção no Norte é deslize individual, e a corrupção do Sul sistêmica. Ou seja, abrangendo todas as pessoas e a sociedade como um todo, então essas pessoas são desumanizadas pela falta de moralidade.
Como inteligência e moralidade definem a nossa humanidade — sem isso nos associamos aos outros animais — definir um povo como corrupto é destituí-lo do respeito devido a quem é humano. E quem não é humano não tem direitos.
A elite brasileira vai usar o mesmo expediente internamente para oprimir o povo, tirando onda que é europeia ou americana e, portanto, honesta num país de corruptos eleitores de corruptos.
Se os povos do Sul são inferiores, então eles “devem” ser comandados a partir de fora pelos povos inteligentes e honestos. Este é o esquema que permeia tanto toda a ciência hegemônica americana e europeia, quanto Hollywood e toda a indústria cultural mundial.
Nessa fase final do capitalismo financeiro que saqueia todo mundo e se alia com a extrema direita, esse preconceito e este desprezo — antes apenas sentido, mas não expresso — passa a ser explicitado com toda a clareza. Musk incorpora essa desfaçatez como ninguém.
Ele já havia dito que apoiaria tantos golpes de Estado quanto fossem necessários para defender seus negócios na Bolívia. Essa afirmação era impensável 20 anos atrás. Agora “pode tudo” no mundo cada vez mais governado não mais por nações, mas por super ricos que pairam sobre as soberanias nacionais para enfraquecê-las. Musk é um psicopata que, portanto, explicita pelo exagero a patologia da nossa época.
Ele se acha acima da lei de países que considera, como todos na América Latina, inferiores. Ele não faz o mesmo na Europa ou EUA. A pregação quase centenária de Hollywood e da indústria cultural, repetindo todos os estereótipos do latino sempre ladrão e inconfiável nos filmes americanos, termina por convencer até as vítimas de um preconceito para o qual não possuem defesa.
Elon Musk surfa nesta onda e se apoia no desprezo já secular cultivado pelas ciências, pela arte, pela imprensa, e por toda a indústria cultural e simbólica. Por conta disso é que sempre vai encontrar patriotários para apoiá-lo. Esse delinquente internacional precisa ser detido. Ele é a mais pura expressão do desprezo mundial pela América Latina construído intencionalmente para permitir o saque indiscriminado da região.
Com satélites, tecnologia e fortuna, Musk já é ator da geopolítica mundial
Meses depois do começo da invasão da Ucrânia pela Rússia e enquanto governos buscavam entender a dimensão da crise, um novo ator desembarcou no debate com uma proposta de paz: Elon Musk.
Num primeiro momento, ele passou a fornecer serviços de internet aos ucranianos, algo que foi considerado como essencial para que Kiev pudesse resistir. Mas ele enfureceu o governo ucraniano ao apresentar um plano de paz, incluindo a anexação de territórios por parte dos russos. A proposta foi endossada pelo Kremlin.
Alvo de investigação por disseminação de desinformação na Europa e acusado de espalhar teorias conspiratórias e mentiras, Musk não apenas amplia seu peso econômico. Sua postura revela que ele se considera poderoso o suficiente para abandonar seu papel de empresário e também tentar influenciar na geopolítica.
Em 2022, ele admitiu que impediu que seus satélites fossem usados pelos ucranianos para atacar a Crimeia, desligando o serviços. Musk argumentou que isso colocaria sua empresa, a SpaceX, como “cúmplice de um ator de guerra e que poderia escalar o conflito”.
Essa não foi a versão que o cientista político Ian Bremmer revelou. Nas redes sociais, ele contou que Musk havia admitido que tinha conversado com Vladimir Putin e que sabia quais eram as “linhas vermelhas” do Kremlin. Musk negou a versão de Bremmer. Mas o cientista político rebateu: “Ele não é um especialista em geopolítica”.
Aquele não foi um caso isolado. Usando sua plataforma nas redes sociais, poder, dinheiro e satélites, o homem mais rico do mundo tenta forçar seu espaço como um ator da política internacional.
Ele assumiu a função de apoiador de Donald Trump nas eleições nos EUA em novembro, passou a classificar como autoritários governos que ameaçavam seus negócios e chega até mesmo a sugerir que Taiwan seja devolvida oficialmente para a China.
Mas Musk também coleciona desafetos. Seus comentários sobre ceder Taiwan para a China levaram o ministro de Relações Exteriores de Taipé, Joseph Wu, a contra-atacar. “Taiwan avisa a Elon Musk que não está à venda”.
Autoproclamado líder da liberdade de expressão, Musk não vê problemas em ampliar seus investimentos na China, onde ele produz mais da metade dos carros da Tesla.
Para observadores, a proposta de paz que agradou aos russos, o flerte com a China e tantas outras polêmicas mostraram que Musk não estará sempre ao lado dos interesses políticos dos EUA.
Mas, para líderes estrangeiros, encontros com Musk passaram a fazer parte de agendas de visitas ao exterior, em especial aos EUA. Só no ano passado, ele manteve encontros com os chefes de Estado e de governo da Índia, da Itália, da França, da Coreia do Sul, de Israel, da Turquia e de vários outros países. O argentino Javier Milei em 2024 visitou a fábrica de carros elétricos do bilionário em uma viagem aos EUA.
No caso de Emmanuel Macron, o flerte com Musk tinha como objetivo levar para a França a fábrica da Tesla. O francês encontrou espaço em três ocasiões para se reunir com o bilionário. Uma dessas conversas gerou polêmica, já que Musk estava, menos de dois dias antes, numa festa no México. Ao se encontrar com o francês, as câmeras captaram quando o bilionário afirmou que “teve de dormir num carro”.
Um ano depois, Musk acredita que tem peso suficiente para cobrar de Macron explicações sobre a prisão do CEO do Telegram, Pavel Durov. “Seria bom que o público global entendesse os motivos pelos quais Durov foi preso”, disse o bilionário. A prisão ocorreu no dia 24 de agosto, ao desembarcar em território francês. Macron, porém, insiste que não se trata de um ato político.
Já Benjamin Netanyahu, o primeiro-ministro de Israel, fez um desvio de alguns milhares de quilômetros em sua visita aos EUA em setembro de 2023, exclusivamente para encontrar o empresário. Além da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, o israelense voou até a California para se reunir com Musk.
Um ano depois, foi a vez de Musk viajar até Washington para acompanhar o discurso de Netanyahu ao Congresso americano. Um dia antes, ele anunciou que os serviços de internet da Starlink estavam funcionando num hospital de Gaza. Com o apoio de Israel.
O gesto deixou claro que Israel passou a controlar de forma plena as comunicações em Gaza, em parte com o apoio de Musk.
Para analistas, o real poder do bilionário não é sua plataforma X, mas sim a capacidade de provar, uma vez mais na história, que a tecnologia está no centro da geopolítica.
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